domingo, 4 de abril de 2010

Oliveira Martins: História, Política, Economia e Sociologia

(1845-1849)
Joaquim Pedro de Oliveira Martins foi um político e cientista social português. Oliveira Martins é uma das figuras-chave da história portuguesa contemporânea. As suas obras marcaram sucessivas gerações de portugueses, tendo influenciado vários escritores do século XX, como António Sérgio, Eduardo Lourenço ou António Sardinha.
Elemento animador da Geração de 70, revelou uma elevada «plasticidade» às múltiplas correntes de ideias que atravessaram o seu século.
Oliveira Martins colaborou nos principais jornais literários e científicos de Portugal, assim como nos políticos e socialistas. A sua vasta obra começou com o romance «Febo Moniz» (1867) e estende-se até à sua morte, em 1894. Na área das ciências sociais escreveu «Elementos de Antropologia» (1880), «Regime das Riquezas» (1883) e «Tábua de Cronologia» (1884).
Das obras históricas há a destacar «História da Civilização Ibérica» e «História de Portugal» (1879), «O Príncipe Perfeito (vol. póstumo)» (1896), «O Brasil e as Colónias Portuguesas» (1880) e «Os Filhos de D. João I» (1891). A sua obra suscitou sempre controvérsia e influenciou a vida política portuguesa, mas também historiadores, críticos e literatos do seu tempo e do século XX.

Oliveira Martins foi um autor ecléctico, atitude filosófica que nele traduzia um espírito de abertura mental avesso à cristalização em sistemas rigidamente constituídos, oscilando, por isso, entre o racionalismo iluminista, o positivismo e o movimento de ideias dos românticos alemães. Daí também a possibilidade de, ao longo da sua vida, podermos delimitar etapas várias e fases distintas que marcaram outros tantos momentos de assimilação crítica e de adesão às ideias da época. Atitude que sempre o caracterizou foi a de um vincado pendor para os problemas morais, logo manifestado na publicação do seu primeiro livro, «Febo Moniz», romance histórico, escrito sob a inspiração de Alexandre Herculano, e posteriormente reforçado numa concepção da história como mestra da vida e dos costumes. Este espontâneo eticismo favorecerá a simpatia com que encarou a obra de Proudhon, na linha fundamental que percorreu os escritos deste autor: a ideia de justiça universal. Proudhon representa, por isso, um encontro e uma adesão natural para Oliveira Martins. Como mais tarde escreveria, a justiça era «a própria substância da alma humana que o tempo nos vai gradualmente revelando [...] Essa revelação é a razão da nossa existência» Todavia, a grande projecção alcançada no seu século por Hegel, que Oliveira Martins considerava «o Aristóteles da idade moderna», conduzi-lo-á à tentativa de explorar as potencialidades do pensamento do filósofo de Iena. A tendência hegeliana e idealista explica em boa medida a sua oposição a certos aspectos do positivismo, nomeadamente à indiferença deste perante a metafísica. Deste modo, procurou realizar o que designava como a fusão do «génio francês» com o pensamento alemão, de modo a expurgar este último do «dogmatismo escolástico» que o animava na mãe-pátria, num panorama ecléctico, que conciliava «a justiça com a filosofia objectiva». De filosofia objectiva se tratava, de facto, porque, para Oliveira Martins, a verdadeira realidade era de natureza ideal, residindo no espírito, como afirmou na sua História de Portugal.
Nesse sentido, a história do homem mais não era, na sua substância, do que a revelação do espírito: «A manifestação do Espírito consciente, na sua plenitude, é o princípio do mundo e a finalidade da História» Concepção ontológica da História em que a revelação progressiva do espírito constitui a «lei fatal da evolução», mediante a qual o indivíduo se vai gradualmente afirmando um ser moral e livre e que, em Portugal e o Socialismo, identificava com o advento do socialismo.

Aspecto a realçar é, pois, o seu esforço em libertar o conceito de evolução, que Antero de Quental definiria como a ideia central do século, de uma exclusiva visão mecanicista do universo, remetendo-a para o âmbito da metafísica. Por isso, nos Elementos de Antropologia defendeu que, se a ciência natural confirmava e impunha a tese da evolução do homem, este não era, todavia, um ser exclusivamente natural, mas também um ser moral e livre, sendo, portanto, pela manifestação do seu espírito consciente que verdadeiramente se afirmava. Concepção ontológica mas igualmente concepção finalista da história: a história acaba no dia em que o homem obtiver a soma de espírito consciente de que é capaz, esse dia só pode chegar quando a unificação de todas as raças e a civilização de todos os povos estiverem consumadas.
Há uma diferença entre lógica e história, a mesma que obriga a distinguir o «homem real» do «homem ideal», de que aquele é apenas uma «imagem rude». É nessa distância entre lógica e história que situa o âmbito de intervenção do acaso e do fortuito, enquanto cruzamento de séries causais independentes. Aí reside também a explicação para a diferença de critérios com que analisa o nosso passado histórico, expressa na História da Civilização Ibérica e na História de Portugal. Enquanto na primeira destas obras se preocupa com a análise daquilo que designa como «a corrente íntima da história», à luz de um critério necessariamente metafísico, expressa pela ideia romântica de «alma nacional» dos povos, encarnando nos seus heróis (cf. também Camões e a Renascença ... ), já na segunda constrói, como num teatro dramático, a história dos actos individuais, desligados do seu suporte ideal. Enquanto ao nível metafísico tudo é sublime e puro, porque tudo é de natureza ideal, ao nível fenoménico a história tende a surgir como um espectáculo vil de misérias, paixões e lutas de interesses privados, que, todavia, educa moralmente, pelo sentimento de repulsa que em nós gera.

Após o malogro da sua experiência política e governativa, entra numa fase de pessimismo e descrença. O mundo surge-lhe, a partir de finais da década de 80, como um irremediável espectáculo de contradições insofismáveis. Desvanece-se a crença na vitória da Justiça, da Ideia ou da Consciência. A paz, a harmonia e a justiça eram ideias que habitavam decididamente dentro de nós, em radical desfasamento com a realidade observável, e esse paradoxo afigurou-se-lhe, desde então, inultrapassável. Encarava então o mundo à luz do predomínio do inconsciente irracional de Hartmann, ancorando-se ainda ao pessimismo de Schopenhauer, encontrando apenas na arte uma vaga e momentânea possibilidade de conforto. In Pedro Calafate
Pedro Calafate/JDACT

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