quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

José Varandas. Bonus Rex ou Rex Inutilis. «… a entrega de avultadas somas do tesouro real nos cofres da arquidiocese representaria o pagamento pelos danos causados pela perturbação que as medidas de Afonso II tinham causado sobre aqueles direitos da Igreja»

Cortesia de wikipedia e jdact

Sancho II de Portugal. Um Conspecto Historiográfico

Com a devida vénia ao Doutor José Varandas

Fr. António Brandão (1632). Quarta parte da Monarchia Lusitana que conthem a Historia do reyno de Portugal, desde o tempo delRey D. Sancho I, até o reynado delRey D. Affonso III. Lisboa, ed. por Pedro Crasbeek, 1632

«(…) Necessariamente, era o momento para a composição entre as facções opostas. A eterna questão sobre os direitos das infantas tinha-se agravado com a intervenção de Afonso IX de Leão, fragilizando a posição dos tutores do rei. A insustentabilidade de um estado incapaz de agir e de impor a sua autoridade obrigava a que se iniciassem conversações. Herculano põe em evidência as dificuldades em que se encontravam os antigos conselheiros de Afonso II, e agora tutores do pequeno rei e a necessidade de sair do impasse político em que o reino se encontrava. Segundo Alexandre Herculano, o clero português colocou sérios entraves ao modelo centralizador de Afonso II. A sua oposição, motivada pela aplicação violenta das determinações da coroa, acabou por provocar danos insuportáveis ao aparelho do estado e à autoridade dos validos do rei. A concórdia com o clero português era vital para a manutenção do estado e da sua auctoritas. A concordata com o clero assinada em 1223 é considerada como um feliz aproveitamento por parte da Igreja das infelizes circunstâncias em que o reino se encontrava. Sendo verdadeiras as disposições contidas naquele documento, estas abrangiam muito mais do que uma mera indemnização pecuniária, com efeito o que o arcebispo pretendia era garantir condições vantajosas nos capítulos da jurisdição e das imunidades eclesiásticas; a entrega de avultadas somas do tesouro real nos cofres da arquidiocese representaria o pagamento pelos danos causados pela perturbação que as medidas de Afonso II tinham causado sobre aqueles direitos da Igreja.

De seguida, comenta criticamente a ausência de informações sobre os três primeiros anos do reinado de Sancho II nos historiadores que o antecederam. Parece, afirma, que não viram neles mais do que o movimento ordinário de um reino pacífico e, contudo, nos documentos desse período está, bem visível, a existência de uma grande agitação política. Sinónimo desta agitação é a constante mudança de grandes senhores da aristocracia portuguesa nos principais cargos da cúria. Essa acelerada sucessão de validos do rei naqueles cargos contrariava, para Herculano, o quadro tradicional observável em reinados anteriores, onde os ministros do rei se mantinham nos cargos durante muito tempo. A que se deve esta mudança na ocupação dos cargos públicos?

Herculano atribui-a aos factos ocorridos durante a menoridade do rei, onde o estado pueril do príncipe era causa dessa vertiginosa alternância de nobres em cargos públicos. Além do problema levantado pelo estado pueril de Sancho, o autor refere a existência de tensões e ódios entre a nobreza do reino e os antigos validos de Afonso II, agora tutores do pequeno rei. A ausência de um poder forte, como tinha sido o de Afonso II, levava a que os senhores lançassem mão dos mais variados processos para alcançarem os seus objectivos, atirando o reino para um estado de desordem. As referências à turbulência social daqueles primeiros tempos do reinado e às causas que as precipitaram estão dificultadas pela escassez de documentação para aquele período, mas essa ausência, pode também ser demonstrativa de um estado fraco e desorganizado, onde os normais procedimentos da chancelaria são uma das principais vítimas. Para ele cabe ao clero, em especial aos seus notáveis, o principal papel na perturbação da ordem pública. É nesta estrutura eclesiástica que os tutores de Sancho e o próprio rei encontram as maiores resistências. As tentativas de pacificação que definem os inícios do reinado de Sancho II são alcançadas à custa de grandes concessões por parte da estrutura régia à Igreja e aos seus prelados e que acabam, num prazo mais longo, por abrir novas frentes de colisão». In José Varandas, Bonus Rex ou Rex Inutilis, As Periferias e o Centro. Redes de poder no reinado de Sancho II (1223-1248),Ude Lisboa, FdeLetras, DdeHistória, Tese de Doutoramento em História, História Medieval, 2003, Wikipedia.

 Cortesia de Ude Lisboa/ FdeLetras/ DdeHistória/JDACT

JDACT, José Varandas, História, Cultura e Conhecimento, Universidade,