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Breve
Nota Sobre A Poesia Provençal
«(…) Durante os dois
séculos seguintes, o Sul de França, então politicamente autónomo do Norte, e
onde a langue d’oc é dominante, vai conhecer uma brilhante civilização,
que os seus numerosos e talentosos trovadores e jograis vão dar a conhecer a
toda a Europa. Cantando o amor, a joi e a jovens (juventude),
os trovadores provençais, sobretudo os da primeira fase, elaboram as regras
básicas de uma arte de trobar que constituirá a matriz das posteriores
escolas trovadorescas, nomeadamente da importante escola galego-portuguesa (de
que uma das formas, a cantiga de amor, é absolutamente tributária). Mas,
elaboram ao mesmo tempo, como se disse, as regras de uma refinada arte de
amar, na qual a mulher passa a desempenhar um papel central, já que a ela
cabe a definição e condução do jogo erótico, que o leal amador deve
aceitar e a quem deve obedecer, como servidor (note-se que a poesia provençal conhece igualmente, e de forma também
inovadora, brilhantes autoras femininas, as trobairitz, de que a mais
célebre será a Contessa de Dia). O fin’amor opõe-se,
assim, não só aos tradicionais contratos sociais que, em regra, presidem, na
época, às relações entre os sexos, nomeadamente no tocante ao casamento, mas
opõe-se igualmente ao entendimento dessas relações em termos de pura satisfação
de instintos básicos (o comércio sexual, que faz da mulher um puro e
descartável objecto de prazer).
Bernart
Ventadorn (…1150-80…)
«Quando
vejo a cotovia mover
de
alegria as asas contra o raio
que
se esquece e se deixa cair
com
a doçura que no coração lhe vai
ai!
Tão grande inveja me vem
daqueles
que vejo andar contentes!
E
maravilho-me eu como de repente
de
desejo o meu coração não se funde.
Ai
eu! Tanto cuidava saber
de
amor e tão pouco sei!
Pois
eu de amar não me posso conter
aquela
cujo favor nunca terei;
tem
o meu coração e tem-me todo a mim,
tem-se
a si própria e ao mundo inteiro!
E
quando me tomou nada mais me deixou
senão
desejo e coração voraz.
Perdi
já eu sobre mim o poder
e
deixei de ser meu desde o instante
em
que me deixou nos seus olhos ver,
num
espelho que me agrada tanto.
Espelho,
pois me mirei em ti,
mataram-me
os suspiros mais profundos,
que
assim me perdi, como se perdeu
o
belo Narciso na fonte.
Das
donas me desespero,
não
mais nelas me fiarei!
Que
assim como as usava defender
assim
as desabonarei;
pois
vejo que nenhuma me auxilia
junto
daquela que me destrói sem razão,
de
todas duvido, de todas desconfio,
pois
sei bem que todas iguais são.
Nisso
faz bem o papel de mulher
a
minha dona, que condeno assaz:
pois
não quer o que se deve querer
e o
que lhe é vedado faz.
Caído
sou em sua impiedade
e
agi pois como o louco na ponte!
E
não sei porque me vou curvado
se
não por querer subir alto monte.
Piedade
está perdida a valer,
e eu
não o soube jamais,
pois
aquela que mais a deveria ter
não
a tem; e onde a irei buscar?
Ah!
Como pouco parece, a quem a vê,
que
este cativo amador,
que
já sem ela não encontrará bem,
deixe
morrer, sem socorro lhe dar!
[…]
In
Graça Videira Leal, Poesia Provençal, alguns textos, Revista Medievalista, director
Vasconcelos Sousa, Ano 2, Nº 2, Instituto de Estudos Medievais, FCSH-UNL, FCT,
2006, ISSN 1646-740X.
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