terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Cecília Meireles. Poesia. «Obra suprema é aquela em que (a par, é certo, da rígida construção que assinala os mestres) pensamento original e emoção própria se reúnem e se fundem… O valor de uma obra de arte é tanto maior quanto é puramente artístico o meio de manifestar a ideia»

jdact e wikipedia

Não te Fies do Tempo nem da Eternidade
«Não te fies do tempo nem da eternidade
que as nuvens me puxam pelos vestidos,
que os ventos me arrastam contra o meu desejo.
Apressa-te, amor, que amanhã eu morro,
que amanhã morro e não te vejo!

Não demores tão longe, em lugar tão secreto,
nácar de silêncio que o mar comprime,
ó lábio, limite do instante absoluto!
Apressa-te, amor, que amanhã eu morro,
que amanhã morro e não te escuto!

Aparece-me agora, que ainda reconheço
a anêmona aberta na tua face
e em redor dos muros o vento inimigo...
Apressa-te, amor, que amanhã eu morro,
que amanhã morro e não te digo... »
Poema de Cecília Meireles, in ‘Retrato Natural’


Recado aos Amigos Distantes
«Meus companheiros amados,
não vos espero nem chamo:
porque vou para outros lados.
Mas é certo que vos amo.

Nem sempre os que estão mais perto
fazem melhor companhia.
Mesmo com sol encoberto,
todos sabem quando é dia.

Pelo vosso campo imenso,
vou cortando meus atalhos.
Por vosso amor é que penso
e me dou tantos trabalhos.

Não condeneis, por enquanto,
minha rebelde maneira.
Para libertar-me tanto,
fico vossa prisioneira.

Por mais que longe pareça,
ides na minha lembrança,
ides na minha cabeça,
valeis a minha Esperança».
Poema de Cecília Meireles, in ‘Poemas (1951)’

JDACT