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«Muito
resumidamente, Myriam Cyr, exceptuando pequenas lacunas de ordem bibliográfica,
aproxima-se bastante do Estado da Arte, quase conseguindo fazer o ponto da
situação em que se encontram os estudos acerca do tema, com a vantagem, para
Portugal, de defender a autoria portuguesa das cartas, referenciando, para os
leitores de língua inglesa e francesa, os autores portugueses e estrangeiros
que a admitem.
Aqui
para nós, que ninguém nos ouve, Mariana Alcoforado e as “Lettres Portugaises",
constituem, inexplicavelmente, uma relação de intimidade a desfazer pela
maioria dos nossos letrados desde o século XIX. Há mais de trinta anos que
assistimos no Museu Regional de Beja, instalado no convento onde viveu Mariana,
aos esgares ridículos e sobranceiros de uma certa pseudo-intelectualidade
portuguesa que, perante a janela das Portas de Mértola, se afana na mesquinhez...
Desconhecemos
se, com o nosso entusiasmo pelo assunto, contagiámos, ainda mais, algumas das
personalidades que nos visitaram nos últimos anos, como Giovanni Piazza, Isamu Taniguchi, Graça
Lobo, Carlos Quevedo, Rubens Coura, Teresa Corte-real, Michelle Navarro, entre
outras. Lisa Forrel, encenadora inglesa de Myriam Cyr, aquando da sua
interpretação das Cartas num dos teatros de Nova lorque. Num dos dias da
encenação as duas amigas encontraram-se com Katherine Vaz, falaram de nós, de
Beja, e do romance histórico "Mariana" desta escritora luso-americana.
Parece-nos indispensável, especialmente para a cidade de Beja, a insistência
nestes contactos, cujos bons resultados veremos dentro de poucos anos, razão
por que urge adoptar uma atitude em tudo explícita, em nada hesitante, acerca
da autoria portuguesa das cartas.
Revela
uma obra bem estruturada, bem documentada na bibliografia, mas confunde os
nomes dos reis portugueses e a leitura de alguns documentos. Apesar de
considerarmos a obra extremamente positiva, supomos que a autora não visitou
Beja e, se alguma vez veio a Portugal, não se apercebeu que seria impossível
fazer em poucas horas, no século XVII e em tempo de guerra, o caminho entre
Castelo Rodrigo e Beja, afinal bem distantes e quase diagonalmente opostas;
Claude Barbin, o primeiro editor das cartas, em 1669, nunca que saibamos
referiu, nas edições, o nome de Guilleragues, nem como seu tradutor nem como
autor; a dado momento lê-se que “A capela de Santa Maria pertencia à cidade
pitoresca de Beja, situada no Baixo-Alentejo, a região mais a sul de Portugal”.
Ora, a capela de Santa Maria, é simplesmente a mais importante igreja paroquial
da cidade, a que apresenta melhores pergaminhos históricos, na penúltima região
mais a sul, no continente; devido provavelmente à proximidade da meia dúzia de
frades do demolido hospício de Santo António, actual local do Teatro Pax-Julia,
considera que os mesmos viviam também nas instalações do convento da Conceição,
cenóbio de Mariana e das outras freiras clarissas. Enfim, são pequenas
fantasias que, esperemos, os detractores da autoria portuguesa das Cartas não
deverão aproveitar em benefício próprio.
Todavia
reafirmamos o interesse incontornável que esta edição tem para Portugal, Beja e
Soror Mariana Alcoforado. Sem outros comentários, a propósito da condição
feminina portuguesa, diz-nos Myriam Cyr:
- "O catolicismo português, uma mescla de vestígios de costumes muçulmanos, crenças pagãs e devoção religiosa [cristã], era o palco ideal para subjugar as mulheres. As esposas eram deliberadamente mantidas analfabetas. Usavam a versão católica do chador sob a forma de um lenço apertado à volta da cara. Comiam no chão, sobre uma esteira de cortiça, enquanto os homens se sentavam à mesa, [...]".
In
Leonel Borrela, Cartas de Soror Mariana Alcoforado, Edição 100Luz, 2007, ISBN
978-972-99886-7-7.
Cortesia
de 100Luz/JDACT