terça-feira, 6 de setembro de 2016

O Papa Negro. Ernesto Mezzabota. «O presidente terminara a leitura. Os senhores que o rodeavam, e que, à excepção de Loiola, tinham tomado parte na redacção daquele programa, conservavam-se impassíveis»

Cortesia de wikipedia

A assembleia dos templários
«(…) O incêndio lavra por toda a parte. A Suíça, a Inglaterra, a França, a Itália, escutam com avidez os apóstolos das novas ideias. O poder pontifício está por toda a parte cercado de homens que, às ocultas o minam, o atacam, e que hão de com certeza destruí-lo. Irmãos, nós, que somos os Senhores do Templo; nós, que temos amigos e partidários por toda a parte; nós, que possuímos os tesouros arrancados pelos nossos antepassados à cúbica de Filipe o Belo e multiplicados até o infinito no decurso de séculos, unamo-nos todos, e, auxiliando a grande obra de Martim Lutero, destruamos a Igreja e das suas ruínas façamos ressurgir a ordem dos Templários! Apoiado!... Apoiado!, gritaram de todos os lados. Um dos irmãos levantou-se: tens tu, disse ele, tens tu, venerável príncipe, um plano pronto para a execução da empresa? Tenho um plano, não meu, mas estudado e pensado conjuntamente com os meus colegas, respondeu o presidente. Não esqueçais, irmãos, que depois da desgraça de Jacques Molay, a nossa ordem não admitiu mais nenhum mestre; delegou todos os poderes no conselho dos sete Senhores, o mais velho dos quais será o presidente, e, pelo triste privilégio da idade, é a mim que presentemente cabe esse lugar. Mas eu e os meus companheiros de grau, excepto o irmão Inácio de Loiola, que estava ausente, tínhamos combinado alguns capítulos, que vos vão ser lidos. O ancião tirou do seio algumas folhas de pergaminho: fez-se um profundo silêncio, pois que todos os Templários tinham a mais profunda veneração pelo senhor de Beaumanoir, e além disso tinham jurado a obediência mais absoluta ao conselho dos sete senhores.
Beaumanoir leu: a assembleia constituída por cavaleiros, padres, vassalos, plebeus e escravos, para libertar a humanidade das cadeias dos padres e dos soberanos, compõe-se de três classes. A primeira classe compreende os que se associam a esta obra com pureza de coração, e têm intenção de se instruir nos mistérios da ordem. Estes deverão durante três anos estudar os meios de se realizar o fim externo da associação, e dividir-se-á em dois ramos, aprendizes e mestres. A segunda classe compreenderá os irmãos que do estado de ensino tiverem chegado ao estado de operar. Estes terão a seu cargo executar no mundo dos profanos o que tiver sido deliberado ou resolvido pelo supremo conselho; terão sob as suas ordens os aprendizes e mestres, e serão iniciados nos segundos mistérios da ordem, que dizem ao fim político e às reformas a obter. A terceira classe, finalmente, compor-se-á de um número limitadíssimo de pessoas, que serão iniciadas nos terceiros mistérios. Estes iniciados supremos conhecerão as forças da ordem o seu fim principal, os tesouros de que pode dispôr; serão de: ligados de todos os laços, excepto dos que dizem respeito à ordem e, conjuntamente com o Grão Mestre, governarão a terceira classe de associados. Nenhum poderá ser promovido à classe superior sem ter completado pelo menos três anos na classe inferior. O Grão-Mestre será eleito entre os dignitários da classe suprema. A ordem, aliada a todos os apóstolos da razão, sustentar uma luta de morte contra a Igreja e os tiranos, e não considerar cumprido o seu fim senão quando a liberdade do homem e de consciência forem absolutamente reconhecidas.
O presidente terminara a leitura. Os senhores que o rodeavam, e que, à excepção de Loiola, tinham tomado parte na redacção daquele programa, conservavam-se impassíveis. Não acontecia o mesmo com os outros associados, que, salvo raras excepções, mostravam verdadeiro entusiasmo. Na verdade, aquelas normas claras, simples, com um fim determinado, eram já de per si um poderoso meio de propaganda. A divisão em classes permitia utilizar as faculdades de cada um, segundo os melhores interesses da ordem; ao passo que a possibilidade de passagem de um grau para outro abria um vasto horizonte à mais nobres das ambições, e destruía a disposição aristocrática, tão prejudicial a qualquer corporação instituída para governar os homens. Todavia, houve um dos irmãos que se levantou: era este um nobre holandês, que vinha procurar, no meio dos Templários aliados para o seu país, que se preparava para se insurgir contra a Espanha. Devemos então procurar por toda a parte filiados para a nossa ordem?, disse ele. Devemos abrir as fileiras da nossa instituição, até agora tão zelosamente recusadas, a todos aqueles que nos parecerem aptos para nos auxiliarem na empresa?» In Ernesto Mezzabota, O Papa Negro, 1947, tradução de Adolfo Portela, Brasil, Exilado dos Livros, Epub, 2001, ISBN 858-671-001-6.

Cortesia de Wikipedia/JDACT