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O Bastardo do rei Bravo
«(…) Andou
algum tempo fugido. Mas, regressado à corte, percebeu que o prometido casamento
com dona Beatriz nunca se realizaria. E, por isso, dom João de Castro decidiu
acolher-se à protecção do rei de Castela, ao serviço do qual travará a terceira
guerra fernandina (1381-1382), cercando Trancoso, tentando atacar Lisboa por
mar, sitiando Elvas e Almeida. Em Castela também casará, entre 1379 e 1380, com
dona Constança, senhora de Alba de Tormes, filha ilegítima do rei Henrique II.
E em Castela encontrará seus irmãos, dom Dinis e dona Beatriz. Esta tinha-se casado,
em Março de 1373, com dom Sancho, conde de Albuquerque e Haro, filho bastardo
do rei Afonso XI de Castela, que o teve de Leonor de Guzman.
Dom Dinis, por seu
turno, residia em Castela desde que se recusara a beijar a mão de dona Leonor
Teles, mostrando assim a displicência e dissabor que lhe causava o
casamento do rei Formoso. Este estivera para o matar, o que o obrigou a andar
escondido e, depois, a refugiar-se no reino vizinho, onde, muitos anos mais
tarde, o rei Henrique II lhe dará por mulher uma outra das suas filhas
bastardas, dona Joana, havida de Joana, senhora de Cifuentes.
A devoção de dom João de Castro
ao rei de Castela e os serviços que lhe prestou não evitaram que, após a morte
de dom Fernando, em 1383, o monarca, casado com a herdeira do rei Formoso, o
mandasse prender no castelo de Almonacid. Nada que deva surpreender ou
indignar: o filho de Inês de Castro era, para muitos portugueses, o legítimo
herdeiro da coroa que o rei de Castela sustentava pertencer, pelas leis e pelos
tratados, à rainha D. Beatriz, sua mulher. Entre os portugueses que desejavam
ver coroado o infante dom João de Castro, contava-se então o Mestre de Avis,
cujas relações com a rainha Aleivosa e seu amante, o conde de Ourém,
João Fernandes Andeiro, estavam longe de ser pacíficas. Ainda em vida do rei
dom Fernando, seu meio-irmão, o filho de Teresa Lourenço fora maltratado, sendo
acusado de correspondência com o rei de Castela. Preso no castelo de Évora, o
Mestre de Avis encomendou-se a Cristo e fez promessa de ir ao Santo Sepulcro,
em Jerusalém, se saísse vivo da sua prisão. Acabou por ser libertado por dona
Leonor Teles, a cujos pés se ajoelhou, pedindo para ser esclarecido sobre os
motivos da sua detenção. Não obtendo nenhum esclarecimento da rainha, foi ao
Vimeiro, onde estava dom Fernando, doente, para pedir ao meio-irmão que lhe
explicasse porque fora preso. Também não ficou esclarecido. E começou a
ponderar refugiar-se em Castela, como sucedera com seus irmãos, filhos de Inês
de Castro. Acabou por permanecer no reino.
Em Maio de 1383, acompanhou a
infanta dona Beatriz, sua sobrinha, a Badajoz, onde a princesa uniu os seus
destinos aos do rei de Castela. Em Outubro, perdeu seu irmão mais velho e viu
dona Leonor proclamar-se, pela graça de Deus, Rainha, Governadora e Regedora
dos Reinos de Portugal e do Algarve, enquanto o rei de Castela reclamava a
aclamação de sua mulher como rainha de Portugal. O povo de Lisboa revoltou-se.
E, a 6 de Dezembro, o Mestre de Avis foi ao paço matar o conde Andeiro,
assumindo a chefia da revolta popular. Proclamado Defensor e Regedor do Reino,
tratou com dom Nuno Álvares Pereira de fazer frente ao invasor, que conseguiu
derrotar. A peste que grassou nos arraiais castelhanos e chegou a tocar dona
Beatriz deu uma preciosa ajuda ao levantar do cerco castelhano. E, quando o rei
de Castela partiu, o Mestre de Avis foi venerado como o Messias de Lisboa. Não
tardaria a ser aclamado rei de Portugal». In Isabel
Lencastre, Os Bastardos Reais, Os Filhos Ilegítimos, Oficina do Livro, 2012, ISBN
978-989-555-845-2.
Cortesia de OdoLivro/JDACT
JDACT, História de Portugal, Isabel Lencastre, O Paço Real, Conhecimento,