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Do
Tempo das Pirâmides ao Tempo das Catedrais. Viagens
ou Comunhão de Espírito?
«(…)
O
falso problema do paganismo
Princípio
dos ensinamentos para abrir o espírito,
instruir
o ignorante,
e
fazer conhecer tudo o que existe,
tudo
o que Pta (deus dos artesãos) criou,
tudo
o que Thot transcreveu,
o
céu com os seus elementos,
a
terra e o seu conteúdo,
o
que vomitam as montanhas,
o
que é arrastado pelo rio,
o
que a Luz ilumina,
tudo
o que brota do dorso da terra...,
As
primeiras linhas destes ensinamentos da autoria do sábio egípcio Amenemope
teriam podido ser redigidas por um Mestre de Obras da Idade Média. A mesma
inquietação, o mesmo sentido da vida, a mesma missão a cumprir. Uma análise
rápida e muito facilmente aceite consiste em opor religião revelada a religião
dita pagã. Esta análise é fruto da dogmática romana, não da visão profunda dos
homens da Idade Média. Para eles, Deus está em todos os tempos e em todos os lugares.
Os Antigos ouviram a Sua voz; assim devemos nós prestar atenção à voz dos
Antigos.
A matéria-prima, síntese de todas
as formas vitais, da mais animal à mais humana: suporte da Grande Obra, seja
ela alquimia ou catedral.
A religião pagã é, no seu sentido
etimológico, a religião dos campos. Foi ela que a Roma administrativa e jurídica
tentou destruir. Tentativa vã porque a cristandade medieval repousa sobre uma sociedade
agrícola onde a natureza desempenha o papel principal. A arte cristã da Idade
Média á também ela uma arte pagã. Quando o Mestre de Obras instala o altar no
centro da catedral, está perfeitamente consciente de que a pedra fundamental
que assenta representa todos os altares dos Antigos que o precederam. A prova desta
consciência da Tradição esotérica é-nos dada pelo ritual de consagração do altar.
Quando o realiza, o celebrante invoca Deus e dirige-lhe um apelo preciso: que o
Criador abençoe a pedra sacrificial que já foi venerada por Abel, o rei-sacerdote
Melquisedech, Isaac e Jacob. Assim se reúnem as diferentes expressões
religiosas na unidade do culto celebrado no interior da catedral.
O Egipto, Centro
do Mundo
O Egipto não se situa em África
(?). Ou, pelo menos, não apenas em Africa. Se é verdade que as influências do continente
negro são importantes para a elaboração da civilização egípcia, não é menos verdade
que os egípcios são semitas ou uma raça aparentada. No ponto da convergência entre
o Médio Oriente e o Ocidente, o Egipto foi, durante um considerável número de séculos,
o centro do mundo, tendo-se tornado, logicamente, o ponto do globo onde se encontraram
as antigas sabedorias e o cristianismo nascente. A Didascália, primeira grande escola,
de teologia cristã, nasceu em Alexandria, a Grande, que acolhia com agrado pesquisas
espirituais como o hermetismo, o gnosticismo ou o maniqueísmo. A mitologia greco-romana
registou a espiritualidade dos faraós e, impregnada destes significados
antiquíssimos, passou para a mitologia, dos pensadores medievais.
Durante os primeiros séculos da nossa
era, bastante perturbada pelas convulsões da sociedade, os que possuíam a Sabedoria
estavam, na sua maioria, afastados da direcção dos assuntos deste mundo. Para se
manterem a salvo dos poderes políticos e doutrinais que se sucediam, tinham de falar
de maneira hermética, de começar a viver segundo o princípio das sociedades secretas
no interior de uma sociedade que já não era uma civilização. Tanto no Médio Oriente
como no Ocidente, as comunidades tomaram em mãos a herança simbólica dos
Antigos e continuaram a difundi-la. A gnose, fundamento do cristianismo primitivo,
constituía um quadro favorável para preservação do esoterismo, apesar da
hostilidade de alguns bispos mais preocupados com o poder pessoal que com o Conhecimento.
Curiosamente,
Alexandria, a Grega, Alexandria ad Aegyptum, isto é, na margem, à beira do
Egipto, não se esquece que as tradições faraónicas estavam mesmo ali ao lado. A
redacção e a difusão dos Evangelhos foram uma oportunidade para os sábios de
Alexandria incluírem nos seus textos numerosos símbolos e mitos egípcios. O grande
porto do Baixo Egipto foi para os cristãos de todas as tendências um fórum cultural
onde todas as experiências podiam ser ensaiadas. Esta atitude correspondia
perfeitamente ao espírito dos egípcios, que sabiam acolher as ideias novas
preservando as palavras dos antigos». In Christian Jacq, Le Message des
Constructeurs de Cathédrales, Éditions du Rocher, 1980, A Mensagens dos
Construtores de Catedrais, Instituto Piaget, Romance e Memória, Lisboa, 1999,
ISBN 972-771-129-4.
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