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O envolvimento das milícias monástico-militares radicadas em Portugal no
conflito luso-castelhano remonta, de acordo com as fontes que dispomos, à sua
própria génese, quando em Dezembro de 1474 chegou a Estremoz uma mensagem do
marquês de Vilhena comunicando a morte de Henrique IV e pedindo a Afonso V que
entrasse urgentemente em Castela, por forma a casar-se com a princesa dona
Joana e, desse modo, ser levantado rei. Então, de acordo com os cronistas Rui Pina
e Damião Góis, o conselho régio dividiu-se quanto à abertura de uma guerra com
os futuros Reis Católicos: por um lado, um grupo em que pontificavam grandes
senhores como o duque de Guimarães e primogénito do duque de Bragança, Fernando,
e o arcebispo de Lisboa, Jorge Costa, que era contrário ao projecto castelhano;
por outro, um conjunto entusiasta do conflito em que se destacava o príncipe
João, afinal o líder das Ordens de Santiago e de Avis, desejando que elRey
seu Padre com esperança de acrecentar seus Reynos de Portugal, aceitasse, e nom
se escusasse do casamento e empresa de Castela. Mas enquanto se travavam
acesos debates acerca da viabilidade da guerra, um outro conselheiro do rei, o
prior do Crato, Vasco de Ataíde, juntamente com o bispo de Évora, Garcia Meneses,
e o camareiro-mor, Lopo Albuquerque, elaborava um conjunto de pareceres,
conforme registado pelo secretário Álvaro Lopes Chaves, acerqua das cousas
de que ora o dito senhor loguo deuesse de fornecer e prouer assj pera sua ida a
Castela se ouuer de ser como pera deffensão e boa guarda [sic] de seus Rejnos
em caso que elle lá non haja de hir. Entre vários aspectos bélicos, do
recrutamento à importação de armamento, previam-se a vistoria e as reparações
necessárias nos castelos costeiros e fronteiriços, conforme veremos mais
adiante, acerca dos quais se aludia à importância do provimento com as modernas
artelharias.
Segundo
a cronica portuguesa, a chegada de Lopo Albuquerque a Évora com as certidões de
fidelidade dos apoiantes castelhanos de dona Joana, em Janeiro de 1475, foi
determinante para desbloquear a decisão acerca da disputa do trono vizinho.
Convencido da viabilidade da guerra, Afonso V convocou os Grandes e Senhores
Prelados, Fydalgos, e Cavalleiros, e gente outra de seus Reynos para,
passado o mau tempo do Inverno, na entrada de Mayo logo seguynte serem em
Arronches, per onde acordou d’entrar. Durante o apetrechamento bélico do
exército português temos, uma vez mais, notícia do empenho das Ordens
Militares, cuja estrutura operacional e logística a mobilizar parece ter sido
relativamente dispendiosa. Ao longo do mês de Março, em Évora, o rei diferiu
vários pedidos de autorização de arrendamento de terras à Ordem do Hospital
para que pudesse fazer face às despesas na guerra, visto como pera se rreger
lhe he neçessario arrendar as dictas suas commendas, contando-se entre os
beneficiários um cavaleiro, quatro comendadores e o próprio Prior do Crato.
No
final de Maio de 1475, um poderoso exército penetrou em Castela sob o comando
de Afonso V, fazendo alto em Codiceira e, depois, em Pedraboa, onde foi
reforçado por contingentes que atravessaram a Beira. Os cronistas portugueses,
Rui Pina, Garcia Resende e Damião Góis, são unânimes quanto aos números do
alardo, a única contagem que dispomos das forças portuguesas, realizado no
mesmo dia: cinquo mil e seis çentos homens de cauallo, e quatorze mil de pé,
afora outra gente de seruiço, pages e gente aventureira. A consensualidade
dos três cronistas confere alguma fiabilidade a estas cifras, mas estamos longe
de saber a dimensão do grupo das Ordens Militares, tarefa que pela ausência de
fontes se torna praticamente inconclusiva ou conjectural. Podemos, ainda assim,
percepcionar em linhas gerais o que numericamente representava o contributo das
milícias monástico-militares se tivermos em conta outros dados. Sabemos que, no
início do século XV, o conselho de João I, ao engendrar uma espécie de exército
fixo de defesa de Portugal, atribuiu às Ordens Militares a obrigação de
fornecerem 340 das 3.200 lanças previstas para todo o reino (10,6 % do total):
Cristo e de Santiago, as milícias mais poderosas, deveriam contribuir com 100
lanças cada, enquanto a Avis caberiam 80 e ao Hospital as restantes 60. Se
considerarmos o aumento demográfico na Cristandade desde os finais da primeira
metade de Quatrocentos (de que Portugal beneficiou também), o crescimento dos
exércitos de então e a circunstância de, em 1475, se tratar de uma campanha
ofensiva em que se apostavam fortes recursos nacionais (e não apenas de forças
fixas de defesa do reino), acreditamos que as Ordens Militares portuguesas
tenham contribuído com um número substancialmente superior de combatentes ao
que foi preconizado ao tempo do rei de Boa Memória». In António
C. Martins Costa, As Ordens Militares em combate nos finais da Idade Média.
Caso da Guerra da Sucessão de Castela (1475-1479), Universidade de Coimbra,
Faculdade de Letras, Revista Medievalista, Nº 19, JAN-JUN, 2016, ISSN
1646-740X.
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