quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Crónicas de Fernão Lopes. O critério histórico: «Competia ao primeiro cronista-mor do reino a narração dos "grandes feitos e altos" de D. João I, mas como acentuavam as duas cartas régias, na sequência das crónicas dos reis da primeira dinastia, ou, nos termos da carta de 1449, da "crónica dos feitos dos reis de Portugal"».

Cortesia de wikipedia

O critério histórico
«Ainda está por determinar quais as crónicas redigidas por Fernão Lopes, além daquelas que averiguadamente lhe pertencem, Crónica de D. Pedro I, Crónica de D. Fernando e Crónica d’elrei Dom João I de Boa Memória, e dos Reis de Portugal o Décimo (primeira e segunda partes). Já no século XVI, Damião de Góis atribuía também ao nosso primeiro cronista a redacção da Terceira Crónica de D. João I, texto que teria sido parcialmente aproveitado por Gomes Eanes de Azurara, na Crónica da Tomada de Ceuta. E segundo aquele humanista, Fernão Lopes teria redigido também a Crónica de D. Duarte, plagiada e publicada por Rui de Pina. Damião de Góis foi também o primeiro a observar que Fernão Lopes alude frequentemente a acontecimentos anteriores ao reinado de D. Pedro, como se os tivesse narrado.
Assim, no Prólogo da Crónica de D. Pedro, o cronista refere-se à «ordem do nosso arrazoado, no primeiro prólogo já tangida», no capítulo I observa: «Morto el rei D. Afonso, como haveis ouvido, insistindo, nos capítulos XXVII e XLIV: «Já tendes ouvido», «como ouvistes», «como em seu lugar tendes ouvido». No capítulo XII é mais explícito: «Já vós ouvistes bem quanto os Reis antigos fizeram…».
Também Gomes Eanes de Azurara afirma que a actividade cronística de Fernão Lopes começara ainda antes da nomeação oficial, visto que D. Duarte «em sendo infante, lhe cometeu o cargo de apanhar os avisamentos que pertenciam a todos aqueles feitos e os ajuntar e ordenar segundo pertencia à grandeza deles e autoridade dos príncipes e outras notáveis pessoas que os fizeram».
Se a carta régia de 1434 atribuía já a Fernão Lopes o cargo de «poer em carónica as estórias dos reis que antigamente em Portugal foram», a 11 de Janeiro de 1449, assinada por D. Afonso V, pouco antes do encontro de Alfarrobeira, e destinada a aumentar a tença atribuída por D. Duarte, sublinhava:
  • «pelos grandes trabalhos que ele há tomado e ainda há-de tomar em fazer a crónica dos feitos dos reis de Portugal».

Cortesia de wikipedia 

Assim, competia ao primeiro cronista-mor do reino a narração dos «grandes feitos e altos» de D. João I, mas como acentuavam as duas cartas régias, na sequência das crónicas dos reis da primeira dinastia, ou, nos termos da carta de 1449, da «crónica dos feitos dos reis de Portugal».
Deste modo, Fernão Lopes teria deixado dois volumes de crónicas, como também se deduz do seguinte passo da Primeira Parte da Crónica de D. João I:
  • «[…] No começo desta obra nomeados fidalgos alguns, que ao conde dom Henrique ajudaram ganhar a terra aos mouros; assi neste segundo volume diremos uns poucos dos que ao Mestre foram companheiros em defender o reino de seus imigos».
A descoberta dos manuscritos de duas crónicas anónimas parece vir confirmar as hipóteses sugeridas por Damião de Góis, corroborando as afirmações do próprio Fernão Lopes. O códice encontrado, em 1942, na Biblioteca Municipal do Porto (publicado com o título de Crónica dos Cinco Reis de Portugal, porque apenas relata a história dos cinco primeiros reinados) apresenta grandes semelhanças, quanto à técnica da narração e ao estilo, com as crónicas de Fernão Lopes.
O mesmo acontece com o manuscrito pertencente à Casa Cadaval, que abrange, além do governo do conde D. Henrique, os sete primeiros reinados. Corresponde ao códice completo (de que a Crónica dos Cinco Reis é apenas um fragmento) e foi impresso em 1952 com o título de Crónica dos Sete Primeiros Reis de Portugal. É também conhecido por Crónica de Portugal de 1419, porque, segundo está registado no texto, foi iniciada nesta data, pouco tempo depois de FL ter entrado ao serviço do rei e do infante D. Duarte. Deve corresponder, pois, à Crónica de Portugal ou Crónica Geral do Reino, que segundo o testemunho de Azurara, existia na livraria de D Duarte.
Considerada perdida, teria sido aproveitada por Rui de Pina e outros cronistas. Também a Crónica do Algarve se integra nesta obra, apresentando as características dos textos de FL, o qual, todavia, e de acordo com o método historiográfico de então, poderá ter aproveitado e desenvolvido uma «estória» ou relato de uma testemunha presencial.
Parece poder concluir-se que as Crónicas de D. Pedro e D. Fernando fazem parte da Crónica dos Feitos dos Reis de Portugal, mas está ainda por averiguar com exactidão qual a contribuição de FL nas crónicas assinadas por Rui de Pina (1440? – 1522), assim como nas de Duarte Galvão (? – 1517), Acenheiro (1474 - ?) e Duarte Nunes de Leão (1530? – 1608). Contudo, as três crónicas de FL não chegaram até nós no texto original, assinado pelo autor; apenas possuímos os apógrafos, isto é, cópias elaboradas por ordem de D. Manuel, nos princípios do século XVI». In Maria Tarracha Ferreira, Crónicas de Fernão Lopes, biblioteca Ulisseia de Autores Portugueses, 1993, ISBN – 972-568-132-0.

Cortesia de M. T. Ferreira/JDACT