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O primeiro imperador de Niceia foi Teodoro I Lascaris, que viria a conquistar
durante o seu reinado uma boa parte da Anatólia. O império de Niceia apenas
duraria 57 anos, até 1261, altura em que foi dissolvido em consequência da tomada
de Constantinopla, em 1260, por Miguel VIII Paleólogo, em aliança com a cidade
de Génova, rival visceral de Veneza. Fora este mesmo Miguel Paleólogo, que retirara
o trono ao tio de Vataça, João IV Lascaris, e que depois de tal usurpação o mandara
cegar e o fizera prisioneiro. Para se libertar de todos os Lascaris e evitar conflitos
com a sucessão ao trono, Miguel Paleólogo, depois de prender João Lascaris,
ordenara o casamento das três irmãs, Eudóxia, Irene e Maria, com estrangeiros, para
as afastar do império. Por isso Eudóxia havia casado, aos nove anos, em
Constantinopla com Guillermo Pedro de Tende, conde de Ventimiglia e havia partido
para a Ligúria, junto aos Alpes marítimos, próximo de Génova, onde mais tarde nasceriam
os seus cinco filhos. Chegou a ver esses objectos religiosos, minha mãe? Perguntou
Beatriz. Não minha filha, nunca os vi. Mas ouvi muitas histórias em Niceia e em
Constantinopla, aos meus pais e aos meus avós, desde muito pequena, sobre esses
tesouros da igreja. Por isso habituei-me a respeitá-los e também e venerá-los
ao longo da minha vida.
A história
da Cabeça-Relicário de S. Fabiano, que foi o vigésimo papa depois de S. Pedro, é
assaz curiosa. S. Fabiano foi eleito bispo de Roma, o que significava ser, nesse
tempo, o sumo pontífice da igreja cristã, corria o ano de 236 e a sua eleição para
o cargo ficou na memória de todos, pela sua natureza peculiar, embora também se
tenha dito sobrenatural e divina. Diz a história que estavam os cristãos em assembleia,
em Roma, discutindo sobre quem sucederia ao papa Antero. Mas estavam tão divididos
em relação à escolha do novo papa que parecia impossível tal decisão. É então, nessa
babilónia de argumentação e contra-argumentação, que uma pomba branca descendo dos
céus, pousou em cima de cabeça de Fabiano. Aleluias terão gritado, interpretando
como vontade de Deus a escolha de Fabiano, para próximo papa de Roma. O que é certo,
minhas filhas, é que todos votaram por unanimidade a eleição de Fabiano. Mas Fabiano
teve azar, porque foi encontrar Décio como imperador romano e Décio tinha uma forte
aversão e inimizade aos cristãos.
Para
além de novamente os reprimir e perseguir, voltou a promover a construção de
templos pagãos e reforçou os cultos e sacrifícios do passado em todo o império.
Esta severa perseguição aos seguidores de Cristo, levada a cabo pelo imperador de
Roma, culminou com a decapitação de muitos cristãos, entre eles também do papa Fabiano,
o que o transformou em mártir da igreja. Fabiano seria depois enterrado nas catacumbas
de Calisto, na via Ápia, em Roma onde já se encontravam sepultados todos os
papas desde S. Pedro. Muitos anos depois, cerca de seiscentos anos depois, e após
a reconstrução e a decoração da Basílica de S. Silvestre e S. Martinho aos Montes
pelos papas Sérgio II e Leão IV, no ano de 855, foram trasladados para essa basílica
os corpos dos papas que se encontravam nas catacumbas, já decorria a segunda metade
do século IX. E foi nesta altura, quando alguém encontrou no túmulo da via Ápia
a cabeça de S. Fabiano, descolada do corpo e ainda com os miolos intactos, que a
igreja decidiu perpetuar a sua memória. Afinal a lenda sobre a eleição de
Fabiano para papa de Roma, através da pomba enviada por Deus que lhe pousou na cabeça
naquela longínqua assembleia de cristãos do ano 236, bem merecia que se perpetuasse
a sua cabeça para todo o sempre». In Francisco do Ó Pacheco, Vataça, A
Favorita de Dom Dinis, Prime Books, 2013, ISBN 978-989-655-183-4.
Cortesia
de PBooks/JDACT