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de wikipedia
Resumo
«A
tendência de criar obras em que a ficção e a história se mesclam é perceptível nas
produções literárias contemporâneas brasileiras bem como nas de outros países. Dentro
desse interesse pelo passado, uma particularidade vem-se firmando: a de ficcionalizar
personalidades da historia da literatura. Este trabalho tem por objectivo analisar
A última quimera, obra cuja autora, Ana Miranda, ficcionaliza o poeta
Augusto dos Anjos. Para tanto, primeiramente fez-se necessária uma reflexão
sobre as semelhanças e diferenças entre os discursos histórico e ficcional. Na
tentativa de compreender melhor o texto da autora, o passo seguinte foi o de
repensar os conceitos de romance e de romance histórico, principalmente por ser
bastante visível o parentesco entre as produções ficcionais de carácter
histórico na actualidade e o romance histórico do século XIX. Apesar das similaridades
com o romance mais tradicional, obras como A
última quimera apresentam inovações no modo de narrar que as aproximam
do pós-moderno, por isso receberam por parte de alguns teóricos novas
denominações, de modo que tentei compará-la com o que foi proposto como traço
distintivo por dois teóricos em especial. Na segunda parte do trabalho, passei
ao estudo propriamente dito do texto, buscando compreender como a personagem
Augusto dos Anjos havia sido construída. A forma de um mamífero vetusto,
modo como o próprio Augusto se caracterizou, e como a crítica literária acabou
de certa forma oficializando, não foi contestado na narrativa. Em Os
fantasmas hamléticos dispersos estão os três poetas cujas trajectórias se
entrecruzam: Augusto, Olavo Bilac e o narrador. A seguir, em A sereia
falaciosa, há a análise do discurso histórico presente na obra e, na sequência,
o universo feminino do princípio do século delineado pela autora. Percebendo a
obra como um leão feito de carneiros assimilados, ou seja, como um
discurso composto de vários outros, analisei o modo como esses foram
colaborando para a manutenção da visão estereotipada de Augusto dos .Anjos e ao
mesmo tempo foram subtilmente nos colocando diante do questionamento da
instauração do cânone literário».
Colocando
os pés no chão
«Escrever
este texto significou, antes de mais nada, enfrentar um desafio pessoal. A paixão
pela Literatura, talvez fosse melhor dizer, pela leitura, nasceu cedo, mas sem nenhuma
orientação ou reflexão sobre o verdadeiro significado daquele emaranhado de títulos,
autores, personagens, mundos construídos era uma forma, talvez, de escapar da realidade
que me circundava e que não me satisfazia, ao contrário, me desagradava e muito.
Quem sabe? Na introdução de um trabalho que especula sobre as relações entre a literatura
e a história seria demais tentar especular sobre a minha própria história. As
poucas respostas e as muitas perguntas que esta pesquisa me trouxe são o
bastante, já que a totalidade do sentido é inalcançável. Para mim, o estudo da
literatura sempre implicou um estudo da história, já que sempre concebi a obra
de arte literária, como de resto qualquer obra de arte, como o fruto de um
processo histórico, de um estado em que a sociedade que a produziu se encontrava
naquele determinado momento. Essa crença tornava o trabalho ainda mais interessante,
pois levava necessariamente a reflexões sobre a sociedade na qual me inseria, uma
espécie de possibilidade de compreender melhor o passado, buscar nele as causas,
os processos que nos permitiram chegar onde estamos. Embora isso me fosse
claro, havia inúmeras outras dúvidas a tentar resolver. Acreditava, poder
resolver as minhas inquietações a respeito da literatura. Claro está que as minhas
ilusões de totalidade, de encontrar todas as respostas não passavam disso,
ilusão. Muitas dúvidas foram sanadas, muitas não e inúmeras outras foram
surgindo ao longo do caminho, de modo que este trabalho representa apenas o
estágio em que estão as minhas reflexões sobre esse salutar jogo que é a
literatura, permitindo-me plagiar Barthes. Quanto à questão da retomada do
passado, que sempre me interessou, embora de uma forma bastante simplista,
seria pedir demais que eu não me sentisse absolutamente fascinada ao perceber o
quanto a relação entre a literatura e a história vem-se tornando um dos pontos
de maior interesse entre os teóricos, e se há esse interesse é porque as produções
artísticas têm-se voltado para ela. Exemplo disso é a farta produção de romances
ditos históricos na contemporaneidade. Essa associação explícita entre a ficção
e a história parece ter nascido da consciência de que ambas são discursos que
servem para tentar dar sentido ao passado, o que me parece ser, em última
instância, a função de qualquer construção humana, encontrar um sentido». In Rosana
Apolonia Harmuch, A ùltima Quimera, entre a Ficção e a História, Dissertação de
Mestrado apresentada na área de Literatura Brasileira, do Sector de Ciências
Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 1997.
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