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Manuel
I e o fim da tolerância religiosa (1496 - 1497)
«O reino de Portugal surgiu no século
XII a partir das complexas lutas políticas que ocorreram a seguir à morte do
rei Afonso VI de Leão e Castela (1065/72-1109). Nos séculos X e XI, o Territorium
Portucalense era apenas um condado do reino cristão de Leão e Castela,
centrado na cidade do Porto e circunscrito pelos rios Minho e Douro. A norte
ficava a Galiza e a sul o condado de Coimbra. Afonso VI de Leão e Castela
ofereceu os condados de Portugal e Coimbra à sua filha ilegítima dona Teresa e ao
seu genro francês Henrique de Borgonha em 1095-1097. Os governantes de Portugal
e Coimbra tiraram partido da menoridade turbulenta de Afonso VII (1109- 1157)
para conseguir uma efectiva independência política. O filho de dona Teresa, Afonso
Henriques (1139-1185), depôs a sua mãe autoritária em 1128 e assumiu pleno controlo
das terras concedidas aos pais. Afonso Henriques começou a intitular-se Portugalensium
Rex em 1139 e o título recebeu reconhecimento papal em 1179.
Afonso Henriques e os seus sucessores
não só preservaram a sua independência política em relação a Leão e Castela, como
expandiram gradualmente o novo reino à custa do Sul muçulmano. Em meados do século
XII, as conquistas de Lisboa e Santarém, em 1147, já haviam fixado a fronteira sul
do novo reino nas margens do rio Tejo, e Afonso Henriques começara mesmo a estender
o seu domínio a sul do rio. Apesar das fortes contraofensivas muçulmanas nos anos
90 do século XII, que eliminaram a maioria dos ganhos portugueses a sul do Tejo,
os portugueses mantiveram aquelas duas cidades. No século XII, entre 1217 e 1249,
os sucessores de Afonso I, com a ajuda das ordens militares, tomaram partido das
divisões políticas entre os muçulmanos e estenderam gradualmente o seu domínio para
sul. Afonso III (.1246-1279) concluiu este triunfante avanço militar com a conquista
de Faro em 1249, e o Tratado de Alcanizes em Setembro de 1297 estabeleceu oficialmente
a fronteira entre Portugal e Castela-Leão. A expansão territorial de Portugal na
Península Ibérica chegou, assim, ao fim quase dois séculos e meio antes da do reino
vizinho de Castela, mas o seu impacto sobre a sociedade portuguesa foi igualmente
duradouro. Não criou, é certo, uma população uniformemente cristã em Portugal.
Como no resto da Península Ibérica, o resultado foi, na verdade, o oposto. Na sequência
da conquista portuguesa, numerosas comunidades de judeus e de muçulmanos livres
(mouros forros) passaram a viver sob domínio cristão.
O processo do povoamento
muçulmano em Portugal continua a ser uma grande incógnita para a história portuguesa.
No seguimento da destruição do reino visigótico pós-romano pelas forças
invasoras árabes e berberes em 711, as cidades de Faro, Lisboa, Beja, Santarém e
Coimbra caíram rapidamente no poder dos exércitos do general árabe Abd al-Aziz,
enúe 714 e 116. Fontes muçulmanas e cristãs informam-nos que os governantes visigodos
locais negociaram tratados de vassalagem pacíficos com Abd al Ariz. Clãs árabes
instalaram-se em diversas partes desta região, mas parece razoável presumir que,
como noutros lugares da Península Ibérica, indígenas convertidos ao islamismo, os
muwalladun, constituíram provavelmente o elemento principal da população
muçulmana durante os séculos seguintes. Ahmad b. al-Husayn ibn Qasi, um místico
que se tomou soberano independente de Silves durante um breve período em meados
do século XII, era, ele próprio, descendente de indígenas convertidos ao islão».
In
François Soyer, A Perseguição aos Judeus e Muçulmanos de Portugal, 2007,
Edições 70, 2013, ISBN 978-972-441-709-7.
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