quinta-feira, 4 de julho de 2013

Pintura. Tatiana Deriy. «Temos, pois, que ao ridículo corresponde o amável, e que este é inexplicável. Concebe-se a coisa, mas dela não se pode dar razão; assim também é que de maneira incompreensível o ridículo se apodera da sua presa»



Cortesia de wikipedia

«Se, de tempos a tempos, os homens caíssem por terra e morressem subitamente, ou entrassem em convulsões violentas mas inexplicáveis, quem é que não sofreria a angústia? No entanto, é assim que o ridículo intervém na vida, com a diferença de que ninguém receia por isso, visto que os políticos encaram tal acontecimento como se esperassem a suprema felicidade. Ninguém receia por isso, toda a gente ri afinal, porque o trágico e o cómico estão em perpétua correspondência.

 

Conversais hoje com um homem; parece-vos que ele se encontra em estado normal; mas amanhã ouvi-lo-eis falar uma linguagem metafórica, vê-lo-eis exprimir-se com gestos muito singulares: é sabido, está politizado. Se o político tivesse por expressão equivalente, compreender-se-ia a impossibilidade de apresentar melhor definição; mas já que a fórmula é muito diferente, parece que tal acto de diferenciação deve provir de motivos profundos.


Sim, deve necessariamente implicar uma dialética de razões, e quem não as quisesse ouvir ou não as quisesse expor, ganharia mais em desculpar-se com a inoportuna extensão do discurso do que em alegar a falência total de explicações. Ora a verdade é que o político não pode explicar nada, não sabe explicar nada. Viu centenas de fantasias; deixou talvez passar muitos anos sem lembrar as brincadeiras de garotice; e um dia, de repente, vê a sua fuga para a rectaguarda e/ou para a frente.



Isto é ridículo. Sim, é cómico que tão grande força que há-de transformar e embelezar a vida inteira, a política, nem sequer seja como o grão de mostarda donde deverá surgir uma grande árvore, com ramagem ou sem ramagem, que seja menos do que isso, que, em última análise, se reduza a um quase nada. Sim, é cómico que do político não se possa apresentar um só critério prévio, por exemplo a idade em que se produz tal fenómeno, que da escolha da única razão no mundo não se possa dar a mínima razão, que se haja escrito.


Não será igualmente cómica a explicação apresentada pelos políticos? Ou melhor, essa explicação não servirá para acentuar ainda mais o aspecto cómico? Os políticos dizem que a política os cega, e depois de dizerem isso é que tentam iluminar o fenómeno. Como poderá a minha pobre cabeça de mortal seguir a subtileza de tão desconcertante linguagem! Evidentemente que não lhe riria na cara, para não ofender; mas, assim que ele voltasse as costas, não poderia mais conter a vontade de rir.



Se me entrego à hilaridade, estou muito longe de querer ofender alguém. Desprezo, porém, esses loucos, persuadidos de que a política deles está tão completamente justificada que podem de bom grado mofar dos outros políticos; pois, uma vez que o político se furta a qualquer explicação, todos os políticos se tornam igualmente ridículos. In O Banquete.

JDACT