segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Largada das Naus. António Borges Coelho. «Esse projecto nascia da necessidade de firmar um pé fora, no esforço de segurar a independência política e de acalmar o medo de Castela. E da necessidade de dar emprego aos jovens candidatos a fidalgos»

 

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«A palavra mercador, corrente na época, tinha contra si o episódio evangélico da flagelação dos vendilhões do templo e a condenação jurídica e moral dos empréstimos a juros por parte do Direito Canónico. Por isso, a palavra e a actividade do mercador se escondem por trás de outros vocábulos como homem bom, homem honrado, cidadão e com crescente frequência por trás de criado d’el-rei, escudeiro, cavaleiro e mesmo cavaleiro fidalgo.

Toda a sociedade portuguesa participou, como dissemos, e foi marcada pelo movimento da expansão marítima. Mas, socialmente, os grupos determinantes têm origem urbana, honrados ou náo.

São os que constroem barcos e navegam no Mar Oceano, os que aumentam em caudal as rendas do rei e pugnam pelo fortalecimento da Coroa, os que empregam e acumulam crescentes cabedais, mas que seriam excluídos da direcção nominal suprema.

Do ponto de vista das relações exteriores, a posse de Ceuta implicava a manutenção de um corpo militar permanente, calculado em cerca de três mil homens. Portugal era um cruzado militante. O papa abençoava o seu exemplo e esforço. Esta bênção aliviava a i pressão que pudesse ser exercida por príncipes cristãos, designadamente por Castela, e propagandeava os feitos e o poder militar do eino de Portugal.

A conquista de Ceuta envolveu também, desde logo, um projecto mais largo, o de criar um Portugal Além-Mar em África, ao menos o domínio de outras praças marítimas e ainda o assentamento nas ilhas descobertas e a descobrir. Esse projecto nascia da necessidade de firmar um pé fora, no esforço de segurar a independência política e de acalmar o medo de Castela. E da necessidade de dar emprego aos jovens candidatos a fidalgos.

Vale a pena enumerar a fardagem dos títulos que ostentava o rei de Castela, pela graça de Deus, rei de Castela, de Leão, de Toledo, da Galiza, de Sevilha, de Córdova, de Múrcia, de Jaen, do Algarve, de Algeciras e senhor de Biscaia e de Molina. Pelo seu lado. em 1410, o rei de Aragão estendia o seu domínio às ilhas Baleares, à Sardenha, à Sicília. João I era tão só rei de Portugal e do Algarve, a que juntava agora o título de senhor de Ceuta.

Com os seus navios e corsários, Ceuta controlou nos séculos XV e XVI a navegação que velejava pelo Estreito de Gibraltar. Tornou-se escola de milícia e modelo de arquitectura militar. Nos séculos XVI e XVII, responderá ao corso que flagelava as armadas portuguesas e espanholas que regressavam do Oriente, do Brasil, da costa africana e das Américas». In António Borges Coelho, Largada das Naus, História de Portugal, 1385-1500, Editorial Caminho, 2011, ISBN 978-972-212-464-5.

Cortesia de ECaminho/JDACT

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