domingo, 5 de junho de 2011

Bocage. O maior poeta do século XVIII português. «... alcançou ser estrela de primeira grandeza, ao lado dum Gregório de Matos, graças ao temperamento agressivo, impulsivo, cortante, amparado no dom da improvisação feliz e certeira. Contudo, a sátira ocupa lugar menos relevante na sua obra, seja porque de cunho pessoal e bilioso, seja porque dura tanto quanto o acontecimento que lhe dá causa e sentido

(1765-1805)
Setúbal
Cortesia de macroscopio 

«O maior poeta do século XVIII português foi Manuel Maria de Barbosa du Bocage, emulo de Camões na vida e na obra. Cedo, apaixona-se por Gertrudes (que aparece como Gertrúria em sua poesia), mas resolve alistar-se na Marinha de Guerra, em 1783, três anos depois, embarca na nau «Senhora da Vida», em viagem para Goa. Faz escala no Rio, onde se regala em festins e amores tropicais. Chegado à Índia, o tempo começa a correr-lhe bem: é promovido a tenente e mandado a Damão, mas deserta, levado por de baixos amores. Em 1789, segue para Macau e, no ano seguinte, para Lisboa. Ao chegar, sabe com tristeza que Gertrudes se casara com seu irmão. Desgostoso, entrega-se a uma vida desregrada e boémia, ao mesmo tempo que frequenta a Nova Arcádia. Em 1797, é preso e condenado a receber doutrina dos oractorianos. Livre, passa a viver de traduções e tarefas similares mas novas desgraças o espreitam, como a doença, paixões infelizes, tormentos da sensibilidade; recolhe-se ao leito, à espera do fim, que chega no solstício de Inverno de 1805.

Cortesia de atuleirus 

Morre na miséria e arrependido. Seu pseudónimo arcádico era Elmano Sadino, formado com as letras do seu prenome e do rio Sado, que banha Setúbal.
Em vida, Bocage publicou Idílios Marítimos recitados na Academia das Belas-Artes de Lisboa (1791) e as Rimas (3 vols., 1791, 1799, 1804). Postumamente, com o título de Obras Poéticas, saíram mais dois volumes (1812 e 1813), e de Verdadeiras Inéditas Obras Poéticas, um volume (1814). Em 1853, Inocêncio Francisco da Silva publicou-lhe as Poesias, em seis volumes, considerada a melhor edição do espólio poético bocageano.
Existem dois Bocages:
  • o que o vulgo fixou através de anedotas, verdadeiras algumas e falsas outras, mas todas raiando na obscenidade grosseira,
  • o que a tradição literária nos legou.
Este é que importa, pois o primeiro segue trajectória secundária a qualquer configuração, visto o povo atribuir-lhe todos os ditos picantes que, não tendo paternidade conhecida, devem forçosamente pertencer a alguém. Desse ângulo, seu nome tornou-se mítico ou ao menos proverbial, decerto representando um tipo chocarreiro universal.

Cortesia de anaicfer 

O segundo Bocage escreveu uma vasta obra poética fraccionada em dois sectores fundamentais:
  • o satírico,
  • o lírico.
Quanto ao primeiro, Bocage alcançou ser estrela de primeira grandeza, ao lado dum Gregório de Matos, graças ao temperamento agressivo, impulsivo, cortante, amparado no dom da improvisação feliz e certeira. Contudo, a sátira ocupa lugar menos relevante na sua obra, seja porque de cunho pessoal e bilioso, seja porque dura tanto quanto o acontecimento que lhe dá causa e sentido. Exemplo característico do seu poderio satírico é a «Pena de Talião», em resposta a José Agostinho de Macedo.
Todavia, é na poesia lírica que o talento bocageano se realizou de modo particular. Cultivou a lírica elegíaca, a bucólica e a amorosa, exprimindo-as em idílios, odes, epigramas, cantatas, elegias, canções, epístolas, cançonetas, sonetos, etc. nos poemas longos, salvo contadas excepções, Bocage não se realiza plenamente: talvez porque, neles, fosse compelido a enquadrar-se dentro do convencionalismo neoclássico, ou porque exigissem um fôlego muito mais amplo do que lhe era permitido pela baixa rotação de seu mundo interior. De qualquer forma, tais composições inibiram, em vez de estimularem, o voo poético a Bocage: as normas arcádicas enrijeciam-lhe demasiadamente o verso e coarctavam-lhe a inspiração». In Massaud Moisés.

Cortesia de Editora Cultrix/JDACT