Cortesia de mensageirosantoantonio esaberdesi
Santa Isabel, Rainha de Portugal
Canto III:
«Isabel despede-se de D. Pedro, seu pai, e de Aragào, sua pátria; efeitos da presença de Isabel durante a viagem a Portugal.
Canto Terceiro
«Alçando os montes vinha aquele dia
Entre todos os dias sinalado,
No qual tanto prazer amanhecia
A Dinis, acabando seu cuidado,
E a Pedro, com ele, anoitecia,
Porque seu Sol não era o costumado,
Que seu Sol costumado trasmontava,
Quando aquele horizonte o Sol dourava.
E como o bem, do qual a perda é certa,
Quando logo se perde, menos dana,
Como também o mal que o arco acerta
Se logo emprega a seta desumana,
Por ver a dor de todo descoberta,
Que calados queixumes desengana,
Faz do grande penhor depositários
Aqueles amorosos adversários.
E dando já os últimos abraços,
Impidindo-lhe a dor, a voz e a fala,
Os meneios, os olhos e os braços,
E as lágrimas dizem quanto cala;
E ela, que não tem os seus escassos,
Pois amor não fez nela menor cala,
Ao pai querido de tal sorte aperta
Que ali tivera a mão Gordiano incerta.
Despois que um largo tempo fez aparte
Os dous corpos que um mesmo amor ajunta,
Qual Rebeca do velho pai se parte,
Tal se parte do pai quasi defunta;
( ... )
Todos saem com ela os olhos fontes,
A lágrimas os olhos sempre abertos
Como quando os Rifeios horizontes,
Se de gelada neve estão cobertos,
Firindo o Sol mais quente os altos montes,
Vão-se em rios e ficam descobertos,
Uns a seguem co' a vista, outros co' a alma,
Outros ficam sem alma e vista, em calma,
Qual, quando algüa nau solta da praia
Para navegação larga e comprida,
Não há pessoa algüa que não saia
A vê-la, e do alto monte se despida,
E quanto mais se aparta, mais desmaia
Dos fracos olhos a pequena vida,
Até que lhe confunde a luz que cansa,
O céu c'o ar, com ambos a esperança.
( ... )
Vasco Mouzinho, in «Discurso sobre a vida, e morte de santa Isabel Rainha de Portugal e outras várias rimas, Lisboa 1596».
Cortesia da FC Gulbenkian/JDACT