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«Desconhecemos o cômputo populacional dos judeus destes concelhos assim
como o número de habitantes por fogo. É muito provável que, à exclusão de Elvas
e Portalegre, a minoria residisse numa única rua, não chegando a extravasá-la, exceptuando
com a vinda dos judeus castelhanos em 1492, altura em que muitos destes habitaram
acampamentos de refugiados, como o de Castelo de Vide, ou em casas na
cristandade.
À semelhança do que se passava no resto do reino e tal como depois
ocorreria com a família cristã nova, o agregado estrito definia-se por um elevado
número de filhos.
O casamento entre membros da mesma família era frequente, incluindo a união
entre primos. A endogamia devia ser mais usual nas famílias mais ricas,
evitando desse modo a dispersão do património familiar. O casamento era nestas precedido
por um contrato nupcia1,a ‘kétubah’.
Economicamente, os judeus dedicavam-se ao comércio e às artes diversas.
Os mesteres nobres eram seu apanágio, sendo por vezes o único oficial da sua
arte no concelho em que residiam.
Tomemos alguns exemplos :
Castelo de Vide:
Mercador – 4,
Tecelões – 2,
Alfaiates – 2,
Sapateiros – 2.
Elvas:
Mercadores – 2,
Tecelões - l4,
Alfaiates – 17,
Gibiteiros – 2,
Sapateiros – 5,
Ourives – 2,
[…]
Fronteira:
Mercador – 1,
Tecelões – 3,
Alfaiates – 1,
Físicos – 2.
Portalegre:
Alfaiates – 8,
Tecelões – 7,
Gibiteiros – 3,
Sapateiros – 9,
Ferreiros – 2,
Ourives – 1,
Físicos e cirurgiões – 3,
[…]
Perante esta amostragem incompleta, devido à escassez documental,
podemos concluir da importância do fabrico, transformação e comércio de
tecidos, sendo certamente as mantas um desses artefactos. Seguiam-se-lhe o
trabalho dos curtumes e do fabrico de sapatos e a arte do ferro.
A sua actividade desenvolvia-se nas lojas-oficinas, muitas vezes acesso
único à própria habitação. Nelas trabalhava o mestre mas também o sobreiro e
assalariados, assim como um ou outro aprendiz. Frequentavam as feiras da região
alentejana, como a de Vera Cruz, Flor da Rosa, Elvas, Vila Viçosa, etc. Exemplo
deste comércio era o pequeno mercador itinerante, o ‘algibebe’.
Vejamos para sintetizar, baseado na amostragem acima referida:
Alfaiates e gibiteiros – 33,
Tecelões – 22,
Mercadores – 7,
Tosadores – 3,
Sapateiros – 16,
Ferreiros e Armeiros – 13,
Físicos e cirurgiões – 14.
Mas nesta zona raiana o trato não era somente interno. Fazia-se igualmente
um comércio intenso com a vizinha Castela, para onde se levava gado
clandestinamente, como Abraão Alufo de Castelo de Vide ou dinheiro e donde se
trazia panos de diversa qualidade, sedas, fustões, etc.
Igualmente importante deveria ser a presença de judeus castelhanos
nestes concelhos, explicada por laços familiares e interesses comerciais, provenientes
sobretudo de Badajoz, Valençia de Alcântara, etc.
Em 1492, os Reis Católicos decretavam a expulsão dos judeus de Castela,
depois de, numa primeira fase, o terem sido da Andaluzia. Marvão e Elvas,
segundo os cronistas castelhanos da época teriam sido dois dos portos, escolhidos
para a entrada em Portugal. Em Castelo de Vide, estava levantado o acampamento
para os que entravam pela fronteira alentejana. Segundo Velasco da Mota a quem
cabia a sua vigilância, nele se encontravam entre 4000 e 5000 pessoas,
guardadas de dia e de noite, para evitar os roubos e raptos feitos pelos
castelhanos, nas suas sortidas em território português.
A maioria partiu para outras partes, no reino ou fora dele. Alguns
regressariam a Castela depois de serem baptizados em finais de 1492. Outros ter-se-iam
aqui radicado». In Maria Ferro Tavares, Judeus e Cristãos Novos no distrito de
Portalegre, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de
Lisboa, Acta do I Encontro da História Regional e Local, Setembro de 1987.
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