quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Francisco Bugalho: «O Pintor da Natureza». Poesia. Parte VI

Cortesia de naturlink

Poente Grotesco
Doirada angústia a deste sol-poente:
- Príncipe requintado e dissolvente,
Matando-se num lago de perfumes,
Entre púrpuras e o ocaso de mil lumes,
Funambulescamente...

Poente teatral, retórico, fantástico,
Todo delírios de meridional,
Lírico e lúbrico, exagerado e plástico...
- De bilhete postal!...

- Sê mais discreto, poente!
Daqui a meia hora,
Talvez consigas emocionar!,
Não gesticules tanto e deixa, agora,
A água ir soluçando, devagar,
Sua leve canção de ave canora!...
Francisco Bugalho

Cortesia de fontedavila
Rega
Longa, lenta, melancólica,
Cantou a velha canção,
A nora triste da horta.
E uns brandos ares de bucólica
- Oh, lírica solidão! -
Bateram à minha porta.

Terra sedenta que espera,
Ansiosa todo o dia,
Estes momentos da tarde,
Agora se desaltera.
- Que, a esta hora tardia,
O beijo do sol não arde.

Toda se dá em perfumes
Que lembram, a quem os sente,
Vagos, sensuais desatinos.
Andam no ar vaga-lumes.
E a terra, molhada e ardente,
Tem desejos femininos...

Depois, a nora calou-se.
Ficaram-se murmurando,
Nos regos, já invisíveis,
- Murmúrio leve e tão doce!... -
Aguas que vão retratando
Finas estrelas insensíveis.
Francisco Bugalho

Cortesia de oqueseveporai

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