Entrada da piscina D. Afonso Henriques.
Desaparecida com o temporal de 1995.
Foto de Edgard Vasconcelos
Cortesia de palimage
A Presença de D. Afonso Henriques
«Se assim fosse, tudo levaria a crer que seriam restos da casa em que se hospedou o Rei. Desconhecemos se essa tradição tem algum fundamento, nem sabemos se tal data lá está ou algum dia lá esteve. E, se assim fosse, teria essa data algo a ver com a presença de D. Afonso Henriques? Que data seria essa?
A verdade é que existiu o Paço, construído ou não para albergar o Rei. O Paço podia até ser a casa que fora do falecido senhor de Lafões, D. Fernando Pedro, casa que poderá ter sofrido obras de adaptação, porventura ampliação, e que até podia ser a mesma que, cinco séculos mais tarde, Pires da Sylva designa por “Casa de D. Joseph”.
E outras casas existiram, construídas ou melhoradas, para albergar gente de qualidade, especialmente durante as reuniões da Cúria Régia. Além da «Calçada do Paço», existiu também a «Praça do Paço», designação que se manteve até tarde, pois, em 1889, num auto de arrematação, que mais adiante analisaremos detalhadamente, lavrado na Câmara de S. Pedro do Sul, fala-se na «antiga rua que da Capella da Senhora da Saude segue para a antiga praça do Paço». Seria, talvez, o Largo já parcialmente ocupado pelo Balneário cuja construção havia começado cinco anos antes e que haveria de tomar o nome de «Rainha D. Amélia».
Edifício do antigo balneário e hospital real das Caldas de Lafões.
Foto de Simão Almeida
Cortesia de palimage
Voltemos a D. Afonso Henriques. Ignoramos como se gerou a peregrina ideia de que o rei se alojou nas Casas da Comenda de Ansemil. É uma fantasia que começa a aparecer repetida, pelo menos em escritos de divulgação e propaganda turística. No número 7 do “Guia do Turismo de Habilação”, p.44, que integrou o “Expresso” de 3 de Julho de 1999, ao tratar-se da Quinta da Comenda, cometem-se dois erros graves, que importa corrigir. Ali se escreve taxativamente:
- «Aqui [Casa da Comenda] se alojou o Rei D. Afonso Henriques quando se deslocou às Termas de S. Pedro do Sul para se tratar de uma fractura que sofreu numa perna durante a batalha de S. Mamede».
Primeiro erro: D. Afonso Henriques não fracturou a perna na batalha de S. Mamede, que foi em 1128. Era então um jovem de 19 anos e ainda nem era rei. O desastre foi em Badajoz, em 1169, quando o rei já era sexagenário.
Segundo erro: Não tem o mínimo fundamento documental, ou sequer de tradição, a afirmação de que D. Afonso Henriques se haja instalado na Casada Comenda, que, de resto, nada tinha da construção do séc. XVIII que chegou até nós.
A escassez de dados não nos permite conhecer todas as transformações que nas velhas Caldas de Lafões, se terão operado. Mais de oito séculos passados, imaginemos o que terá significado, para a localidade e para a região, a presença demorada do real enfermo, com os seus acompanhantes, toda a movimentação provocada pelas reuniões da Cúria Régia, largamente participadas, como já se viu. Tudo isto, forçosamente, haveria de repercutir na vida do Concelho do Banho e das velhas Caldas de Lafões, que irão alcançar maior desenvolvimento, não só pelas obras de beneficiação que receberam, como pela projecção que lhes iria dar a preferência do 1.º Rei de Portugal.
Cortesia de palimage
O Hospital Real das Caldas de Lafões
Depois de D. Afonso Henriques, o conjunto termal de Lafões vai continuar a ser, durante séculos, o principal centro assistencial da região. Cada vez mais, as suas águas são procuradas por nobres e plebeus, ricos e pobres, que ali buscam alívio para os seus males. Tem-se escrito que por lá terão passado D. Dinis, D. João I e sua mulher, o Duque de Lencastre, D. Duarte e sua mulher, o Infante D. Pedro, o Infante D. Henrique e os Duques de Viseu seus sucessores. Não sabemos se isto é certo quanto a todas estas personagens, mas no que respeita à família de Avis, dada a sua relação com Viseu e com Lafões, é muito natural que, pelo menos, alguns lá tenham estado, de simples visita ou em tratamentos. Com a doação do senhorio de vastos domínios no território da comarca da Beira, feita por D. João I ao Infante D. Henrique, em 1411, e a posterior criação do Ducado de Viseu (1415), o Banho passou a estar profundamente ligado aos príncipes de Avis. Os documentos são claros. Desde logo, no título e no texto da carta de 1411, Lafões é a primeira terra mencionada:
- «... doaçam da terra e julgado de lafooes e do julgado e terra de besteiros ( ..) E doutras muytas villas julgados concelhos jnsertos nesta carta a jnfante dom amrique».
Pires da Sylva refere um livro velho, que dizia existente na Misericórdia de Vouzela, do qual consta uma escritura que termina:
- «Joanne Anes Tabaliaõ do Infante D. Henrique em terra de Alafoens a escrevi. Villa do Banho na Casa da Rellaçom, estando ahi em Rellaçom Joanne Affonso, & Valentim Gonçalves, Juizes ordinários».
À morte do Infante D. Henrique, passou o senhorio do Banho aos Duques de Viseu seus sucessores. De imediato, a seu sobrinho D. Fernando, 2.º Duque, herdeiro dos seus bens e títulos. Deste, a seu filho D. João, 3.º Duque, que teve vida efémera e morreu sem descendência, passando o senhorio a seu irmão D. Diogo, o Duque conspirador que morreu apunhalado às mãos do rei». In António Nazaré Oliveira, Termas de S. Pedro do Sul (Antigas Caldas de Lafões), 2002, Palimage Editores, ISBN 972.8575-38-6.
Com a amizade de MR
Cortesia de Palimage/JDACT