quarta-feira, 29 de novembro de 2017

O Cavaleiro de Olivença João Paulo O Costa. «Buenos dias señores. Podeis falar em vossa língua, señor VascoMelo. Ora, dom García, estava só a tentar ser cortês ao receber-vos em minha terra»

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O pedido da Rainha
«(…) Francisco tivera tempo para preparar a arma; apercebera-se dos sinais que anunciavam o provável socorro e, com o disparo, procurou ganhar tempo e assinalar sua posição. Se porventura fossem outros castelhanos não fazia mal, pois os perseguidores abastavam para sua perdição. Paco estás bem? Ai! Olhe para mim capitão! Achais que estou bem? Devo ter partido o nariz. E perdeste pelo menos um dente, amigo. De rosto coberto de coberto de sangue, Paco desembainhou a espada e começou a correr. Vou matar aquele desgraçado. Dera três passadas, quando estacou. No alto do monte surgiu uma dúzia de cavaleiros e soaram dois estampidos. Os recém-chegados estavam armados com espingardas pelo que tinham vantagem sobre os adversários, mas não davam mostras de querer atacar. Francisco sorriu, pois estava salvo, Olhou para a cabeça do esquadrão português e sentiu ainda mais alegria e alívio. O chefe veio em meu socorro. Estes malditos não se vão atrever a lutar contra ele.
O desânimo apossou-se dos castelhanos. Vede capitão! É o cavaleiro das plumas vermelhas. O que mexe o nariz. E as orelhas. É um grande lutador. Um matador. Rompeu a minha irmã. Mas ela queria-o, Manolo. E gostou muitíssimo. Dizem que é amigo do rei de Portugal. Amicíssimo. Fala muitas línguas. O se castelhano é perfeito. E fala a língua dos mouros. E aquela algaraviada dos flamengos. Um nosso companheiro que veio de Lisboa disse-me que corre por lá que se deita com uma monja. O bicho tem pacto com o demónio. Vejam. Vem directo a nós. Está na minha mira, capitão. Quietos. Se o feres, aqueles perros acabam connosco. E nós estamos em falso.
Os dois grupos de cavaleiros olhavam-se com aparente sossego, mas estavam todos prontos para empunhar suas armas e se matarem; no entanto, os dois comandantes, veteranos de seu ofício, sabiam que não era altura apropriada para verter sangue. O castelhano era um fidalgo já idoso, com mais de cinquenta anos, enquanto seu rival andava pelos trinta. Os portugueses tinham vantagem suficiente para ser óbvio que o correio não seria interceptado, pelo que tudo estava resolvido, mas o capitão português saiu do seu grupo e encaminhou-se para os rivais a passo, enquanto seus homens de armas rodeavam Francisco. Por fim, ficou à beira do comandante castelhano; a viseira do elma estava erguida e todos viram o nariz trepidante.
Buenos dias señores. Podeis falar em vossa língua, señor VascoMelo. Ora, dom García, estava só a tentar ser cortês ao receber-vos em minha terra. Vi vosso pendão e desejo honrar vossa fidalguia. Sois muito amável. Peço-vos perdão por nossa distracção. Estávamos à caça de um porco szelvagem e passámos os limites sem reparar. Vasco sorriu, enquanto encolhia um dedo do pé. Não vi nenhum porco por aqui, mas quem se perde por estas veredas também pode julgar que anda à caça de presas imaginárias». In João Paulo Oliveira Costa, Círculo de Leitores, Temas e Debates, 2012, 978-989-644-184-5.

Cortesia de CL/TDebates/JDACT