Monte Giordano
«(…) Quando Lucrécia estava há
três anos em Monte Giordano, Ludovico, marido de Adriana, morreu, e o palácio
mergulhou no luto. Adriana cobriu-se de véus pretos e passava muito tempo com
os padres que moravam lá, e Lucrécia disse para si mesma, então, que Adriana
era uma mulher muito boa. Um dia, quando Lucrécia tinha voltado do convento de
San Sisto para Monte Giordano e estava sentada à mesa com Adriana e Orsino, ela
pensou como era triste ela e Orsino comerem e beberem usando utensílios de
prata enquanto Adriana, por ser viúva, de luto do marido à moda espanhola,
tivesse de fazer isso com utensílios de barro. Lucrécia inclinou-se sobre a
mesa, cujo tampo era feito de mármore e de pedaços coloridos de madeira, e
disse: Querida senhora Adriana, a senhora ainda está muito infeliz por ser uma
viúva. Eu sei, porque minha mãe ficou infeliz quando Giorgio di Croce morreu.
Ela chorava e falava sobre a sua infelicidade, e então se sentia melhor. Adriana
endireitou o longo véu preto que lhe caía sobre os ombros. Eu não quero falar
sobre a minha dor, disse ela. Na Espanha, dizemos que é mal-educado uma pessoa
mostrar ao mundo a sua dor.
Mas nós... Orsini e eu..., não
somos o mundo insistiu Lucrécia. E minha mãe... Sua mãe era italiana. Seria bom
que se esquecesse da sua origem italiana. Na Espanha, compartilhar um prazer é
uma coisa boa, porque ao compartilhar o que é bom a pessoa dá algo que vale a pena
receber. Compartilhar a dor é implorar que o fardo da pessoa seja levado, em
parte, por uma outra. Os espanhóis são orgulhosos demais para pedir favores.
O assunto estava encerrado.
Lucrécia olhou para o seu prato, enrubescida. Percebeu que tinha muito o que
aprender. Lamentava ter falado, e agora lançou para Orsini um olhar que
implorava consolo; mas ele não estava olhando para ela. Orsini era uma das
poucas pessoas que não admirava os seus cabelos amarelos e seu rosto bonito.
Ela podia ser uma das cadeiras ornamentais, das quais existiam muitas nos aposentos
principais do palácio, tal era a pouca atenção que ele lhe dava. Adriana estava
com ar severo, e Lucrécia temia que fosse sempre desapontá-la, porque ela era
uma mulher boa e sempre pensava em fazer o que era correcto. Mais tarde,
naquele dia, enquanto ela e Adriana estavam sentadas juntas trabalhando numa
toalha de altar, Adriana disse: Em breve vai ter uma companhia para
compartilhar as suas aulas de dança e música. Lucrécia largou a linha dourada e
esperou, a respiração presa. Eu vou ter uma filha, disse Adriana. Oh, mas...,
uma filha! Eu pensei... Lucrécia, aos nove anos de idade, era bem-informada.
Vira certas coisas lá da casa que dava para a praça; escutara as conversas dos
irmãos e dos criados. Parecia incrível que a piedosa viúva pudesse ter uma
filha. Adriana estava olhando para ela, surpresa, e Lucrécia voltou a
enrubescer.
Meu filho está em idade de se
casar, disse Adriana, com frieza. A noiva dele virá para cá em breve. Ela vai
morar connosco como minha filha até que o casamento se realize. Lucrécia
apanhou a agulha e começou a trabalhar, esperando esconder o seu embaraço. Será
maravilhoso, senhora Adriana, disse ela, mas ficou com pena da jovem que ia
casar-se com Orsino. Orsino é um dos melhores partidos de Roma,disse Adriana,
como se estivesse lendo seus pensamentos. Orsino está feliz?, perguntou
Lucrécia. Está dançando de alegria porque vai ter uma esposa? Orsino foi criado
como um nobre espanhol. Eles, minha querida Lucrécia, não pulam de alegria como
qualquer pastor italiano no Campo di Fiore. Claro que não, senhora Adriana. Ele
vai ser feliz. Conhece o seu dever. Tem de se casar e ter filhos. E a noiva... Em
breve irá vê-la. Vou ensinar a ela tal como ensino a vós. Lucrécia continuou a
costurar, pensando na companheira que ia ganhar. Esperava que a noiva não se importasse
muito..., por ter de casar-se com Orsino.
Lucrécia esperava no grande salão
escuro no qual, porque se tratava de uma ocasião especial, as tapeçarias tinham
sido penduradas. Eles estavam reunidos para saudar a jovem que estava sendo
levada para o novo lar, e Lucrécia se
perguntava como ela
estaria se sentindo. Lucrécia iria tentar logo tranquiliza-la, porque a menina
talvez estivesse um pouco amedrontada. A própria Lucrécia sabia o quanto podia
ser alarmante ser levada de casa para um lugar inteiramente diferente». In Jean Plaidy, Lucrécia Borgia, Edição Record, 1996, ISBN 978-850-104-410-5.
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Jean Plaidy, Itália, Literatura,