«(…) Hines de repente não conseguiu esquecer a pergunta. Quantos anos tem, Mitch? A pergunta pegou o assistente de surpresa. Como? A sua idade. Qual é a sua idade? Forrester lançou-lhe um olhar estranho, o seu desdém velado agora misturando-se a uma confusão intrigada. Se eles estivessem sozinhos, poderia ter respondido com uma demonstração explícita do ódio que estava sentindo, mas estava muito consciente da presença de outro homem no escritório de Hines, alguém sentado no canto, em completo silêncio. Alguém que ele não queria que testemunhasse a sua impertinência. Vinte e seis, respondeu por fim. Vinte e seis, repetiu Hines, soltando um suspiro em reacção àquele número tão baixo. Teria sido ele tão petulante naquela idade? Tinha muito mais que o dobro disso, e sempre fora um sujeito cheio de ambição, mas acreditava que nunca tinha sido tão impetuoso quanto aquele rapaz diante dele. Não sei qual é a relevan… Relevância nenhuma, nenhuma, Hines o interrompeu, indicando com um gesto que deviam mudar de assunto. Ele parou por um instante. Alguma coisa mais? Nada ainda, respondeu Forrester secamente. Assim que recebermos alguma notícia, eu lhe comunico, senhor. Ele deixou que a pausa antes da sua última palavra acentuasse a sua insatisfação pelo modo como fora tratado. Ainda assim, com todo o egocentrismo da juventude, continuou ali parado, esperando algum reconhecimento. Hines, entretanto, simplesmente desviou os olhos dele na direcção das imagens da televisão. Percebendo finalmente que não conseguiria mais nada, o assistente se virou e saiu da sala.
Hines esperou uns bons 30
segundos em silêncio antes de virar a cabeça na direcção do homem sentado no
outro canto de seu escritório. Embora estivesse acostumado há muito tempo com o
serviço que esses homens faziam para a organização, ainda sentia uma ponta de
nervosismo quando estava realmente sozinho com um deles. Seu papel na
organização sempre fora diplomático, profissional. Nunca tinha feito o serviço
sujo. Aquela era uma dimensão vil, mas essencial, da causa deles. Embora muitos
no mundo o considerassem um indivíduo de grande influência, Jefferson Hines
sabia que o homem sentado a poucos passos da sua mesa representava um poder
muito maior que qualquer poder que ele jamais teria.
Acha que as coisas estão ligadas?,
perguntou ele finalmente, apontando para o arquivo na sua mesa e depois para o
televisor mudo. Ligadas à missão? Claro! Os dois homens não falavam do plano em
nenhum outro termo a não ser a missão. Naquela cidade, e no seu
escritório, era quase certo que as paredes tivessem ouvidos. Mas não deixe que
isso o desestabilize. Vamos manter o curso das acções. Hines não estava
satisfeito. Isso nunca foi discutido. Marlake, Gifford…, o resto; esse era o
plano. Que diabos se está passando na Inglaterra? O outro homem se endireitou
na cadeira enquanto Hines falava. Ele lhe lançou um olhar que nã deixava
dúvidas sobre seu significado: cale a boca. Nomes nunca deveriam ser
mencionados. Hines percebeu o olhar e a sua mensagem, batendo os dedos na mesa,
meio irritado, meio ansioso. Diga-me que esperávamos reacções como essa, disse
ele. Diga-me que nada disso é surpresa. Se o outro homem hesitou antes de
responder, não havia demonstrado. Tinha o ar de um homem que desejava exalar
confiança, e queria que o seu interlocutor permanecesse forte e imperturbável. Nossos
planos estão seguros. Vamos então cuidar do nosso lado do negócio, e vocês
cuidam do seu. Assim, todos ganhamos.
Fez uma pausa para que suas
palavras permanecessem no ambiente pesado entre os dois. Não perca o seu alvo
de vista. Apesar do medo instintivo que sentia daquele homem, Hines se sentiu
mais tranquilo com aquela aparente certeza. Soltando um longo suspiro, recobrou
a sua postura. Homens de estado deviam ser fortes, e ele estaria à altura da
sua tarefa. Bom. Então suponho que devo falar-lhe amanhã? O outro homem fez que
sim com a cabeça, levantando-se da sua poltrona. Isso mesmo, sr.
vice-presidente». In AM Dean, A Biblioteca Perdida, 2012, Editora Prumo, 2012, ISBN
978-857-927-298-1.
Cortesia de EPrumo/JDACT
JDACT, AM Dean, Literatura, Mistério,