(1923 - 2005)
Póvoa da Atalaia, Fundão
Cortesia de citi
Eugénio de Andrade, pseudónimo de José Fontinhas, foi um poeta português. Nasceu numa pequena aldeia da Beira Baixa situada entre o Fundão e Castelo Branco, filho de uma família de camponeses, «gente que trabalhava a pedra e a terra». A sua infância é passada com a mãe, que é a figura dominante de toda a sua vida e da sua poesia. O pai, filho de camponeses abastados, pouco esteve presente, dado que o casamento, efectuado mais tarde, durou muito pouco. Em 1935, afirma-se em si o interesse pela leitura. Passa horas a ler em bibliotecas públicas e começa a escrever poemas. Em 1938 escreve uma carta e envia três ou quatro poemas a António Botto, que manifesta interesse em conhecê-lo. Em 1939 publica o seu primeiro poema, «Narciso» e, pouco tempo depois, passa a assinar com outro nome. «Nasce o poeta Eugénio de Andrade».
Cortesia de wikipédia
Em 1941 faz-se a primeira referência pública à sua poesia na conferência que Joel Serrão, seu amigo, pronunciou na Faculdade de Letras de Lisboa, sobre «A Nova Humanidade da Poesia Nova». Um ano depois, em Novembro, Eugénio de Andrade lança o seu primeiro livro de poesia, «Adolescente». Em 1943, o poeta muda-se novamente acompanhado pela sua mãe para Coimbra, onde permanece até ao final do ano de 1946. Em 1945, a Livraria Francesa publica o seu livro «Pureza».
Cortesia de jq
Com «As Mãos e os Frutos», em 1948, que Eugénio de Andrade alcança o sucesso. A partir dessa data, inicia-se uma carreira especialmente rica em poesia, mas também com produções nos domínios da prosa, da tradução e da antologia. Eugénio de Andrade, ergue-se ao primeiro plano da poesia portuguesa.
A 14 de Março de 1956 morre a sua mãe e morre uma parte do poeta: «A minha ligação à infância é, sobretudo, uma ligação à minha mãe e à minha terra, porque, no fundo, vivemos um para o outro».Cortesia de chicailheu
Durante os anos que se seguem, o poeta foi convidado para participar em vários eventos e travou amizades com muitas personalidades da cultura portuguesa e estrangeira, como Joel Serrão, Miguel Torga, Afonso Duarte, Carlos Oliveira, Eduardo Lourenço, Joaquim Namorado, Sophia de Mello Breyner Andresen, Teixeira de Pascoaes, Vitorino Nemésio, Jorge de Sena, Mário Cesariny de Vasconcelos, José Luís Cano, Ángel Crespo, Luís Cernuda, Marguerite Yourcenar, Herberto Helder, Joaquim Manuel Magalhães, João Miguel Fernandes Jorge, Óscar Lopes, e muitos outros... . A verdadeira «fina flor» das Artes...
Algumas obras de Eugénio de Andrade.Poesia
- Adolescente, 1942:
- Pureza, 1945;
- As Mãos e os Frutos, 1948, 21ª edição, 2000;
- Os Amantes sem Dinheiro, 1950, 16ª edição, 2000;
- As Palavras Interditas, 1951, 13ª edição, 2002;
- Até Amanhã, 1956, 13ª edição, 2002;
- Coração do Dia, 1958, 12ª edição, 1994;
- Mar de Setembro, 1961, 12ª edição, 1994;
- Ostinato Rigore, 1964, 11ª edição, 1997;
- Obscuro Domínio, 1971, 8ª edição, 2000;
- Véspera de Água, 1973, 6ª edição, Limiar, 1990;
- Escrita da Terra, 1974, 7ª edição, 2002;
- Homenagens e outros Epitáfios, 1974, 8ª edição, 1993;
- Limiar dos pássaros, 1976, 7ª edição, 1994;
- Primeiros Poemas, 1977, 10ª edição, 2000;
- Memória Doutro Rio, 1978, 4ª edição, Limiar, 1985;
- Matéria Solar, 1980, 5ª edição, 2000;
- O Peso da Sombra, 1982, 3ª edição, Limiar, 1989;
- Branco no Branco, 1984;
- Vertentes do Olhar, 1987, 5ª edição, 2003;
- O Outro Nome da Terra, 1988, 2ª edição,Limiar, 1989;
- Contra a Obscuridade, 1988, 5ª edição, 1993;
- Rente ao Dizer, 1992, 4ª edição, 2002;
- Ofício de Paciência, 1994, 2ª edição, 2000;
- O Sal da Língua, 1995, 4ª edição, Associação Portuguesa de Escritores, 2001;
- Pequeno Formato, 1997, 2ª edição, 1997;
- Os Lugares do Lume, 1998, 2ª edição, 1998;
- Os Sulcos da Sede, 2001, 3ª edição, 2002.
- Os Afluentes do Silêncio, 1968, 9ª edição, 1997;
- Rosto Precário, 1979, 6ª edição, 1995;
- À Sombra da Memória, 1ª edição, 1993.
- Daqui Houve Nome Portugal, 1968, 4ª edição, Edições Asa, 2000;
- Memórias da Alegria, 1971, 2ª edição, Campo das Letras, 1996;
- Antologia Breve, 1972, 7ª edição, 1999;
- A Cidade de Garrett, 1993, 3ª edição, 1997;
- Fernando Pessoa, Poesias Escolhidas, 1995, 6ª edição, Campo das Letras, 2001;
- Versos e Alguma Prosa de Luís de Camões, 1972, 5ª edição, Campo das Letras, 1996;
- Erros de Passagem, selecção e prefácio, 1982, 3ª edição, Campo das Letras, 1998;
- Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa, 1999, 7ª edição, Campo das Letras, 2002;
- Sonetos de Luís de Camões, Assírio & Alvim, 2000;
- Poemas Portugueses para a Juventude, Edições Asa, 2002.
- História da Égua Branca, 1977, 8ª edição, Campo das Letras, 2002;
- Aquela Nuvem e Outras, 1986, 10ª edição, Campo das Letras, 2002.
Eugénio de Andrade é um dos mais lidos e traduzidos dos poetas portugueses. Após algumas tentativas juvenis que mais tarde repudiou, impôs-se definitivamente no panorama da actual poesia portuguesa com «As Mãos e os Frutos» (1948). Contemporâneo dos movimentos neo-realista e surrealista, quase não acusa influência de quaisquer escolas literárias, propondo uma poesia elementar, cuja musicalidade só encontra precedentes na nossa lírica medieval, ou num poeta como Camilo Pessanha, que Eugénio de Andrade assume - a par de Cesário Verde - como um dos seus mestres.
Cortesia de patricialino
Se muitos poetas portugueses foram marcados pelo desencanto, «Eugénio de Andrade vai buscar ao paraíso da infância, à intimidade com a terra, à pura felicidade de se ter um corpo a fulgurante alegria de alguns momentos privilegiados». Os 50 anos da vida literária de Eugénio de Andrade foram assinalados no Porto com um colóquio internacional sobre a sua obra, cujas actas estão agora disponíveis no primeiro número dos «Cadernos de Serrúbia», editados pela Fundação Eugénio de Andrade.
As palavras
São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.
Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.
Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.
Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?
Eugénio de Andrade
As palavras que te envio são interditas
As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.
Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos nocturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.
E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.
Eugénio de Andrade
Cortesia de Ana Peixoto d'Almeida/FEA/wikipédia/JDACT