sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Amantes do Rei João I. Paula Lourenço (coord), Ana C. Pereira e Joana Troni. «Quais as circunstâncias que conduziram este filho ilegítimo de Pedro I ao poder? Lembremos, antes de mais, o afastamento do seu meio-irmão João, filho de Pedro e de dona Inês»

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De Ilegítimo a Rei de Portugal. João I
«Nasceu a 11 de Abril de 1357 o filho ilegítimo de Pedro I, o penúltimo rei da dinastia afonsina, que não estava destinado a governar um reino, mas foi um rei singular na História de Portugal. Não só porque, pela primeira e única vez, um bastardo subiu ao trono do reino, mas também pela prole que gerou e pelo legado de boa memória que deixou. Era o rei João I de mediana estatura, bem proporcionado, com o rosto largo, testa pequena, cabelo negro pouco comprido e bem composto, olhos negros e grandes, com notável viveza, o semblante agradável, o corpo robusto, e de forças grandes. Gostava de caça e de exercícios do corpo, mas também de música, dança, jogos e xadrez.
Homem de forte personalidade, de carácter teimoso, repentino e violento que se revelou desde a sua mocidade, João não nasceu para ser rei. Filho natural do rei Pedro I, sua mãe nem sequer foi a eterna amada dona Inês de Castro. De facto, João foi o fruto de uma relação do monarca com dona Teresa Lourenço, uma dama natural da Galiza, já depois da morte de dona Inês. Este filho, que nascia no ano em que Pedro foi alçado rei, foi primeiro educado em casa de Lourenço Martins, ficando depois ao cuidado de Nuno Freire Andrade, mestre da Ordem de Cristo. Era ainda novo, tinha somente 7 anos, quando, tal como escreveu Rui Pina na Crónica de dom Afonso IV, foi investido como mestre de Avis em 1364. À partida, João, tal como outros filhos ilegítimos dos reis seus antecessores, seguiria, assim, uma carreira religiosa. Nada faria esperar que viesse a assumir os destinos do reino. Mas, como foi salientado pela historiadora Maria Helena C. Coelho, foram várias as circunstâncias, internas e externas, que fizeram com que João fosse projectado para a ribalta política e se tornasse a hipótese mais viável e desejável para governar. Por tal motivo, a tradição cronística confere a João I uma aura de predestinação, tal como com outros monarcas da História Portuguesa, entre eles Afonso Henriques ou Pedro II.

O caminho até ao trono
Quais as circunstâncias que conduziram este filho ilegítimo de Pedro I ao poder? Lembremos, antes de mais, o afastamento do seu meio-irmão João, filho de Pedro e de dona Inês, por obra de dona Leonor Teles. João Castro apaixonou-se por dona Maria Teles, irmã da rainha, que era formosa e muito graciosa. Uma vez casados, a rainha viu no amor que os vassalos tinham a João e a dona Maria uma ameaça. Caso Fernando I morresse sem deixar mais sucessão do que a filha de ambos, dona Beatriz, João poderia suceder no trono. Assim, dona Leonor conseguiu, através da intriga, que João Castro acreditasse que a sua amada lhe era infiel e, acreditando, acabou por matá-la brutalmente nos Paços de Coimbra, em 1379. Na sequência destes acontecimentos, João afastou-se, por algum tempo, da corte, indo depois definitivamente para Castela. A rainha urdiu, de igual modo, algumas tramas de modo a comprometer o mestre de Avis em supostas conspirações contra o rei, seu irmão, Fernando I. Na realidade, o ilegítimo filho de Pedro I constituía, tal como o seu homónimo meio-irmão João, um perigo às pretensões e ambições de dona Leonor Teles. Foi, pois, neste contexto que a rainha, qual Penélope, teceu a sua teia de intrigas, de tal modo que levou o mestre até à prisão, em 1382.
Na sua crónica, Fernão Lopes refere que logo na noite em que o mestre foi preso, a rainha mandara fazer um alvará falso, supostamente assinado pelo rei, e no qual ordenava degolar João. No entanto, terá sido a desconfiança do executor da ordem que, ao procurar, junto do rei, a confirmação do que lhe fora ordenado, acabou por salvar o mestre da morte, sendo posto em liberdade». In Paula Lourenço (coord), Ana Cristina Pereira, Joana Troni, Amantes dos Reis de Portugal, 2008, Esfera dos Livros, Lisboa, 2011, ISBN 978-989-626-136-8.

Cortesia ELivros/JDACT