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A propósito das investigações de L. Morgan
«A formação de rebanhos levou, nos lugares adequados, à pastorícia:
entre os semitas nas pradarias do Eufrates e do Tigre, entre os árias nas da
Índia, do Oxo e do Iaxartes (hoje, Amudária e Sirdária), do Don e do Dniepre.
Deve, ter sido nas fronteiras dessas terras de pastagens que pela primeira vez se
realizou a domesticação do gado. Assim, os povos de pastores aparecem às
gerações posteriores como provindo de regiões que, muito afastadas para serem o
berço do género humano, eram pelo contrário quase inabitáveis para os seus
antepassados selvagens e mesmo para os homens do estádio inferior da barbárie.
Inversamente, logo que estes bárbaros do estádio médio se habituaram à
pastorícia, nunca lhes teria ocorrido à ideia de saírem voluntariamente das
grandes pradarias com cursos de água e regressarem às florestas em que tinham
vivido os seus antepassados. E, mesmo quando foram empurrados mais para norte e
oeste, era impossível aos semitas e árias irem para as zonas florestais da Ásia
Ocidental e da Europa antes de, graças ao cultivo dos cereais, estarem em
condições de alimentar o seu gado nesse terreno menos favorável e
particularmente de resistir ao Inverno.
É mais do que provável que o cultivo dos cereais aqui surgiu, em
primeiro lugar, da necessidade de alimentar o gado e só mais tarde se tornou importante
pra a alimentação humana.
É à alimentação rica em carne e leite dos árias e semitas, e
particularmente ao seu efeito favorável sobre o desenvolvimento das crianças,
que se deve talvez atribuir o desenvolvimento superior das duas raças. De
facto, os índios dos ‘pueblos’ do Novo México, que estavam quase reduzidos à
mera alimentação vegetal, têm um cérebro menor que o dos índios do estádio
inferior da barbárie, que comiam mais carne e peixe. De qualquer modo, neste
estádio desaparece gradualmente o canibalismo, que se mantém apenas como acto
religioso ou, o que aqui é quase idêntico como sortilégio.
‘Estádio superior’. Começa com a fundição do minério de ferro e passa
para a civilização por meio da invenção da escrita e da sua utilização em
registos literários. Este estádio que, conforme foi dito, só no hemisfério
oriental se realizou de forma autónoma, é, mais rico em progressos da produção
do que todos os anteriores tomados em conjunto. Pertencem-lhe os gregos do tempo
dos heróis, as tribos itálicas de pouco antes da fundação de Roma, os alemães de
Tácito, os normandos do tempo dos vikings. Antes de mais, encontramos aqui pela
primeira vez o arado de ferro puxado por gado, que tornou possível a
agricultura em grandes extensões, ‘o cultivo dos campos’, e com isso um aumento
dos meios de vida praticamente ilimitado para as condições da época e, assim,
também o arroteamento das florestas e a sua transformação em terrenos aráveis e
prados, o que, por sua vez, sem a pá e o machado de ferro continuava impossível
numa grande escala. Com isso, no entanto, houve também um rápido aumento da
população e um denso povoamento em pequenas áreas. Antes do cultivo dos campos
só muito excepcionalmente devem ter ocorrido situações em que meio milhão de
homens se tenham unido sob uma única direcção central; provavelmente, isso
nunca terá acontecido.
O ponto de máximo florescimento do estádio superior da barbárie aparece-nos
nos poemas homéricos, principalmente na “Ilíada”. Instrumentos de ferro
desenvolvidos; o fole; o moinho manual; a roda de oleiro; a preparação do
azeite e do vinho; um desenvolvido trabalho dos metais, em transição para o
artesanato; a carroça e o carro de guerra; a construção de barcos com traves e
pranchas; os começos da arquitectura como arte; cidades rodeadas de muralhas com
torres e ameias; a epopeia homérica e o conjunto da mitologia, são estas as principais
heranças que os gregos levaram da barbárie para a civilização.
Se compararmos com isto a descrição que César e mesmo Tácito fazem dos
germanos, que se encontravam no início do mesmo estádio de civilização a partir
do qual os gregos homéricos se preparavam para passar a um estádio superior,
vemos qual a riqueza de desenvolvimento da produção que o estádio superior da
barbárie contém em si». In F. Engels, A origem da Propriedade Privada e do
Estado, Editorial Presença, Colecção Síntese, 1976.
Cortesia de Presença/JDACT