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Amante do Pai
«(…) Em 1350, morreu Afonso XI de Castela,
vítima da Peste Negra, e subiu ao trono o filho herdeiro dele e de Maria, Pedro
I. No ano seguinte, foi mandada executar dona Leonor Gusmão, ao que parece por instigação
da rainha viúva, dona Maria. Dona Leonor Gusmão, que fora concubina de Afonso XI,
dera-lhe uma plêiade de filhos bastardos que rivalizavam em afectos e poder com
o legítimo Pedro I. Foram eles Henrique, conde de Trastâmara; Frederico, mestre
de Santiago; Fernando, senhor de Ledesma; Tello, senhor de Aguilhar, de Lara e de
Biscaia; Sancho, conde de Albuquerque; João; Pedro; Joana, que casou com
Fernando de Castro; e dois outros filhos que morreram de tenra idade. O reinado
de Pedro I de Castela ficou marcado por guerras internas, que contaram com a participação
de outros reinos, como Aragão e Inglaterra. A par do comportamento violento e indiscriminado
de que era acusado, Pedro I também colhia antipatias de alguns sectores da
nobreza pela atenção que prestava à sua concubina, dona Maria de Padilha, em detrimento
da fraca consideração que votou às mulheres dos seus dois casamentos: dona
Branca Bourbon e dona Joana Castro. Após o assassinato de dona Leonor Gusmão, a
rivalidade entre Pedro I e os seus irmãos bastardos agravou-se. Henrique de Trastâmara
opôs-se a Pedro I, de forma veemente, logo em 1352, com uma insurreição nas Astúrias
contra a Coroa, que saiu fracassada. As disputas entre os dois irmãos
continuaram por largos anos, já que Henrique não aceitou a autoridade do irmão,
que acusou de ser cruel, acabando por se fazer coroar rei de Castela, em Huelgas
de Burgos, no ano de 13661. Neste ano iniciou-se pois uma guerra fratricida, que
terminou em 1369, com o homicídio de Pedro I às mãos de Henrique, em Montiel. Seguindo
o percurso da rainha dona Maria depois de ficar viúva, observámos que esteve presente
no casamento do filho, Pedro I de Castela, com dona Branca Bourbon, sobrinha do
rei francês, que se celebrou a 3 de Junho de 1353 em Valhadolid3. Nesse mesmo dia,
dona Maria tentou dissuadir o filho de ir ter com a sua favorita, dona Maria Padilha,
uma vez que ta1 procedimento seria desonroso para a sua pessoa e vexatório para
a noiva e o rei de França, seu parente. Pedro assegurou à mãe que o não faria, mas
acabou por não cumprir, partindo para os braços da amada. A partir de então, acentuou-se
a separação entre a mãe e o filho. Dona Maria protegeu a nora e os fidalgos que
se opuseram ao comportamento de Pedro, como João Afonso, senhor de Albuquerque;
João Nunes Prado, mestre de Calatrava; Álvaro Peres Castro e Álvaro Gonçalves Mourão.
Estes dois últimos, fugindo às perseguições do rei de Castela, recolheram-se em
Medina del Campo, onde estava a rainha dona Maria, que, inclusive, lhes cedeu cavalos.
Álvaro Peres Castro partiu para Portugal e passou a estar ao serviço do infante
Pedro, filho do rei Afonso IV de Portugal e amante ou marido da sua irmã, dona Inês
de Castro.
A notícia do apoio prestado pela
rainha dona Maria a estes fugitivos deve ter chegado aos ouvidos do filho. Na verdade,
quando pouco depois, ainda no ano de 1353, se festejaram as bodas de Tello,
irmão bastardo do rei, com dona Joana Lara, senhora de Biscaia, em Segóvia, a rainha
dona Maria e os cavaleiros que estavam com ela foram proibidos de comparecer. Pedro
de Castela decretou a prisão da mãe e enviou para junto dela uma série de guardas.
Em 1354, porém, encontramos dona Maria, em Portugal, a visitar os pais e possivelmente
também a assistir ao casamento de sua sobrinha, dona Maria (de 12 anos), com o infante
Fernando de Aragão, que se celebrou em Évora. O cronista não referiu a presença
da rainha dona Maria na cerimónia, mas indicou que a sua ida àquele reino se fizera
com licencia del Rey su fijo. Foi igualmente nesta ocasião que Álvaro Peres
Castro, a pedido de João Afonso Albuquerque e dos irmãos bastardos do rei de Castela,
Henrique e Fradique, propôs ao infante Pedro de Portugal, filho de Afonso IV, que
se candidatasse ao trono castelhano, visto ser neto legítimo do rei Sancho IV de
Castela. O infante pareceu ficar satisfeito com o repto, mas o seu pai, Afonso IV
fez por o dissuadir de tal empresa.
A rainha dona Maria apercebeu-se da
conspiração que João Afonso Albuquerque e os outros planeavam contra o filho e,
não querendo ser envolvida no plano, resolveu regressar a Castela, escolhendo um
caminho onde não os pudesse encontrar. Acompanhada pelo irmão, o infante Pedro de
Portugal (futuro rei D. Pedro I), pelo mestre de Cristo Rodrigo Eanes e por Álvaro
Peres Castro, dona Maria partiu de Portalegre e foi para Nisa e depois para
Castelo Branco. Aqui permaneceu oito dias, até que fueron aá Sant Vicente de la Vera: é lebaba Martin Alfonso Tello en este
caminho á la Reyna Doña Maria por la rienda [rédea], é dalli se levanto la fama
que despues ouvieron. É pois esta a primeira vez que encontramos menção a Martim
Afonso Telo, pai de dona Leonor Teles. Depreendemos que este passou a estar ao serviço
da rainha a partir de então e que a pretensa relação amorosa se iniciou também na
mesma altura. Martim Afonso seguiu com a rainha para Castela (para Toro, ao encontro
do rei Pedro), enquanto os outros acompanhantes foram só até pouco depois de
cruzar a fronteira, regressando então a Portugal». In Isabel Pina Baleiras, Uma
Rainha Inesperada, Leonor Teles, Temas e Debates, Círculo de Leitores, 2013,
ISBN 978-989-644-230-9.
Cortesia de
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