sexta-feira, 18 de novembro de 2011

António da Costa Lopes. O Trovador Guilhade. A sua Terra de Origem. «Continuo mantendo a minha afirmação da naturalidade barcelense do trovador, não só pelas razões indicadas no meu citado trabalho, as quais, por si sós, julgo suficientes, mas ainda por outras que apresentarei noutro lugar e dentro em breve, se o tempo mo permitir»

Cortesia da cmbarcelos

História breve de uma longa espera
Verificação importante
«Pela vez terceira e com desenvolvimento agora muito acrescido, confio ao papel a maior e mais significativa parte dos resultados das minhas investigações sobre D. João Garcia de Guilhade. A primeira vez foi em 1946, ano em que publiquei dez páginas sobre o tema, principalmente sobre a naturalidade do poeta, a qual, até então e geralmente, era dada como galega. Assim, por exemplo, João Garcia de Guilhade era, segundo Oviedo y Arce, Menéndez Pidal e Hernâni Cidade, respectivamente, "de patria galaica", "caballero gallego", "trovador galego"; nenhum destes autores, todavia, apresentava razões a favor de tal suposição. Outros, porém, tinham procurado basear essa mesma suposição: a este propósito mencionei em 1946, como citarei de novo no presente trabalho, os nomes de Antonio López Ferreiro, cónego compostelano, e Carolina Michaëlis de Vasconcelos.
Pela minha parte, a “solução satisfatória”, que fundamentadamente dei à questão, naquele ano, assim se resumia:
  • D. João Garcia de Guilhade era português, oriundo de Guilhado, lugar pertencente à freguesia de Milhazes, do, hoje, concelho de Barcelos.
Que esta solução realmente satisfez, mostram-no as palavras com que ela foi acolhida sem demora. O suplemento literário de um diário lisbonense falava da minha “verificação importante para a história da lírica portuguesa medieval”: "não se poderá, de futuro, considerar D. João Garcia como galego": "trata-se dum autêntico trovador português”.
Não menos significativo, para mim, foi o acolhimento manifestado pelo grande, mestre de quem tive a honra e o proveito de ser aluno de História da Literatura Portuguesa Medieval: prudente nas suas afirmações, ele, no que se refere a uma questão parecida, provou que não "morria de amores" pelo concelho de Barcelos. Pois bem: citando o meu estudo de 1946, afirmou que "a contenda deve-se considerar definitivamente resolvida a favor de Barcelos".

Cortesia de cmbarcelos

Sem dúvida, o moço estudante que eu era então não ficou insensível a estas e outras manifestações de concordância. Todavia, cedo me fui apercebendo de que o tema exigia e merecia um aprofundamento e desenvolvimento que só bastante mais tarde lhe poderia dar:
  • primeiro estava a continuação dos meus estudos regulares, concernentes sobretudo a outras áreas do saber, até ao doutoramento;
  • e depois viriam, vieram realmente, os cargos (docência, etc.) aos quais não poderia ou não deveria eximir-me.
E foi assim que, em 1964, depois de escrever que a minha prova da nacionalidade “portuguesa do trovador” tinha sido aceita, que eu soubesse, por todos os autores que da mesma haviam tido conhecimento directo ou indirecto, notando-se apenas alguma reserva da parte de um deles quanto à naturalidade “barcelense do poeta”, logo acrescentei:
  • "Continuo mantendo a minha afirmação da naturalidade barcelense do trovador, não só pelas razões indicadas no meu citado trabalho, as quais, por si sós, julgo suficientes, mas ainda por outras que apresentarei noutro lugar e dentro em breve, se o tempo mo permitir”.
Dado que o tempo me não chega a nada…

As palavras deste subtítulo não fui eu que as escrevi: leio-as numa das mais recentes produções de um grande trabalhador das Letras. E não menos a propósito vem estoutro dizer, de Herculano, relacionado de certa maneira com uma particularidade da presente dissertação:
  • "Por dura experiência sabemos quantos dias e vigílias consome um trabalho histórico de certa extensão e importância". Quero eu dizer o seguinte, que era, para mim, coisa bem sabida já em 1964.
A disponibilidade de tempo, disponibilidade grande e estável, é condição necessária para qualquer trabalho científico, histórico ou outro, "de certa extensão e importância". E não é indispensável só para a fase predominantemente heurística desse trabalho (pesquisa e obtenção dos dados ou materiais: factos, documentos, ideias...); é também necessária para tudo o mais que deve anteceder a conclusão do trabalho e a sua eventual apresentação ao público:
  • reflexão, crítica da própria reflexão e dos dados, ordenação destes, redacção...

Cortesia da cmbarcelos

Repito que, em 1964, isto era já para mim, coisa bem sabida. Sobreveio, contudo, anos depois, o imprevisto: foi-me insistentemente pedido que, a favor de uma veneranda instituição de solidariedade, aceitasse um cargo directivo de grande responsabilidade e enorme delicadeza, o qual exigia muitíssimos e aturados trabalhos e iniciativas de direcção, orientação e renovação. Cedi, por várias e graves razões que não vou aqui expor, e logo previ que tal aceitação prejudicaria gravemente a execução de tarefas culturais que eu, mais de vinte anos antes , para mim programara.
Não contava manter-me tantos anos - mais de trinta! - nesse posto, até porque, além daqueles trabalhos, outros se vieram juntar: assim, por exemplo, vim a ser, por eleição, […]

Adiante!
O método e a disciplina certamente não são tudo, mas valem muitíssimo, para quem quer que veja prolongadamente diminuída a sua disponibilidade de tempo. E foi assim – com o método e a disciplina possíveis -, foi assim que, nas décadas mais recentes, pude continuar as “investigações” sobre os temas que deveras me têm interessado. Já o mesmo não posso dizer das “publicações” nas quais tencionei dar conhecimento dos resultados das pesquisas e das reflexões.
Quanto a Guilhade, porém, razões de sobra me impeliram a dar ao respectivo estudo uma certa prioridade. Assim, quando a Câmara Municipal de Barcelos me convidou para a conferência que proferi em (...), eu próprio escolhi, para assunto da primeira e maior parte do arrazoado, a figura e principalmente a naturalidade do trovador». In António da Costa Lopes, O Trovador Guilhade e a sua Terra de Origem, Câmara Municipal de Barcelos, 2003.

Continua
Cortesia da CM de Barcelos/JDACT