terça-feira, 20 de setembro de 2011

O Aleijadinho. António Francisco Lisboa: «... que permanece até hoje envolta em cerrado véu de lenda e controvérsia, tornando muito árduo o trabalho de pesquisa sobre ele e ao mesmo tempo transformando-o em uma espécie de herói nacional»

Cortesia de wikipedia

António Francisco Lisboa, mais conhecido como Aleijadinho, (Ouro Preto, c. 29 de agosto de 1730 ou, mais provavelmente, 1738 (Ouro Preto), 1814,  foi um importante escultor, entalhador e arquitecto do Brasil colonial.

Pouco se sabe com certeza sobre sua biografia, que permanece até hoje envolta em cerrado véu de lenda e controvérsia, tornando muito árduo o trabalho de pesquisa sobre ele e ao mesmo tempo transformando-o em uma espécie de herói nacional. A principal fonte documental sobre o Aleijadinho é uma nota biográfica escrita somente cerca de quarenta anos depois de sua morte. Sua trajetória é reconstituída principalmente através das obras que deixou, embora mesmo neste âmbito sua contribuição seja controversa, já que a atribuição da autoria da maior parte das mais de quatrocentas criações que hoje existem associadas ao seu nome foi feita sem qualquer comprovação documental, baseando-se apenas em critérios de semelhança estilística com peças documentadas.

Cortesia de vidaslusofonas

Toda sua obra, entre talha, projectos arquitectónicos, relevos e estatuária, foi realizada em Minas Gerais, especialmente nas cidades de Ouro Preto, Sabará, São João del-Rei e Congonhas. Os principais monumentos que contém suas obras são a Igreja de São Francisco de Assis de Ouro Preto e o Santuário do Bom Jesus de Matosinhos. Com um estilo relacionado ao Barroco e ao Rococó, é considerado pela crítica brasileira quase em consenso como o maior expoente da arte colonial no Brasil e, ultrapassando as fronteiras brasileiras, para alguns estudiosos estrangeiros é o maior nome do Barroco americano, merecendo um lugar destacado na história da arte do ocidente.
A primeira notícia oficial sobre Aleijadinho apareceu em 1790 num memorando escrito pelo capitão Joaquim José da Silva, cumprindo ordem régia de 20 de julho de 1782 que determinava se registrassem em livro oficial os acontecimentos notáveis, de que houvesse notícia certa, ocorridos desde a fundação da Capitania de Minas Gerais. O memorando, escrito ainda em vida de Aleijadinho, continha uma descrição das obras mais notáveis do artista e algumas indicações biográficas, e em parte nele se baseou Bretas para escrever os Traços biográficos relativos ao finado António Francisco Lisboa, distinto escultor mineiro, mais conhecido pelo apelido de Aleijadinho, onde reproduziu trechos do documento original, que mais tarde se perdeu.
Cristo carregando a cruz, Santuário de Congonhas. O Barroco no Brasil foi, um estilo movido principalmente pela inspiração religiosa, mas ao mesmo tempo de enorme ênfase na sensorialidade e na riqueza dos materiais e formas, num acordo tácito e ambíguo entre glória espiritual e êxtase carnal. Este pacto, quando as condições permitiram, criou monumentos artísticos de enorme complexidade formal e riqueza plástica. Como disse Germain Bazin, "para o homem deste tempo, tudo é espetáculo". Esse fausto decorativo tinha ademais um propósito didáctico, já que o Catolicismo compreendia que "a arte pode seduzir a alma, perturbá-la e encantá-la nas profundezas não percebidas pela razão; que isso se faça em benefício da fé"'. Mas tanta riqueza também era um tributo devido a Deus, por Sua própria glória. Todo esse cenário luxuriante era um pano de fundo perfeito para a catequese católica, largamente influenciada pelos preceitos jesuíticos e contra-reformistas. A retórica barroca, base para todo o ensino, laico e sacro, tinha um sentido cenográfico e declamatório, e se expressava cheia de hipérboles e outras figuras de linguagem, num discurso de largo vôo e minuciosa argumentação, o que se refletiu plasticamente na extrema complexidade da obra de talha e na agitada e convoluta movimentação das formas estatuárias, pictóricas e arquiteturais.

Cortesia de wikipedia


Além da beleza de formas o Catolicismo durante o Barroco, tanto na Europa como no Brasil, procurou estimular a devoção, o amor e a compaixão através da representação dos momentos mais dramáticos da história sagrada, e assim abundam os Cristos açoitados, as Virgens com o coração trespassado de facas, os crucifixos sanguinolentos, as patéticas imagens de roca de membros articulados e com cabelos e vestes reais, que se levavam em procissões solenes e feéricas onde não faltavam as lágrimas e os pecados eram confessados em alta voz. Mas essa mesma devoção, que tantas vezes adorou o trágico, plasmou também inúmeras cenas de êxtase e visões celestes, e outras tantas Madonnas de graça ingénua e juvenil e encanto perene, e doces Meninos Jesus, cujo apelo ao coração simples do povo era imediato e sumamente efectivo. Novamente Bazin captou a essência do processo dizendo que "a religião foi o grande princípio de unidade no Brasil. Ela impôs às diversas raças aqui misturadas, trazendo cada uma um universo psíquico diferente, um mundo de representações mentais básico, que facilmente se superpôs ao mundo pagão, no caso dos índios e dos negros, através da hagiografia, tão adequada para abrir caminho ao cristianismo aos oriundos do politeísmo". Costa faz lembrar ainda que o templo católico não era apenas um lugar de culto, mas também cumpria uma função social profana, pois era o mais importante espaço de confraternização do povo, um centro de transmissão de valores sociais básicos e amiúde o único local seguro na muitas vezes turbulenta vida da colónia.



Comparações estilísticas entre as obras autenticadas com as de autoria sugerida podem ser usadas para identificar o autor, embora este critério seja sempre conjetural, ainda mais porque se sabe que o estilo "típico" de Aleijadinho criou escola, sendo continuado por grande número de escultores mineiros e copiado até nos dias de hoje por santeiros da região.Tal estilo foi descrito por Silvio de Vasconcellos como apresentando os seguintes traços:
  • Posicionamentos dos pés em ângulo próximo do recto;
  • Panejamentos com dobras agudas;
  • Proporções quadrangulares das mãos e unhas, com o polegar recuado e alongado e indicador e mínimo afastados, anular e médio unidos de igual comprimento;
  • Nas figuras femininas os dedos se afunilam e ondulam, elevando-se em seus terços médios;
  • Queixo dividido por uma cova;
  • Boca entreaberta e lábios pouco carnudos, mas bem desenhados;
  • Nariz afilado e proeminente, narinas profundas e marcadas;
  • Olhos rasgados de formato amendoado, com lacrimais acentuados e pupilas planas;
  • arcadas superciliares alteadas e unidas em "V" na altura do nariz;
  • Bigodes nascendo das narinas, afastados dos lábios e fundidos com a barba; esta é recuada na face e se apresenta bipartida em dois rolos;
  • Braços curtos, um tanto rígidos, especialmente nos relevos;
  • Cabelos estilizados, modelados como rolos sinuosos e estriados, terminados em volutas e com duas mechas sobre a testa;
  • Expressividade acentuada, olhar penetrante.
O Aleijadinho já foi retratado como personagem no cinema e na televisão: em 1915 Guelfo Andaló dirigiu a primeira cinebiografia sobre o artista, e mais recentemente ele foi interpretado por Geraldo Del Rey no filme "Cristo de Lama" (1966), Maurício Gonçalves no filme "Aleijadinho - Paixão, Glória e Suplício" (2003) e Stênio Garcia num Caso Especial da TV Globo. Em 1978 Aleijadinho foi objeto de um documentário dirigido por Joaquim Pedro de Andrade e narrado por Ferreira Gullar». In Wikipédia, versão brasileira.

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