quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Os selos 2008 dos CTT: Os Transportes Urbanos entre 2 Guerras. «Os veículos democráticos, os choras e bocetas quadradas, quando saíam dos rails alheios, pareciam entornar sobre a calçada os passageiros empilhados»

Cortesia de CTT

Os Transportes Urbanos entre 2 Guerras
«Sábado, 14 de Abril de 1900, inaugura-se em Paris a Exposição Universal. Ocupava uma vasta área entre Champ-de-Mars, Invalides, Trocadero e os Champs-Elysées. Em Julho, o Presidente Loubet inaugurou a primeira linha do metro, com 10 km, entre Porte de Vincennes e Porte Maillot. Metro que nas suas entradas apresentará esse sortilégio em ferro, de linhas onduladas, dita Arte Nova. Tudo era sonho neste século, que se iniciava sob o signo das ilusões. (1)

Em 1900, em Lisboa era «o tempo das montras e das ruas iluminadas a bico Auer e dos caixeiros escravos que largavam as lojas às onze da noite, para voltarem a abri-las, estremunhados, às oito da manhã. Quem tinha pressa, alugava uma tipóia ou subia a pé a Avenida, ultrapassando os americanos, puxados a mulas. Os veículos democráticos (os choras e bocetas quadradas), quando saíam dos rails alheios, pareciam entornar sobre a calçada os passageiros empilhados». (2)

Cortesia dos CTT
Lisboa cresceu até meados do século XIX ao longo do Tejo, transformando-se numa estrutura radial e concêntrica a partir de finais do século, com a especialização do «centro» na Baixa. Até meados do século XX o sistema viário articulava-se, apoiado no eléctrico, na transversal que funcionou na antiga estrada de circunvalação (Morais Soares, Maria Pia) e nas radiais do Lumiar, Benfica, Poço do Bispo e Algés-Dafundo. Ao crescimento por eixos do tecido urbano (Avenida da Liberdade e Avenidas Novas), sucedeu-se o crescimento por zonas. O eléctrico afirma-se até finais dos anos 40 como o principal meio de transporte da cidade, com uma rede de 145 km.
Nos primeiros anos do séc. XX diversas empresas asseguravam o tráfego fluvial de Lisboa com a «Outra Banda». A Parceria dos Vapores Lisbonenses, sedeada no «chalet» do Cais do Sodré, tinha duas carreiras diárias para Aldeia Galega (Montijo), onde se pagava 160 réis à ré e 120 réis à proa. Na «linha» de Cacilhas, durante a semana, os preços variavam de 60 réis à ré a 40 réis à proa, saindo os barcos com um intervalo de 40 minutos. (3)

Cortesia dos CTT
O movimento entre as duas margens, em 1948, atingia 10.486.722 passageiros. Lisboa crescia, mais na margem norte, do que na margem sul, enquanto esperava pela ponte.
A abertura à exploração pública do Ramal de Cascais (1889) foi acompanhada de maus resultados de exploração, agravados em 1901, com a concorrência da tracção eléctrica da Carris. Ao caírem para um terço do custo da tarifa ferroviária, os bilhetes dos eléctricos tornaram-se altamente concorrenciais, em especial, no percurso até Algés com a sua praia, praça de touros e diversões. Perante os frágeis resultados da exploração, a solução passou pela alteração da tracção a vapor para a tracção eléctrica (1926).

Em Coimbra, o aparecimento da tracção eléctrica nos transportes urbanos desencadeou um processo de expansão de bairros residenciais: Olivais, Calhabé, Matadouro e Cruz de Celas. A partir dos anos 40, com o Plano de Gröer, preconizou-se uma intervenção a nível das acessibilidades. As alterações previstas eram múltiplas, com demolições na «alta», a conversão do caminho de ferro de Coimbra a Arganil, de modo a retirá-lo do centro da cidade, e o seu «canal» a ser ocupado por uma «auto-estrada», bem como, a ripagem da linha do Norte para uma nova estação (Cozelhas) e a substituição gradual do eléctrico pelo trólei.

Cortesia dos CTT

Entre 1900 e 1940, o Porto passou de 168 mil habitantes para 258 mil. Ao longo da 1ª metade do séc. XX sucederam-se os planos de ordenamento: desde o Plano Municipal de 1914, ao Plano Regulador do Prof. Almeida Garrett (1951). Definia-se o centro, na antiga Praça da Liberdade, como ponto de partida do início dos transportes públicos. Os eléctricos, «os carros do povo», da Companhia Carris de Ferro do Porto asseguraram a mobilidade da cidade até meados do século. Com o final da guerra, e o retorno do tráfego rodoviário, os estrangulamentos do trânsito, agravado com o estacionamento, levaram a encarar a substituição do eléctrico pelo troleicarro ou pelo autocarro.
Os autocarros em Lisboa surgem associados à Exposição do Mundo Português, mas, pela conjuntura da Guerra, a sua exploração só se iniciou a partir de 1944, entrando ao serviço dos novos bairros de Alvalade, Encarnação e Aeroporto. Flexíveis e ágeis, sem necessidade de grandes investimentos a nível da infra-estrutura, irão representar para as cidades portuguesas um elemento determinante de crescimento e expansão.

Cortesia dos CTT


Em 1949 registava-se a existência de 96.837 veículos ligeiros e pesados. Desde 1901, um longo caminho fora percorrido no sector automóvel. A organização das empresas no GITA (4) levou à alteração das condições do mercado e à repartição do tráfego, definidos na Lei 2008. No Estado keynesiano de então, Lisboa, Porto, Braga e Coimbra evoluíam naturalmente para a municipalização dos seus transportes urbanos». In Gilberto Gomes, CTT.
Notas:
1 - Paris 1900. António Guerreiro. Expo 98; 2 - Raul Proença por Câmara Reis. Biblioteca Nacional. 1985; 3 - Guia do Viajante. Lisboa 1907; 4 – GITA – Grémio dos Industriais de Transportes em Automóveis; 5 – Lei 2008 – Coordenação dos Transportes Terrestres.

Cortesia dos CTT/Gilberto Gomes/JDACT