Peru
Um Ano Depois
«(…) Cotten encolheu-se no
assento e; ao fazê-lo, viu de relance o brilho de luzes tremeluzindo lá em baixo.
Apenas farrapos de nuvens passavam pelo avião enquanto se aproximavam do solo. Quase pousamos. Quase pousamos. Se
tivesse o maldito tranquilizante no bolso, poderia tomá-lo. Mas havia deixado
os comprimidos na bagagem de mão guardada no compartimento em cima. Caso se levantasse
e pegasse a bolsa, todos olhariam para ela..., alguém poderia até mesmo
reconhecê-la. Cotten fechou os olhos de novo, concentrando-se em respirar e
relaxar o corpo, começando pelos dedos dos pés, pensando em cada músculo,
subindo pelo corpo até o couro cabeludo. Respirações profundas, lentas, iguais.
Inspirando pelo nariz, expirando pela boca. As rodas guincharam ao tocar o
solo. O avião balançou duas vezes antes de deslizar suavemente sobre a pista. O
ruído da redução da potência dos motores soou quase como uma serenata
maravilhosa para ela. A respiração de Cotten voltou ao normal e os dedos
relaxaram sobre o braço da poltrona. A região da nuca refrescou-se com a humidade
do suor. Ela afundou no assento, agradecida por ter passado o encantamento, ela
preferia essa palavra a ataque, mas sem saber se o vencera ou se o pouso seguro
é que havia reduzido a tensão a um nível mais controlável. Agora não importava.
Estava no chão. Esse trabalho não era grande coisa, mas era pago como freelance, e a ajudaria a
escalar mais um degrau na escada da respeitabilidade. O desastre no Texas no
ano anterior não lhe havia custado apenas o emprego na emissora, a imagem e a
credibilidade, mas também havia-lhe tirado o respeito próprio. Não havia
restado quase nada que pudesse ser aproveitado.
Finalmente, ela ouviu o suave
toque do sinal de Apertar os Cintos sendo desligado. Depois de se levantar e
pegar a bagagem de mão do compartimento superior, esperou até o corredor se
esvaziar e todos terem deixado o avião. Pensou em pegar o remédio contra a
ansiedade, mas resistiu a abrir a bolsa. Na saída, a tripulação dirigiu-lhe os
obrigatórios cumprimentos de despedida quando ela passou pela porta de desembarque.
Cotten inclinou a cabeça educadamente e exibiu o que sabia tratar-se de um
sorriso falso. Mas, no momento, era o máximo que conseguia fazer.
Abrindo caminho para o terminal
de bagagem, Cotten tirou o telefone móvel do bolso. Abriu-o e correu os olhos
pela lista de contactos em busca do nome de Paul Davis. Assim que ligou o
aparelho, viu o sinal de uma chamada não atendida. Pressionou o botão para
consultar a relação de ligações recentes. John Tyler. Só de ver o nome dele seu
coração acelerou. Fechou momentaneamente os olhos e, naquele mesmo instante,
pôde ver mentalmente aqueles olhos intensamente azuis. Deus, sentia tanto a
falta dele! Se ele não fosse padre, com certeza a vida deles seria diferente». In
Lynn Sholes e Joe Moore, O Último Segredo, 1995,Editora Pensamento, 2015, ISBN
978-853-151-778-5.
Cortesia de EPensamento/JDACT
JDACT, Lynn Sholes, Joe Moore, Literatura, Mistério,