quarta-feira, 27 de abril de 2011

Daniel Innerarity: O Futuro e os seus Inimigos. «Se as utopias modernas pensaram o futuro em termos fundamentalmente de renovação da sociedade, a actual retórica do futuro parece tê-lo restringido ao âmbito das inovações técnicas e da expansão dos mercados»

jdact 

«É neste contexto que se inserem a falta de ambição colectiva das nossas sociedades, a extenuação do desejo, o nosso medo difuso, o retrair-se para os interesses individuais, a carência de perspectivas. Poderíamos dizer que o processo triunfou sobre o projecto, o post sobre o pro, e que o tom dos comportamentos de antecipação é de mais de prevenção e precaução do que de prospectiva e projecto. 
O movimento contemporâneo, a incessante adaptação à mudança que nos é exigida, é vivido segundo uma lógica da sobrevivência, não da esperança. À força de se explicar que as «grandes narrativas» morreram, o lugar delas foi ocupado pela defesa dos «direitos adquiridos», o vazio deixado pela imaginação do futuro foi preenchido pela preocupação do instante; e onde não se prepara o futuro a política limita-se a gerir o presente

Cortesia de armacaodepera
Quem são, então, os inimigos do futuro que têm de ser desmascarados?
Para começar, convém que se saiba que é preciso descobri-los, em primeiro lugar, entre os que poderiam parecer os seus mais ardentes partidários:
  • onde quer que se proceda à sua banalização,
  • entre aqueles que promovem uma aceleração improdutiva,
  • insensível aos custos da modernização.
Os assaltos ao futuro partem das mais diversas trincheiras, e os contragolpes provêm de instâncias insuspeitadas. Onde há verdadeiramente futuro, deveríamos estar perante o desconhecido e o surpreendente, mas não parece ser esse o caso de certa retórica da inovação que utiliza a linguagem da necessidade. Este uso inflacionário da palavra resulta de ela ter sido monopolizada pela sua acepção técnica e mercantil. Tem-se a impressão de que a antevisão do futuro só se realiza actualmente mediante promessas tecnológicas e previsões de crescimento económico.
Se as utopias modernas pensaram o futuro em termos fundamentalmente de renovação da sociedade, a actual retórica do futuro parece tê-lo restringido ao âmbito das inovações técnicas e da expansão dos mercados». In Daniel Innerarity, O Futuro e os seus Inimigos, Teorema 2011, ISBN 978-972-695-960-1. 

Cortesia  de Teorema/JDACT