Cortesia de Tese de Mestrado
«Filha de dom Pedro III de Aragão, esposa do Rei dom Dinis, sexto rei de Portugal, Isabel de Aragão, canonizada pela Igreja Católica, foi objecto de inúmeros estudos de cariz historiográfico, assim como biografias e romances históricos sobre a sua vida. Tendo em conta que a contemporaneidade continua à procura de figuras e mitos medievais, o romance histórico e as biografias promovem narrativas sobre este período, reconstruindo e relevando o passado histórico. Pretende-se neste estudo apresentar uma visão comparativa do que sobre a rainha Santa Isabel foi veiculado por quatro obras: o texto editado em 1921 por José Joaquim Nunes, Vida e Milagres de Dona Isabel, Rainha de Portugal; o romance de Vitorino Nemésio, Isabel de Aragão Rainha Santa, editado em 2002; a biografia de Maria Filomena Andrade, com o título Isabel de Aragão Rainha Santa, Mãe Exemplar, de 2014; e, por último, o romance histórico de 2016, de Isabel Machado, A Rainha Santa. Tentámos reconstruir uma imagem desta personalidade, focando a sua dupla faceta, histórica e literária / mítica. Neste sentido, analisámos, sobretudo, a forma como a Literatura se apropriou dos dados históricos, apresentando as diferentes descrições que os autores elaboraram sobre os acontecimentos vividos pela Rainha Santa Isabel, de modo a apreciar a originalidade de cada autor na sua abordagem à vida da mesma». In Resumo
A
santa esposa de dom Dinis é uma das mais preciosas pérolas do Flos Sanctorum. No catálogo
dos santos da Igreja católica, se exceptuarmos alguns dos primeiros mártires do
cristianismo, encontrar-se-ão poucos que tenham reunido tantas virtudes como a
rainha Santa Isabel de Portugal. (Benevides, 2011)
A escolha
deste tema surgiu ainda como aluna do Seminário de Literatura e História do
Mestrado em Estudos Portugueses Multidisciplinares da Universidade Aberta,
quando abordámos a temática da proximidade entre a Literatura e a História, o
que, de certa forma, suscitou em mim grande admiração sobre o modo como a
Literatura se pode apropriar da História. Há sempre diversas razões que
sustentam uma escolha. Neste caso, o tema surgiu também pelo fascínio pelo
inquietante e longo período que é a época medieval portuguesa e pela
oportunidade de poder contribuir para demonstrar o diálogo e a interacção que
existe entre a História e a Literatura. Assim, tentaremos mostrar como a
Literatura pode proporcionar uma perspectiva diferente, ou seja, uma outra
leitura e visão dos factos históricos. A abordagem do binómio Isabel personagem
histórica e Isabel personagem literária permitiu-nos verificar a grande
componente interdisciplinar que existe entre estas duas áreas, aparentemente
distantes e na verdade tão próximas, que se servem a si próprias e uma da outra
para alcançar os seus objectivos.
O
facto de ter nascido na cidade de Coimbra e de residir na mesma despertou-me um
maior desejo em aprofundar a vida e a história da Rainha Santa Isabel.
Acrescento que nutro por esta figura o maior respeito e admiração. Com este estudo,
pretendo, de alguma forma, prestar uma homenagem justa a esta personagem ímpar
da história da cidade de Coimbra, uma vez que, para os conimbricenses, a Rainha
Santa é uma figura importantíssima na vida da comunidade, sendo também uma das
Rainhas mais acarinhadas da História de Portugal.
Conceito
de Hagiografia
A
hagiografia desenvolveu-se e consolidou-se a partir da Idade Média com a
expansão do Cristianismo e a difusão do culto aos santos. Estes textos,
escritos por biógrafos do sagrado, emanam da vontade de transformar relatos
orais pré-existentes em documentos que, através da escrita, procuram
uniformizar e legitimar uma crença. O Dicionário
Breve de Termos Literários define Hagiografia como: Subgénero
literário relativo à vida de santos. (Paz e Moniz, 2004). Neste tipo de
texto é apresentada a vida de uma personagem de forma a legitimá-la como santo,
o que é demonstrado graças à narrativa do seu percurso exemplar. Assim, são
retratadas vidas de homens e mulheres que agiram de forma a determinarem a sua
condição de sagrado. Quanto à sua organização, as hagiografias medievais
privilegiaram aspectos diferenciados dos santos, tendo enfatizado ora o
nascimento, a vida, a morte ou os milagres. Estes textos foram utilizados para
descrever o percurso de pessoas, homens ou mulheres, que alcançaram a santidade
e que ao longo das suas vidas procederam de maneira exemplar. Sobre este
assunto, António Manuel Rebelo afirma: Assim, além de descrever e
glorificar a vida e obra do santo, a sua morte e milagres, contribuindo, deste
modo, de forma indirecta para a glória de Deus, mas também para edificação do
crente, a hagiografia aponta para objectivos porventura menos óbvios: morais,
catequéticos, parenéticos, apologéticos, dogmáticos, eclesiásticos, pastorais e
políticos… (Rebelo, 2004).
Para
Cristina Sobral, a categorização dos géneros narrativos coloca a hagiografia
dentro da historiografia: Aponta a partilha pela hagiografia e pela
historiografia medievais dos traços considerados específicos da hagiografia: a
subjectividade, a exemplaridade, o uso da retórica, etc. Inscreve
definitivamente a hagiografia no mesmo campo epistemológico da historiografia
ao rejeitar a classificação tradicional e ao substitui-la por historiografia
sagrada, considerada género histórico que toma como objecto não a história
civil mas a história sagrada, eclesiástica, com todas as consequências que isso
tem, incluindo o facto de o santo ser objecto de um culto. (Sobral, 2005).
A vida dos
santos representados nos textos hagiográficos serve de modelo de conduta cristã
e de sofrimento em nome da fé e a sua finalidade é demonstrar a santidade da
personagem. Cristina Sobral prossegue ainda o seu raciocínio: Assim, pode
concluir-se que, tendo um objecto específico, diferente da História política ou
social, a hagiografia é um registo histórico, que se fixa segundo os mesmos
processos da historiografia (Sobral, 2005). A autora defende assim que a
hagiografia não tem uma posição epistemológica diferente da historiografia.
Finalmente,
o E-Dicionário de
Carlos Ceia, oferece-nos mais elementos sobre o termo hagiografia, definindo-o
da seguinte forma: O vocábulo hagiografia, etimologicamente, é composto dos
termos gregos hagio [hágios], que quer dizer santo e/ou sagrado,
e grafia [grafia], que se refere àquilo que foi posto por escrito, donde,
escrito santo ou escritura sagrada. (Miatello, 2009)». In Isabel Maria M. Costa, Isabel
de Aragão, Rainha Santa, No Período medieval e na actualidade, uma visão
comparatista entre textos literárioa e historiográficos, Dissertação Mestrado
em Estudos Portugueses, Multidisciplinares, www.uab.pt,
2019.
Cortesia de Mestre Isabel Maria Marques Costa
JDACT, Isabel Maria M. Costa, Literatura, Caso de Estudo, História,