Cortesia de arteyconsciencia
O eu como testemunha
«Ao longo de milhões de anos, inúmeras criaturas têm tido mentes activas, mas apenas nos casos em que se desenvolveu um eu capaz de agir como testemunha dessa mente é que a sua existência foi reconhecida. Também só depois de essas mentes terem desenvolvido linguagem e sobrevivido para contar a sua história é que a existência de mentes se tornou conhecida.
O eu como testemunha é o elemento adicional que revela a presença, em cada um de nós, dos acontecimentos a que chamamos mentais. É necessário compreender a forma como esse elemento adicional é criado.
Cortesia de uscedu
O eu permite o vislumbre da mente, mas produz uma visão enevoada. Os aspectos do eu que nos permitem formular interpretações quanto à nossa existência e quanto ao Universo continuam a evoluir, com toda a certeza ao nível cultural, e provavelmente também a nível biológico. Por exemplo, as camadas superiores do eu estão ainda a ser modificadas pelas mais variadas interacções sociais e culturais, e pela acumulação de conhecimento científico sobre o funcionamento da mente e do cérebro.
Um século de cinema terá, certamente, tido um grande impacto no ser humano, bem como o espectáculo das sociedades globalizadas, transmitido de forma instantânea pelos meios de comunicação electrónica.
A nossa única visão directa da mente depende de uma parte dessa mesma mente, um processo individual que temos bons motivos para crer não ser capaz de nos providenciar uma descrição abrangente e fidedigna daquilo que está a acontecer.
Cortesia de lacmawordpress
À primeira vista, depois de reconhecer o eu como forma de acesso ao conhecimento, talvez seja paradoxal, já para não dizer ingrato, pôr em causa a sua fidedignidade. No entanto, é exactamente essa a situação.
Contudo, foi também o eu que tornou possível a razão e a observação científica, e a razão e a ciência,por seu lado, têm vindo a corrigir as intuições enganadoras a que o eu, por si só, nos pode levar». In António Damásio, O Livro da Consciência, Temas e Debates, 1ª Edição, Setembro de 2010, ISBN 978-989-644-120-3.
Cortesia de Temas e Debates/JDACT