Saulo
«(…) Piratas! O veleiro de vigia girou da sua posição na proa de nosso barco para encarar o capitão. Piratas!, gritou novamente. Poderemos negociar com eles?, quis saber o capitão Cosimo. Sob que bandeira velejam? Nenhuma. Veio a resposta. É por isso que sei que são salteadores. E, a julgar por seu tamanho, o barco tem mais canhões e homens do que nós. Parei com minha concha a meio caminho do barril de água e olhei para onde o vigia apontava. A vela de uma galé maior agora era visível na direcção sul. O capitão praguejou e deu um soco na mesa à frente, fazendo com que sua moringa de água caísse e saísse rolando pelo convés inferior. Saltei adiante, apanhei-a e a enchi novamente com a água do barril. Olhei de relance para Panipat e o mestre dos remadores fez um gesto com a cabeça para eu devolvê-la ao capitão. Uma conversa correu entre os homens. Eles nos viram? Mudaram de direção? Porque se incomodariam? Não veem que somos um barco mercante?
Agora podíamos ver o outro barco
mais claramente, uma embarcação baixa e comprida com bancos duplos de
remadores. Também vimos que estavam alterando seu curso para nos interceptar. Talvez
pensem que transportamos ouro, em vez de óleo de amêndoas e peixe salgado. Devem
estar atrás de bons remadores para vender como escravos, ouvi Lomas dizer.
Falou para Panipat numa voz ainda mais alta. Tire-nos do caminho dele, mestre
dos remadores! Quero ver meu filho novamente, e não ser levado como escravo ou
morrer numa luta que não podemos vencer! O resto dos remadores homens livres se
uniram a ele com gritos de concordância: Vamos, Panipat! Use o chicote, se
precisar! Estabeleça um ritmo que nos faça remar para longe daqui! Os piratas
estavam baixando a vela para se preparar para a perseguição usando seu poder
superior de remada.
O capitão Cosimo mordeu o lábio.
Estudou o mapa diante de si. Segui seu olhar e vi um disco de madeira colocado
à esquerda de uma grande ilha com a letra M entalhada nele. Seria Maiorca? Ele
ergueu novamente a vista. Qual a potência deles? Três, gritou o vigia. Um
canhão completo e duas colubrinas, com talvez outra peça de artilharia na popa.
Superados em homens e em armas, murmurou o capitão. Como se para confirmar a sua
observação, ouviu-se um rugido surdo quando o inimigo disparou um tiro de
advertência para que parássemos o barco. A bala pousou bem perto, mas provocou
uma gritaria nos tripulantes. Começaram a praguejar contra o capitão pela sua
incompetência por estabelecer um curso que nos levara directo ao predador.
Culparam o vigia, como se, por ter avistado a galé pirata, ele fosse o
responsável por ter conjurado o inimigo do ar. E, após descarregar a ira
inicial, alguns, de medo, passaram a rezar, implorando a Deus e a outros
poderes sobrenaturais, até mesmo aos espíritos do mar, que viessem em seu
socorro.
O capitão examinou o mapa,
alvoroçado. Precisamos de uma ilha..., algum lugar, qualquer lugar onde
possamos encalhar. Levou a lupa ao olho e baixou o rosto para bem perto do
mapa. Ali, falei, e apontei para o desenho de uma minúscula ilha a oeste do
disco de madeira que eu acreditava representar nosso barco. Bem localizado,
rapaz, murmurou ele. Encontramos uma ilha!, disse um pouco mais alto. Então
berrou uma instrução para Panipat. A tripulação já havia atravessado águas
perigosas antes. Nossa vela já tinha sido recolhida, os homens se encontravam
em posição e Panipat estava alerta, esperando a ordem do capitão. O mestre dos
remadores rugiu suas instruções, e o nosso barco fez a volta. Os remadores se
empenharam e disparamos através do mar. Os homens gargalharam quando,
imediatamente, o espaço entre os dois barcos aumentou. A ilha, porém, estava
mais distante do que parecia no mapa e, quando olhei para trás, a embarcação
pirata vinha numa furiosa perseguição. A visão daquele barco viajando em tal
velocidade atrás de nós, os remos flamejando para a frente e para trás, me
fascinou. Não conseguia desviar os olhos. Não havia tempo de dar água aos homens,
e, de qualquer modo, eu tinha bastante dificuldade em manter o equilíbrio, pois
nosso barco nunca tinha viajado a tal velocidade. Enquanto observava, podia perceber
que a embarcação pirata se aproximava. Os remadores não podiam se permitir
perder a concentração. O bem-estar de todos a bordo dependia agora de sua
habilidade e do seu esforço». In Theresa Breslin, Prisioneira da
Inquisição, 2010, Editora Galera Record, 2014, ISBN 978-850-113-940-0.
Cortesia de EGaleraR/JDACT
JDACT, Theresa Breslin, Literatura, Século XV, Religião,