quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Ofélia Marques: «Ela visita-se, revisita-se, olha-se e transveste-se. ... plurais rostos de uma mulher. Nesse exercício exploratório da sua própria figura, que resultou um importante núcleo de auto-retratos, como o mais significativo da arte coeva portuguesa»

(1902-1952)
Lisboa
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Ofélia Marques, apesar de ilustradora profissional de livros e revistas, a sua colaboração com a imprensa foi algo irregular. E se, em termos técnicos, o desenho foi a área em que mais investiu, dadas as características do mercado, foi porém em pintura que viu o seu talento premiado, com a atribuição do Prémio Sousa-Cardoso, em 1940.

Em termos expositivos, embora estreando-se em 1926, no II Salão de Outono, no modernista salão Bobone, integrou depois várias outras mostras, incluindo as Gerais de Artes Plásticas, mas jamais organizou uma única exposição individual. Embora reconhecida pelos pares, o auto-didactismo, que tantos modernistas assumiram como valor de liberdade artística contra o academismo, foi muitas vezes apontado, no seu caso, como razão para a escassa expressividade e hesitações do seu traço. A aparente escolha temática condicionaria igualmente a crítica e a historiografia que cedo a reduziram a «pintora de crianças».



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O outro núcleo da obra de Ofélia, revelado pela primeira vez numa exposição realizada na Galeria de Colares, nos anos 80, e comissariada por António Rodrigues, mostra, em desenhos eróticos, nos quais soube manter um registo inquietante, o gosto pela inquirição dos papéis e dos clichés de género representados na intimidade erótica, mesmo quando a bordo de um universo em que as intervenientes são sempre e só mulheres. À margem dos padrões e limites exigidos pelo bom senso e pelo bom gosto, pela moral da época e pelo mercado, Ofélia fez, portanto, uma obra literalmente “marginal”, na qual acabaria por revelar importantes traços da sua capacidade como desenhadora e do seu olhar como artista.


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Essa mesma artista, cuja personalidade permanece desconhecida, descrita por uns como triste e ensimesmada e por outros como jovial e comunicativa (o que parece coincidir, afinal, com uma multiplicidade de registos plásticos, como se Ofélia tivesse necessidade de corresponder ao estereótipo que dela se esperava e guardasse a sua apetência experimental e «transgressora» para exercícios criativos não destinados ao mercado), e cuja obra ainda guarda muitas surpresas, terminaria os seus dias por mão própria.
Morre aos 50 anos de idade.

Cortesia de wikipédia/JDACT