Plano e perspectiva da cidade de Goa
Évora, colecção Manizola
Cortesia de foriente
Edição e Introdução de Carmen Radulet
«Num dos numerosos memoriais que escreve durante a sua existência aventurosa, o bispo António José de Noronha apresenta da seguinte maneira esta fase movimentada da sua vida:
- ‘Foi o exponente conduzido a Inglaterra debaixo de ama dura e rigorosa prisão e maltratado. No porto de Pormud [Portsmouth] recebeu Mr. Preston, capitão da dita fragata Dilcastil ordem para entrar no Rio de Chatão [Chatham], onde tendo escrito várias cartas ao Conselho do Almirantado não teve resposta alguma respectiva ao Exponente e, como foi obrigado à entrega da fragata à mestrança, tornou o expediente de entregar o ‘Exponente’ ao capitão da Guarda Costa da América que se achava ancorada naquele Porto. Este o levou a bordo da sua nau com todo o resguardo em companhia de muitos forçados que levava para as suas ilhas daquela costa. Cinquenta e seis dias esteve o ‘Exponente’ sem esperança de soltura até que por via da família de Mr. André, capitão-tenente da mesma nau, que então se achava a bordo dela, teve ocasião de escrever ao Ministro de Portugal na Corte de Londres e no dia que a nau se aparelhou para a América chegou ao comandante uma ordem do Ministro (que parece ser então o Duque de Bedford) para que sem demora pusesse logo o ‘Exponente’ na sua liberdade, com a qual partiu para Londres onde foi recebido de António Freire de Andrade Encerrabodes, Ministro de Portugal, com todo o agrado’.
A posição da Inglaterra e da Companhia inglesa torna-se neste ponto bastante delicada já que se mostra necessário enfrentar ao mesmo tempo uma complicada questão diplomática (as relações com Portugal no que dizia respeito ao domínio de São Tomé de Meliapor) e um caso particular, o da prisão de António José de Noronha, súbdito português. Frente a uma oferta de indemnização de «cem mil libras de França» o antigo Governador de São Tomé mostra a sua determinação em não aceitar uma proposta considerada como indigna e injuriosa.
Provável retrato de D. António
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O ambíguo comportamento observado pela Corte de Londres a este respeito é bem notório no seguinte comentário de Silva Correia:
- «A oferta cavilosa e imoral de cem mil libras, que no meado do século XVIII representava uma avultada fortuna, não foi feita ao Governo português para silenciar as suas reclamações diplomáticas, porque se o tivesse sido a título de uma indemnização por motivo da usurpação à força armada de S. Tomé e das aldeias circunvizinhas, esse oferecimento monetário seria feito à Corte portuguesa directamente, por intermédio do seu embaixador em Londres, que era, ao tempo, António Freire de Andrade Encerrabodes».
António José de Noronha, rejeitando esta aliciante tentativa de compensação, deixa Londres para se transferir para Paris. Na Corte de Luís XV, graças sobretudo aos informes do marquês Dupleix, António José encontra um ambiente favorável, pronto a manifestar abertamente o reconhecimento pela actividade por ele desenvolvida na Índia em favor da causa francesa. Nestas circunstâncias, o rei Luís XV não só galardoa o ‘Père Antoine’, com a ordem de «Notre Dame du Mont Carmel et St. Lazare», mas, também solicita à Santa Sé a sua eleição para Bispo “in partibus infidelium”. O pedido do monarca francês abre, porém, uma complexa questão com a Coroa portuguesa no que diz respeito à ideia, então já bastante controversa, da exclusividade do Padroado Régio.
Plano e perspectiva das ilhas e províncias de Goa
Biblioteca Nacional
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Através de consultas entre a Santa Sé, a Corte de Paris e a de Lisboa, foram resolvidos os problemas relativos ao pagamento da côngrua, de que se encarregava a Companhia francesa das Índias Orientais. Paralelamente, o Ministro de Portugal ao manifestar publicamente o beneplácito do seu país para a eleição do novo bispo, eliminava os últimos receios da Santa Sé. O Breve de 23 de Março de 1751 confirmou a eleição do Bispo de Halicarnasso indicando, porém, uma limitação no que dizia respeito ao exercício da jurisdição:
- ‘non abbia egli a esercitare giurisdizione espiscopale se non col consenso e permissione del Vescovo ordinario di S. Tomé’.
Esta restrição e o facto de o embaixador português em Paris, Gonçalo Manuel Galvão de Lacerda, pedir a António José de Noronha que se deslocasse a Lisboa a fim de apresentar o seu caso, podem estar, muito provavelmente, relacionadas com as pressões de alguns dos numerosos inimigos eclesiásticos, não contentes de ver regressar à Índia o ex-frei António da Purificação distinguido com o título de Bispo». In António José de Noronha, Sistema Marcial Asiático, edição de Carmen Radulet, Fundação Oriente, 1994, ISBN 972-9440-34-4.
Cortesia de F. Oriente/JDACT