«(…) Antes que sua bengala pudesse atingir o agressor, Woodbury agarrou um dos seus braços, seu secretário da Marinha, o outro. Um homem uniformizado pulou sobre o atacante, assim como vários outros membros do governo. Um deles era Davy Crockett, do Tennessee. Soltem meus braços, berrou Jackson. Deixem-me, vou pegá-lo. Eu sei de onde ele vem. Mas os dois homens não o soltaram. As mãos do assassino se agitavam por sobre um mar de cabeças e então ele foi finalmente derrubado no chão. Soltem-me, insistiu Jackson. Posso defender-me sozinho. Apareceram alguns policiais e o homem foi posto de pé. Crockett o entregou a eles e exclamou: Eu queria ver o vilão mais safado deste mundo. Agora já o vi. O atirador balbuciou algo, dizendo que era o rei da Inglaterra e que teria mais dinheiro quando Jackson estivesse morto. Temos que sair daqui, sussurrou Woodbury. Esse homem é obviamente um louco. Ele não aceitou a desculpa. Não há nada de louco. Houve uma conspiração, e aquele homem é apenas um instrumento dela. Vamos, senhor, disse o secretário do Tesouro, conduzindo o presidente pela manhã nebulosa à carruagem que o aguardava. Jackson obedeceu. Mas sua mente se debatia. Ele concordava com o que Richard Wilde, um congressista da Georgia, certa vez lhe dissera. O rumor, com suas mil línguas, produz pelo menos a mesma quantidade de histórias. Assim ele esperava. Acabara de encarar aquele assassino sem um pingo de medo. Nem dois revólveres conseguiram atemorizá-lo. Todos os presentes constataram sua coragem. E, graças a Deus, a Providência o protegera. Ele parecia verdadeiramente destinado a erigir a glória do país e preservar a causa do povo.
Entrou na carruagem. Woodbury
veio em seguida, e os cavalos avançaram sob a chuva. Não sentia mais o frio, a
velhice ou o cansaço. A energia brotava em todo o seu corpo. Como na última
vez. Há dois anos. Durante uma excursão num barco a vapor até Fredericksburg.
Um ex-oficial da Marinha desequilibrado, que ele dispensara do serviço, ferira
seu rosto, registando o primeiro atentado físico a um presidente americano. Depois,
ele desistiu de instaurar um processo e vetou o conselho dos seus auxiliares
para que fosse continuamente protegido por um guarda-costas. A imprensa já o
havia rotulado de rei, a sua Casa Branca era uma corte. Não iria dar mais pano
para críticas. Dessa vez, alguém tinha de facto tentado matá-lo. Outro facto inédito
para um presidente americano. Assassinato. Aquele fora um acto, pensou ele, que
condizia mais com a Europa e com a Roma Antiga. Em geral, empregado contra déspotas,
monarcas e aristocratas, não contra líderes eleitos popularmente. Ele encarou
Woodbury. Eu sei quem tramou isso. Eles não têm coragem de me enfrentar. Em vez
disso, mandam um louco para fazer o que querem. A quem se está referindo? Traidores.
Foi a sua única resposta. E ainda haveria gravíssimas consequências.
Cidade de Nova York
Um só engano não bastara para
Cotton Malone. Ele cometeu dois. O erro número um foi marcar o encontro no 15º
andar do hotel Grand Hyatt. O pedido viera da sua antiga chefe Stephanie Nelle,
por meio de uma mensagem eletrónica que chegara dois dias antes. Ela precisava
vê-lo em Nova York no sábado. Aparentemente, o assunto só deveria ser discutido
quando se encontrassem. E, aparentemente, era algo importante. Ainda assim, ele
tentou telefonar para ela, ligando para o quartel-general do Magellan Billet,
em Atlanta, mas foi informado pela sua assistente que Faz seis dias que ela está
fora, em regime de NEC. Ele sentiu que era melhor não perguntar onde. NEC. Não
Entrar em Contacto. Isso significava: não me ligue, eu ligarei. Ele próprio já
estivera nessas missões externas, o agente no campo devia decidir o momento
mais propício para entrar em contacto. Aquela situação, contudo, era um tanto
incomum para a directora do Magellan Billet.
Stephanie era responsável pelos
12 agentes secretos do departamento. Sua função era supervisionar. Se ela
estava envolvida numa missão NEC, era porque se tratava de algo extraordinário
que atraíra sua atenção. Ele e Cassiopeia Vitt tinham resolvido transformar
aquela viagem num fim de semana em Nova York, com jantar e um espectáculo, tão
logo descobrissem o que Stephanie queria. Haviam tomado um avião em Copenhague
na véspera e se hospedaram no St. Regis, alguns quarteirões ao norte de onde
ele se encontrava agora. Cassiopeia escolhera as acomodações, e, como ela também
estava pagando por elas, não reclamou. Além disso, era difícil argumentar com
aquele ambiente régio, vistas de tirar o fôlego e uma suíte maior do que o seu
apartamento na Dinamarca. Ele respondera ao e-mail de Stephanie, dizendo-lhe
onde ficaria hospedado. Naquele dia, após o café da manhã, havia um cartão de
acesso do Grand Hyatt esperando na recepção do St. Regis, assim como um recado e
um número de quarto.
Favor me
encontrar hoje pontualmente às 18h5
Ele reflectiu sobre a palavra
pontualmente, mas se deu conta de que a sua ex-chefe sofria de um caso incurável
de comportamento obsessivo, que a tornava ao mesmo tempo uma boa administradora
e uma pessoa exasperante. Mas ele também sabia que ela não teria entrado em
contacto se não fosse algo verdadeiramente importante. Ele inseriu o cartão de
acesso, percebendo e ignorando o não perturbe pendurado na porta. A luz
vermelha na tranca eletrónica da porta ficou verde e o trinco se abriu». In Steve
Berry, O Enigma de Jefferson, 2011, Editora Record, 2012, ISBN
978-850-140-205-9.
Cortesia de ERecord/JDACT
JDACT, Século XIX, USA, Literatura, Steve Berry,