quarta-feira, 13 de julho de 2011

A. H. Oliveira Marques: Uma Descrição de Portugal em 1578-80. « Ritrato et Riverso del Regno di Portogallo. Só com uma pesquisa demorada se conseguirá identificar-lhe o autor. Foi, com toda a probabilidade, membro de uma das muitas embaixadas e outras missões enviadas pelos diversos Estados italianos a Portugal durante o século XVI»


Cortesia de aph e etabaccaenfr

Uma Descrição de Portugal em 1578-80.
«Há já bastantes anos, quando procurava, em arquivos alemães, materiais inéditos relativos à história portuguesa, encontrei em Hannover um manuscrito que logo me pareceu de enorme interesse. Intitulava-se «Ritrato et Riverso del Regno di Portogallo» e datava provavelmente de finais do século XVI, embora a grafia correspondesse melhor a uma cópia seiscentista.

Só com uma pesquisa demorada se conseguirá identificar-lhe o autor. Foi, com toda a probabilidade, membro de uma das muitas embaixadas e outras missões enviadas pelos diversos Estados italianos a Portugal durante o século XVI. Deve ter sido um clérigo ou um homem ligado à Igreja, que nunca critica, exaltando a «maldita» Inquisição, odiando os Judeus, etc. Pode tratar-se de um súbdito dos Estados Papais, pelas alusões respeitosas que faz ao Sumo Pontífice e seus decretos.


jdact e internationalloc

Aparentemente, descreveu Portugal depois da morte de D. Sebastião (1578) mas antes da conquista do País por Filipe II em 1580. Numa das suas referências, menciona o rei português como sendo «muito bom e muito santo», descrição apropriada do cardeal-rei D. Henrique, chefe supremo da «maldita» Inquisição....
Escreveu em italiano corrente, toscano, com alguns termos e expressões hoje obsoletas. É possível que uma análise linguística aprofundada nos dê alguma pista sobre a sua pátria de origem, dentro da Itália.
Dividiu o texto em duas partes, redigidas como se fossem relatórios escritos por pessoas diferentes e dirigidos a alguém de mais elevada hierarquia política ou eclesiástica.
Na primeira parte, o «Retrato», o autor procurou dar uma descrição objectiva de Portugal e das coisas boas que nele encontrou. Mas na segunda parte, o «Reverso», quis olhar para o País por outro prisma e relatar as coisas más, os aspectos feios dos Portugueses.
Dedicou um pouco mais de espaço a este «Reverso» (20 páginas manuscritas num total de 37) que é, na realidade, um libelo terrível contra Portugal, cujo povo ele despreza para além de todas as medidas.


Cortesia de porviseu e fotothing

Pela leitura do texto, os dados apresentados mostram-se, geralmente, dignos de crédito pela sua exactidão. Refiro-me, sobretudo, ao «Retrato», porquanto no «Reverso» os exageros são moeda corrente, ao lado de algumas indiscutíveis verdades. No conjunto, porém, o manuscrito oferece grande interesse, em especial pelas observações e comentários pessoais de que está recheado e que se afastam do género habitual de descrições da época. Dá-nos toda uma série de ideias e sugestões sobre assuntos normalmente esquecidos ou mal conhecidos dos historiadores por falta de fontes. A história dos usos e costumes, a história dos caracteres e dos temperamentos, em suma, a história dos povos como tais encontra neste texto material inestimável para a sua reconstituição». In Portugal Quinhentista, Ensaios, A. H. Oliveira Marques, Quetzal Editores, Referências, Lisboa, 1987.

Cortesia de Quetzal Editores/JDACT