Cortesia da BCMPortalegre
Com a devida vénia a Margarida Ribeiro e ao seu artigo «Estojo de prata do século XVII com a imagem de N. Srª da Conceição de Vila Viçosa», Lisboa, 1972, Biblioteca Municipal Portalegre nº 32674, 9081469.51/RIB.est.
«Há cerca de oito anos, ao consultarmos a obra de Vitorino de Almada, «Elementos para um Díccíonario de Geografia e Historia Portuguesa. Concelho d'Elvas e extínctos de Barbacena, Villa Boim e Villa Fernando, T. II, Elvas, 1889, p. 62», deparámos, acidentalmente, com a breve referência a um pequeno objecto de prata com a imagem de Nª Srª da Conceição, que serviu de «senha» aos conspiradores de 1640. Verificámos que essa referência foi repetida por Eurico Gama (encontra-se no Museu de Elvas a lápide, que cobria a sepultura de D. Antão de Almada, Sep. da Revista «Independência», Ano XXVII n. 38, Lisboa, L968, p. 6) e pelo ilustre Conde de Almada, que a enriqueceu com uma esclarecedora nota, declarando ali que a referida «senha» se encontrava na posse da Condessa de Ficalho. Apesar desta importante referência, a pesquisa foi trabalhosa e demorada. O estojo de prata já não se encontrava na posse dos titulares de Ficalho. Em vão procurámos na bibliografia do acontecimento histórico de 1640 qualquer gravura ou descrição pormenorizada da peça de prata que, apesar do seu reconhecido interesse histórico e da sua alta significação espiritual, havia escapado à observação dos estudiosos. A perseverança nesta busca, dificultada pela sucessiva transmissão de heranças dos Ficalhos e pelo presumível melindre, que só um procedimento judicioso poderia acautelar, liga-se ao estudo, que ainda intentamos levar a cabo, sobre a difusão de pendentes e de medalhas de Nª Srª da Conceição e consequente origem e filiação artística das pequenas estatuetas de ouro, que serviram, simultâneamente, para colocar em oratórios ou usar suspensas de fitas e de colares.
Os museus e os coleccionadores estrangeiros não foram esquecidos na pesquisa que desenvolvemos. A raridade do objecto não deixaria de cativar a atenção destes últimos. Chegámos a pensar que a peça se tivesse eventualmente perdido em França, em virtude da Condessa de Ficalho se ter refugiado em Paris e em St. Jean de Luz, talvez do final de 1911 a 1914.
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Imprevistamente, decorridos vários anos, foi graças à actuação de Isabel Sousa de Macedo, neta, por linha varonil, da falecida Condessa de Ficalho, que a «senha» foi encontrada na posse de Helena Costa da Câmara, residente em Cascais. Por solicitação nossa, o objecto foi-nos prontamente cedido para estudo com a alta compreensáo, a magnanimidade e a gentileza fidalga que sempre distinguiram os Ficalhos.
Fica lavrado aqui o nosso reconhecimento pelo nobre gesto, pelo contributo dado à Cultura e pela honra de podermos estudar uma relíquia tão directamente ligada à gesta da Restauração.
A notícia da «senha», inédita e considerada única, até este momento, foi apresentada numa das sessões de trabalho das II Jornadas Arqueológicas, ocorridas de 13 a 15 de Outubro do ano corrente, por iniciativa da veneranda Associação dos Arqueólogos Portugueses, como constará das respectivas actas.
Fica lavrado aqui o nosso reconhecimento pelo nobre gesto, pelo contributo dado à Cultura e pela honra de podermos estudar uma relíquia tão directamente ligada à gesta da Restauração.
A notícia da «senha», inédita e considerada única, até este momento, foi apresentada numa das sessões de trabalho das II Jornadas Arqueológicas, ocorridas de 13 a 15 de Outubro do ano corrente, por iniciativa da veneranda Associação dos Arqueólogos Portugueses, como constará das respectivas actas.
O estojo de cujo estudo nos ocupamos tem forma cilíndrica e é constituído por duas peças fundamentais:
- a caixa propriamente dita, de prata lavrada;
- a imagem de Nossa Senhora da Conceição, de barro muito fino ou terracota policromada.
Não apresenta punção de ourives, nem marca de contraste. Está muito danificada na parte superior mais saliente, por esmagamento, e muito gasta na zona central do corpo. Como se trata de um objecto totalmente executado à mão, algumas linhas apresentam pequenas irregularidades. Nas medições de estudo verifica-se um acréscimo de 2 a 3 milímetros, em relação à altura total da peça, por aquela circunstância.
Dímensões e peso:
- Alt. total: 13,45 cm;
- Diâmetro: 4,4 cm;
- Peso total: 186 g.
Elementos artísticos e formais
A peça descrita situa-se, cronologicamente, na primeira metade do século XVII. O cinzelado baixo que caracterizou o trabalho português daquela época e o estilo predominantemente geométrico, suavizado com a ornamentação vegetal a preencher os campos, demonstram a ilação (Sobre o cinzelado baixo indo-português, em oposição ao cinzelado baixo de tipo português, cercado a cinzel para ganhar volume sobre as massas do fundo, vide João Couto, Alguns subsídios para o estudo técnico das peças de ourivesaria no estilo denominado indo-português, Lisboa,. 1938, Sep. das «Actas» do I Congresso da História da Expansão Portuguesa no Mundo, Lisboa, 1938).
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A ausência de marca e o ensaio visual da prata conferem também ao objecto a cronologia indicada. Sabemos que só depois de 1688, por lei de D. Pedro II, as pratas levaram os punções dos contrastes e dos ourives, e só a partir de 1887 se usaram nas ligas da prata as percentagens de 833 e 916 milésimas. Às dimensões gue apresenta são consideràvelmente superiores àquelas que foram atribuídas à «senha» dos conspiradores, cerca de 8 cm de comprimento e 2 cm de diâmetro.
O provável número limitado de exemplares, as restrições impostas à divulgação de cópias e o próprio significado da inscrição que o objecto possui obstaram a que chegasse ao completo conhecimento público, em todos os pormenores.
A «senha» gravada na chapa da gaveta e o próprio invólucro trabalhado são causas aparentes. O que se legislou, festejou, memorou e ficou na tradição constitui na verdade o factor essencìal, Nossa Senhora da Conceição.
Alcançada a vitória, a peça repousou no decoro e no segredo em que vivera antes, embora conservada como memória dos eventos históricos de uma família, cujas recordações mais vivas se vão atenuando também com o decorrer do tempo.
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Conclusões finais
A peça estudada esteve desde sempre na posse da Família Ficalho e desde sempre se conservou na memória do acontecimento histórico que restaurou a soberania portuguesa. É a peça que esteve na posse do Marquês de Ficalho, como Vitorino de Almada registou, e na posse da Condessa de Ficalho, como declarou o Conde de Almada. Por consequência, o objecto a que se referem as citações literárias anotadas. Provam-no as características que apresenta e assim no-lo confirma o fiel testemunho de uma fidalga de 80 anos. A relíquia foi sempre conhecida pela designação de Nossa Senhora dos Conspiradores, designação que lhe foi transmitida por sua ilustre mãe, a falecida Condessa de Ficalho.
Resta averiguar quem foi o antepassado dos Ficalhos que esteve directamente ligado à conjuração de 1640. A tarefa não é facll. Os Mellos de Serpa não se deixaram seduzir pela política palaciana, nem pelos deslumbramentos da corte. Impõe-se, portanto, uma perseverante busca no arguivo da Casa, a cuja ordem e conservação a Marquesa de Ficalho tem dedicado especial atenção. A relação dos conjurados não está completa. O exemplo de João de Sanches Baena, asseguram que um melhor e mais atento estudo do movimento e da organizaçáo da conjura deverá trazer à luz nomes que foram esquecidos, mas cuja dignidade impediu qualquer tentativa de reivindicação.
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Nascida em Évora, a ânsia de liberdade da Pátria conquistou a nobreza e os espíritos mais cultos da época. António Ferrão, baseado nas obras cie Teobaldo Fischer, Jean Brunhes e Silva Teles, analisa as causas geográficas e étnicas da nossa existência nacional, «A Restauração de 1640. Como se perdeu e se reconquistou a independência (1580-1668). Discurso, seguido de notas justificatitvas. Lisboa, Tip. Emp. do Diário de Notícias, 1919». A própria legitimidade da Restauração, defendida por Francisco Velasco de Gouveia no momento da restituição do Reino à soberania portuguesa, constituíu doutrina que os defensores da Restauração aproveitaram para legitimar pelo direito natural e público a deposição do rei intruso. Uma importante achega sobre a tese da hierarquia é o conhecimento que temos da acção de Francisco de Mello, residente em Santarém, que colaborou na conjuração por meio de mensagens escritas.
À clarividente inteligência e preparação dos Jesuítas, à sua arte de educar e instruir, à sua disciplina mental se deve o auxílio que permitiu à nobreza fiel e militante de Portugal contar com as vontades e estar no pleno conhecimento da política de dois reinos. A análise do Ratío Studiorum revelou que tal sistema, ao contrário de ser um tratado teorético sobre a arte de ensinar e educar, foi um antes um métoclo pedagógico e prático de que os Jesuítas dispuseram para esclarecer os discípulos, impedindo-os de leituras prejudiciais à crença católica (Obra cit.,T.2.º, vol. II, Porto, 1939, pp. 18-46). O auxílio dos jesuítas é, pois, matéria conhecida.
A organização do plano da conspiração e a forma de o pôr em prática dentro de uma área territorial tão vasta e a coberto de toda a suspeita continua, porém, por esclarecer completamente.
A organização do plano da conspiração e a forma de o pôr em prática dentro de uma área territorial tão vasta e a coberto de toda a suspeita continua, porém, por esclarecer completamente.
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Uma pesquisa no Arquivo da Casa Ficalho e nos arquivos particulares, a dim de se chegar a uma certeza histórica. A conjectura só é admissível quando a informação documental a abona ou a limita ao prazo dos documentos de que dispomos. Tal averiguação e estudo transcendem, porém, o nosso propósito. Limitámo-nos a apresentar uma peça inédita, cuja divulgação obrigará a uma justa reivindicação e consequente aditamento à lista dos conjurados, e à reflexão sobre o plano da conjura de 1640.
Muitos elementos faltam para o esclarecimento histórico de tão importante facto. Contudo, uma nova achega fica registada». In Margarida Ribeiro, Estojo de prata do séc. XVII com a imagem de N. Sra. da Conceição de Vila Viçosa.