The British Museum. Londres. 14 de Novembro
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02h22, GMT Londres, Inglaterra
Safia postava-se diante da barricada, uma vedação em A preta e amarela. Mantinha os braços cruzados, ansiosa, gelada. O fumo impregnava o ar. O que acontecera? Atrás da barricada, um polícia segurava a sua carteira na mão e comparava a fotografia com a mulher à sua frente. Ela sabia que ele tinha dificuldade em fazer corresponder às duas. Na sua mão, o cartão de identificação do museu retratava uma mulher cuidada de trinta anos de idade de tez cor de café com leite, cabelo de ébano apanhado atrás numa eficiente trança e olhos verdes escondidos por trás de uns óculos de leitura escurecidos. Em contraste, diante do jovem guarda apresentava-se uma mulher ensopada e enlameada, com o cabelo desregradamente colado em longas faixas ao rosto. Os olhos dela pareciam perdidos e confusos, centrados para lá das barreiras, para lá do frenesim do pessoal e equipamento de emergência. Equipas noticiosas ponteavam a paisagem, aureoladas pelos focos das suas câmeras. Alguns camiões de reportagem televisiva estavam estacionados em cima dos passeios. Reconheceu igualmente dois veículos militares entre as equipas de emergência além de efectivos empunhando armas.
A possibilidade de um ataque
terrorista não podia ser descartada. Ela ouvira tais rumores entre a multidão e
de um repórter que tivera de evitar para chegar à barricada. E não poucos lançaram
olhares suspeitosos na sua direcção, a árabe solitária na rua. Ela tivera uma
experiência em primeira-mão com o terrorismo, mas não da maneira que eles
suspeitavam. E talvez ela interpretasse mesmo erradamente as reacções à sua
volta. Uma forma de paranóia, designada como hiper-ansiedade, era uma sequela
frequente de um ataque de pânico. Safia prosseguiu por entre a multidão,
respirando pesadamente, centrando-se no seu propósito ali. Lamentou ter
esquecido o guarda-chuva. Ela deixara o apartamento imediatamente após a
chamada, demorando-se apenas o suficiente para vestir umas calças de caqui e
uma blusa branca floreada. Pusera um casaco Burberry pelo joelho, mas na
pressa, o guarda-chuva a condizer fora deixado no seu posto junto à porta. Só
quando chegou ao primeiro andar do edifício e se precipitou para a chuva,
percebeu o erro. A ansiedade impediu-a de voltar a subir ao quarto andar para o
recuperar. Ela tinha de saber o que acontecera no museu. Passara a última década
a construir a colecção e os últimos quatro anos a dirigir os seus projectos de investigação
fora do museu. Quanto fora arruinado? O que poderia ser salvo?
Lá fora, a chuva
crescera de novo para uma bátega persistente, mas pelo menos os céus nocturnos
estavam menos coléricos. Quando alcançou o posto de controlo de emergência que
coordenava o acesso, estava ensopada até aos ossos. Estremeceu quando o guarda
se mostrou satisfeito com a identificação. Pode seguir. O inspector Samuelson
está à sua espera. Um outro polícia escoltou-a até a entrada sul do museu. Ela
olhou para cima para a sua fachada de colunata. Mostrava a solidez de uma caixa-forte,
uma permanência que não podia ser questionada. Até essa noite... Foi conduzida
pela entrada e por uma série de escadas abaixo. Passaram por portas
assinaladas: Reservado ao Pessoal do Museu. Ela sabia para onde estava a ser
levada. Para a base de segurança subterrânea. Um guarda armado postava-se de
sentinela à porta. Assentiu à sua aproximação, claramente à espera deles. Abriu
a porta. A sua escolta passou-a a um novo elemento: um homem de tez negra envergando
traje civil, um indistinto fato azul. Era alguns centímetros mais alto que
Safia, o cabelo completamente cinza. O rosto parecia de couro gasto. Ela reparou
numa mancha prateada de restolho nas suas faces, por barbear, muito provavelmente
arrancado da cama. Ele estendeu uma mão vigorosa. Inspetor Geoffrey Samuelson,
disse com a mesma firmeza do seu aperto de mão. Obrigado por ter acorrido tão
prontamente. Ela assentiu, demasiado nervosa para falar. Se quiser fazer o
favor de me acompanhar, doutora al-Maaz, necessitamos da sua ajuda na investigação
da causa da explosão. Minha?, conseguiu pronunciar. Passou por uma sala de
descanso, atulhada de pessoal de segurança. Parecia que todo o pessoal, de
todos os turnos, tinha sido convocado. Ela reconheceu vários dos homens e
mulheres, mas fitavam-na agora como se fosse uma estranha. O murmúrio do seu
arrazoar silenciou-se enquanto ela passava. Eles deviam saber que ela fora
chamada, mas tal como ela não pareciam conhecer a razão. Contudo, era clara a
suspeição por detrás do silêncio. Endireitou mais as costas, a irritação a
faiscar por entre a ansiedade». In James
Rollins, A Cidade Perdida, Bertrand Editora, 2015, ISBN 978-972-252-930-3.
Cortesia de BertrandE/JDACT
JDACT, James Rollins, Literatura, A Arte,