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e wikipedia
«(…)
Voltarei a tratar desse grupo negligenciado e, em grande medida, desconhecido.
Por ora, basta dizer que escolhi identificar-me com os dissidentes. Aos olhos
dos muçulmanos de Medina, somos todos hereges, pois tivemos a temeridade de questionar
a aplicabilidade de ensinamentos do século VII ao mundo do século XXI. Entre os
dissidentes incluem-se pessoas como Abd Al-Hamid Al-Ansari, ex-decano de
direito slâmico da Universidade do Catar, que condenou o ódio às religiões não
islâmicas. Ele citou na íntegra uma mulher saudita que indagou por que sua
filha devia ser ensinada a odiar não muçulmanos: eles querem que eu odeie o
cientista judeu que descobriu a insulina, que uso para tratar minha mãe? Devo ensinar
minha filha que ela tem de odiar Edison, o inventor da lâmpada elétrica que
ilumina o mundo islâmico? Devo odiar o cientista que descobriu a cura da malária?
Devo ensinar minha filha a odiar pessoas apenas porque a religião delas é diferente?
Por que transformamos nossa religião em uma religião de ódio contra quem difere
de nós? Al-Ansari cita então a resposta de um eminente clérigo saudita: isso
não é da sua conta e a cooperação com os infiéis é permitida, mas só como recompensa
por serviços, e não por amor. Al-Ansari propõe tornar o discurso religioso mais
humano. E é precisamente nisso que reformistas residentes no Ocidente, como
Irshad Manji, Maajid Nawaz e Zuhdi Jasser, se empenham. Eles têm em comum a
tentativa de modificar, adaptar e reinterpretar a prática islâmica a fim de
tornar o discurso religioso mais humano.
Quantos
muçulmanos pertencem a cada grupo? Mesmo se fosse possível responder decisivamente
essa questão, não sei se isso tem importância. No rádio e televisão, na comunicação
social, em muitíssimas mesquitas e, obviamente, no campo de batalha, os muçulmanos
de Medina chamam a atenção do mundo. Mais perturbador é o crescimento abrupto
do número de jihadistas muçulmanos nascidos no Ocidente. Uma estimativa da ONU
em Novembro de 2014 diz que cerca de 15 mil combatentes estrangeiros de no mínimo
oitenta países viajaram para a Síria para se juntar aos jihadistas radicais.
Mais ou menos um quarto deles provém da Europa Ocidental. E não são apenas
homens jovens. De 10% a 15% dos oriundos de alguns países ocidentais que
viajaram para a Síria são mulheres, segundo estimativas do grupo de pesquisa
ICRS. Há estatísticas ainda mais preocupantes. Segundo estimativas do Pew
Research Center, as projecções mostram que a população muçulmana dos Estados
Unidos crescerá de aproximadamente 2,6 milhões actuais para 6,2 milhões em
2030, principalmente em consequência de imigração e de fecundidade acima da
média. Embora em termos relativos isso venha a representar menos de 2% da população
norte-americana total (1,7% para ser mais exacta, em comparação com cerca de
0,8% hoje), em termos absolutos essa população será mais numerosa que a de
qualquer país da Europa Ocidental com excepção da França. Sendo imigrante de
origem somali, não tenho objecção alguma a que milhões de outras pessoas do
mundo muçulmano venham para os Estados Unidos em busca de uma vida melhor para
si mesmas e suas famílias. O que me preocupa são as atitudes que muitos desses
novos muçulmano-americanos trarão consigo. Aproximadamente dois quintos dos
imigrantes muçulmanos entre hoje e 2030 provirão de apenas três países: Paquistão,
Bangladesh e Iraque. Outro estudo do Pew, sobre a opinião no mundo muçulmano, mostra
quantas pessoas nesses países têm ideias que a maioria dos ocidentais
consideraria extremistas. Três quartos dos paquistaneses e mais de dois quintos
dos bengaleses e iraquianos pensam que as pessoas que deixam o islão merecem a pena
de morte. Mais de 80% dos paquistaneses e dois terços dos bengaleses e
iraquianos acham que a lei da sharia é a palavra de Deus revelada. Proporções semelhantes
dizem que o entretenimento ocidental fere a moralidade. Só minúsculas fracções
dessa população não se incomodariam caso suas filhas se casassem com cristãos.
Apenas uma minoria considera que matar mulheres nunca se justifica por motivo
de honra. Um quarto dos bengaleses e um dentre oito paquistaneses acha que as explosões
suicidas em defesa do islão são frequentemente ou às vezes justificadas». In
Ayaan Hirsi Ali, Herege, tradução de Laura Motta e Jussara Simões, Editora
Schwarcz, Companhia das Letras, 2015, ISBN 978-854-380-373-9.
Cortesia de
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