segunda-feira, 14 de novembro de 2022

A Rainha Isabel nas Estratégias Políticas da Península Ibérica 1280-1336. José Carlos Gimenez. «Depois que ali chegarom, acharom o infante D. Afonso de Portugal, irmão delrey D. Dinis, e o conde de Portugal a que diziam D. Gonçalo, e outros muitos cavaleiros de Portugal e prelados, que ali atendiam a rainha…»

Cortesia de wikipedia e jdact

Com a devida vénia ao Doutor José Carlos Gimenez

De Infanta Aragonesa a Rainha a Rainha de Portugal

«(…) Assim como em relação ao nascimento, as informações relacionadas à infância de Isabel também são escassas. Alguns autores indicam que a futura rainha de Portugal viveu seus primeiros anos em Saragoça, sob a tutoria do avô, Jaime I; período em que ela realizou seus primeiros contactos com os frades franciscanos, que mantinham uma relação muito próxima com a corte aragonesa. Com a morte do avô, em 1276, a Infanta passou aos cuidados dos pais, porém continuou a receber uma formação educacional e religiosa nos princípios franciscanos até completar dez anos, quando foi a Portugal para casar-se com o rei Dinis.

Como estratégia política, o ritual que envolveu o casamento de Dinis com Isabel foi marcado por um período de intensa troca de informações entre os dois reinos para se certificarem de que se tratava de uma aliança benéfica. Nessas negociações, como em outras que aconteceriam durante a vida da Rainha Isabel, o papel dos procuradores foi de fundamental importância para estabelecer os compromissos e obrigações entre as duas monarquias peninsulares. As negociações iniciaram-se, em 1280, com a visita dos embaixadores portugueses à corte aragonesa, E avendo dous anos que elRey D. Denjs reynaua, (...) ouujndo a fama e bondade da Iffante, desejou de a auer por molher. E estando em Estremoz, ordenou seus procuradores (...) e emujoua a pedir a el Rey de Aragão seu padre. Em Fevereiro de 1281, foram assinados os acordos, em Barcelona, pelos embaixadores dos dois reinos e, em Abril do mesmo ano, os representantes dos dois reinos reuniram-se em Vide, agora com a presença de Dinis para selarem o contrato matrimonial.

As negociações foram retomadas em Novembro de 1281, quando Dinis nomeou os embaixadores portugueses para fazerem o casamento, que se realizou em Fevereiro de 1282, em Barcelona, sem a presença do rei português: Eu Isabel filha do Excelente D Pedro, por graça de Deos illustre Rey de Aragão, faço entrega de mim para muher legitima a vos Dõ Dinis pela graça de Deos Rey de Portugal, & Algarue, e ainda que ausente, mesmo que se estiuereis presente.

A ausência do rei na cerimónia é apenas mais um detalhe, entre outros, que envolvia os rituais de casamento naquele período: No entanto, as bênçãos matrimoniais só foram celebradas na igreja de São Bartolomeu, em Trancoso, em Julho de 1282, onde o rei e os representantes da corte esperavam a infanta Isabel.

Depois que ali chegarom, acharom o infante D. Afonso de Portugal, irmão delrey D. Dinis, e o conde de Portugal a que diziam D. Gonçalo, e outros muitos cavaleiros de Portugal e prelados, que ali atendiam a rainha. E, depois que o ifante D. James aqueles achou, tornou-se pera Castela e leixou a rainha aaqueles portugueses; e chegarom com ela aa vila de Trancoso, e ali chegou elrey D. Dinis e ali se fezerom as bodas e deu elrey oficiaes e terras aa rainha.

Estabelecidos os compromissos entre os dois reinos, o casamento do rei português com a Infanta aragonesa necessitava ainda, para ser finalmente reconhecido pelos súditos do reino, ser legitimado pela Igreja, questão esta que não seria resolvida de imediato devido às constantes lutas entre a Coroa e a Igreja. As inúmeras tentativas de assentar um acordo com o papado para o restabelecimento das práticas religiosas no reino era um legado que o pai de dom Dinis, Afonso III (1248-1279), havia lhe deixado. Segundo Mattoso, as rivalidades entre os monarcas da primeira dinastia portuguesa com o clero local estão relacionadas também, à tentativa dos reis de estabelecer um limite aos poderes senhoriais da nobreza e do clero sobre as terras da coroa. Embora os reis procurassem se acercar de uma nobreza que lhes desse apoio, procuravam, por meio dos laços de vassalagem, um grupo limitado formado pelos mais poderosos; o que não excluía a rivalidade. Essa tentativa de equilíbrio, realeza/nobreza, alterou-se desde o reinado de Afonso II (1211-1223) devido à prematuridade da afirmação do poder régio contra os privilégios dos poderes senhoriais, fossem eles do clero, das ordens militares, da alta ou da pequena nobreza. A conjuntura política do reino ficaria mais delicada ainda no governo de Sancho II (1223-1248). Esse rei, diferentemente do seu antecessor, não conseguiu travar o avanço dos poderes senhoriais sobre as terras do reino e sobre os poderes da Igreja local, situação que levaria, a partir de 1245, os descontentes do reino e os bispos portugueses, com o apoio do papa Inocêncio IV (1243-1279), a destituí-lo do poder e nomear seu irmão, Afonso III, como substituto ao trono. Ainda segundo Mattoso, os contactos que Afonso III havia feito com o desenvolvimento da centralização monárquica foram postos em prática pelo rei francês Luis IX (1226-1270), no tempo em que esteve naquele reino como conde de Bolonha. Isso possibilitou-lhe, após a guerra civil (1245-1248) e a morte do rei Sancho II, reorganizar a administração do reino sujeitando clero e nobreza, tanto na esfera da política fiscal como da judicial. Facilitado pela decadência das antigas linhagens, dom Dinis avançaria, ainda mais, a política de centralização do reino por meio do aperfeiçoamento da justiça e da recuperação dos direitos senhoriais sonegados pela nobreza, por meio de repetidas inquirições». In José Carlos Gimenez, A Rainha Isabel nas Estratégias Políticas da Península Ibérica 1280-1336, Teses de Doutoramento, UF do Paraná, Ciências Humanas, 2005.

Cortesia de UFParaná/CHumanas/JDACT

 JDACT, José Carlos Gimenez, Caso de Estudo, Península Ibérica, Rainha Isabel,