sexta-feira, 13 de novembro de 2020

Nada é por Acaso. Zibia Gasparetto. «Ele costuma ir a esse clube. Não estou interessada. Ele é um pedaço! Se fosse comigo, não ia perder a vez…»

Cortesia de wikipedia e jdact

«(…) Vendo-a assoberbada de trabalho, Bete meneava a cabeça contrariada: estão abusando de si. Além de ficar lá até tarde todos os dias, ainda traz trabalho para o fim de semana? Não acha que é demais? Preciso adquirir experiência. A vantagem é minha. Enquanto isso eles lhe pagam pouco e ganham dinheiro à sua custa. Não seja mercenária! Eu gosto de trabalhar. Faço isso por mim, não por eles. Um dia ainda terei tudo quanto desejo. Se não acabar antes. Hoje tem um baile no clube em que o Carlos é sócio. Ele nos convidou. Vamos? Vá. Prefiro ficar aqui. Você não tem jeito mesmo. O Marcelo está louco por você. Ele costuma ir a esse clube. Não estou interessada. Ele é um pedaço! Se fosse comigo, não ia perder a vez. Fique com ele. Não a entendo. Não namora, não sai, só trabalha. Desse jeito vai ficar para tia.

Pouco me importa. Casamento não está nos meus planos. Que horror! Não diga isso nem brincando. Eu, quando aparecer alguém de quem eu goste, caso mesmo. Não vejo a hora de ter família, de ser feliz. Pois eu não. Casamento não dá futuro. Eu quero mais é cuidar da minha vida. Marina chegou ao banco e olhou desanimada para a imensa fila do caixa. Foi falar com o gerente. Sorriu, conversou, contou uma história que inventou na hora e conseguiu que ele a atendesse rapidamente. Estava habituada a essas gentilezas. Sabia que era bonita, elegante e bem-feita. Seus cabelos castanho-dourados, seus olhos verdes e profundos, sua pele morena e delicada, seus dentes alvos e bem distribuídos, as duas covinhas que se formavam quando sorria e principalmente seu irresistível magnetismo garantiam-lhe bom atendimento onde aparecesse.

Fez o outro banco e foi ao escritório do dr. Moura. Ele não estava e ela não queria entregar aquele documento à secretária. Era um contrato muito importante. Fora por insistência dela que o dr. Olavo começara a atender casos na área empresarial. Marina pensava que os grandes negócios aconteciam a todo o momento nas empresas. Participar deles era obter mais lucro em menos tempo. Espólios, heranças e problemas familiares, além de serem causas muito demoradas e trabalhosas, eram menos rentáveis. A princípio Olavo não se interessara muito, mas depois acabou aceitando algumas causas nessa área. Sentada no sofá macio na penumbra da tarde que ia se findando, Marina sentiu o prazer de usufruir daqueles momentos de descanso. Olhava satisfeita para os magníficos quadros nas paredes, para o vaso de cristal cheio de flores frescas, perfumadas e arrumadas artisticamente, para os móveis finos, de bom gosto, e podia sentir a maciez do tapete sob seus pés. O dr. Moura vai demorar. Tem certeza de que é só com ele? A secretária estava em pé na sua frente. Tenho. Foi um pedido do dr. Olavo. Ele vai vir? Vai. Mas não tem hora. Se ele vem, vou esperar. Aceita um café ou um refrigerante? Um café, obrigada. Marina tomou o café e colocou a xícara de porcelana revestida de prata na bandeja sobre a mesinha. Dispondo algumas revistas ao alcance dela, a secretária disse: fique à vontade, e retirou-se para a outra sala». In Zibia Gasparetto, Nada é por Acaso, 2005, Edição 11, Editor Nascente, 2012, ISBN 978-989-668-172-2.

Cortesia E11/ENascente/JDACT

 Zibia Gasparetto, Literatura, JDACT,