sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Loja, Contra-loja e Armazém. Tribuna Livre. Garcia de Castro. «Todos parecemos mais próximos, ainda que o não estejamos, isso vem dos corações, salvo seja uma aflição em casa, liberdade isoladora, “self-service”, hipermercados. Sejamos, pois, globais»

jdact

«Será talvez por isso, vulgaridade? Habituação ou semântica? Que os supermercados passaram a dizer-se Lojas, alguns chamam-se Foruns. Decerto que é por isso que até dentro da prudência arrastada da Igreja, onde o papa saberá que nem tudo o que vai recomendando é seguido pelos fiéis mais inconformados, uma qualidade de teólogos se propaga, cada vez mais evangelicamente, com interpelações de um humanismo renovado, conciliador, de purificação doutrinaria, à existência da nossa realidade quotidiana em confronto disciplinar da Fé com a Natureza, o que, daqui não sei por quantos anos, provocará no seio do catolicismo, uma qualquer outra revoada salutar de Protestantes.
Basta que se vá, aos poucos, concertando com as aulas dos seminários ou centros de formação religiosa. Já cá não estarei para me alegrar com isso. Só que as elites específicas das Finanças e das Economias são marginais, resultaram marginais para connosco, homens comuns, o que pode ser perigoso, quando a situação de tal distância se nos tornar habitual e a vivermos como cultura. Stalin foi ditador. A Guerra Fria acabou. Como serão, económicas, as ditaduras sem país expiatório? A não ser que a chamada economia de mercado, o liberal-capitalismo por aí rebente algum a vez, provoque uma tal ruptura, que fiquemos ainda mais à rasca, sem se poder voltar para trás, sem saber como remediar, para continuar a ir para a frente. Seria um grande sarilho, ricos e pobres comidos, desvairados os políticos, a careca à mostra dos accionistas maiores, dos lobbies banqueiros, dos, os Estados e alguns dos seus impérios. Mas não há-de ser assim. Mesmo com o sofrimento, a ubiquidade da História há-de de novo saber reequilibrar-se. Já se fala banalmente em clonagem. Há maior informação. Mas que é ter conhecimento?
Todos parecemos mais próximos, ainda que o não estejamos, isso vem dos corações, salvo seja uma aflição em casa, liberdade isoladora, self-service, hipermercados. Sejamos, pois, globais. Mas não digam que o Modelo tem lojas por toda a parte. "Quando um valor entra em discussão, um facto social novo está para se dar." Se invertermos a sentença, dá no mesmo, se o facto estiver consumado. As grandes mudanças ocorrem dos interesses súbitos, quer de perto quer no mundo, quando emergem necessidades novas, ou do acaso, como em algumas descobertas, ou da variada invenção, do que faz uso o fito perspicaz da economia e riqueza, quer dizer, dominação. Os povos, então, adaptam-se ao destino que os transforma, para melhor ou para pior. Deste percurso das épocas se derivam as políticas e as metafísicas. Há sempre guerras, ou antes ou de permeio. As Artes, de fora parte, substância paralela, salpicam-se destes processos, deles ressaltam ou se abastecem ou lá mergulham, se absorvem, se alindam ou contrafazem, mas persistem circunscrição, igualmente mutável, reclamatória, indefinida, traçado no entanto consistente da mesma História. Das Artes se enobrecem casas grandes do comércio e traficância, impérios da sagração, como o dos papas, e ainda agora dela se adornam Companhias, Bancos, Gabinetes, fachadas, metropolitanos. As Artes são a fortuna pública dos museus. E diz-se comercialmente "investir em arte". As Artes são concordância». In Garcia de Castro, Loja, Contra-loja e Armazém, Tribuna Livre, Edições Colibri, 2011, ISBN 978-989-689-162-6.

Cortesia de E. Colibri/JDACT