Prefácio
«Como salienta Winkler (2005, p.
688), nevertheless, it is the cinema
and its offshoot, television, that
today keep the Homeric epics before the eyes of millions worldwide, if often in
rather loose adaptations. Em 2007, na esteira do impacto do filme Troia sobre a academia, Winkler
publica a coletânea Troy. From Homer’s
Iliad to Hollywood Epic (Oxford, Blackwell), com seu texto Iliad and the
cinema, cujas questões escolhidas para analisar sinalizam possibilidades
metodológicas para este campo emergente de estudos e reflexões, apontando a
importância de se estudar a presença no cinema de temas extraídos/oriundos do
universo da Antiguidade.
De certo modo, é de se prever
que, do outro lado da trincheira, a renovação do olhar da academia sobre o que
a sétima arte anda fazendo na sua recepção e usos da Antiguidade gere também um
novo contexto para o produzir e dirigir filmes inspirados na Antiguidade. E é
neste contexto que, em 2009, estreia o filme Agora, do cineasta
chileno-espanhol Alejandro Amenábar, até então conhecido por suas produções no
género do terror, trazendo agora para a tela sua leitura da vida da matemática,
filósofa neoplatónica e professora Hipátia de Alexandria.
Excelente produção, não exerceu
tanto impacto sobre o grande público, mas, inversamente, foi acolhida com muito
interesse pela academia, visto trazer no bojo da sua narrativa questões muito
contemporâneas, como a agência feminina e a intolerância cultural, temas hoje ainda
mais actuais e pungentes que à época do lançamento do filme. José Petrúcio
Farias Júnior é um historiador atento a diferentes liames entre o presente e a
Antiguidade, entre o Brasil e Grécia & Roma. Não em um sentido passivo de
um legado grandioso e civiliza tório que se imponha sobre nós, como herança a
ser louvada como algo superior a outras vertentes histórico-culturais. Mas sim
no sentido da presença da Antiguidade, que não ocorre por uma passividade do
presente, ou de um Brasil colonizado. Ocorre por meio de contínuos processos de
reinvenção do Antigo, pelos vários presentes que se sucedem em vários lugares,
processo que vai acontecendo ao longo de inúmeras camadas de tempo. José
Petrúcio encara a complexidade destes processos, abdicando de uma compreensão
superficial destes fenómenos de presença do Antigo.
Em sua primeira obra, como já
sugere seu título, História Antiga: trajetórias, abordagens e
metodologias de ensino, ele analisa em profundidade diacrónica como se
desenvolveu em nosso país, desde o período colonial, o ensino da História
Antiga. Partindo desta erudição necessária ao trato aprofundado do tema, o
autor encara debates contemporâneos, muitas vezes bastante acalorados, com
referência aos comos e porquês do ensinar História em nosso país.
Trata-se de um historiador jovem, pertencente a uma nova geração de investigadores preocupada em se perguntar, e também responder sobre por que se pesquisar e ensinar hoje e no
Brasil a História Antiga. Em sua primeira obra, a questão do cinema já estava
apontada como uma das possibilidades metodológicas. E é amarrando com esse
ponto que inicia e conclui sua segunda obra, Hipátia de Alexandria: história e cinema.
José Petrúcio inicia com o debate
sobre as abordagens teórico-metodológicas para se tratar um filme como fonte
histórica, para tanto analisando também como a narrativa fílmica, pela síntese
operada pelo director, dá voz a múltiplas vozes que discorrem sobre o assunto narrado,
da Antiguidade, da tradição historiográfica moderna, assim como de outras
influências recentes ou antigas. Mas o cineasta tudo isto mistura de acordo com
um modo seu de narrar o passado partindo de como, para ele, este passado
permite ver questões pungentes da sociedade do presente, não sendo preocupação
ou sequer dever seu, como cineasta, a mesma sorte de compromissos que guiam a actuação
do historiador, do arqueólogo ou do filólogo na sua relação com a Antiguidade.
(…)
O
Cinema e os Estudos Clássicos
O sucesso de Gladiador (2000), por
Ridley Scott, e das minisséries Roma
(2005-2007), pela HBO, Spartacus
(2004), pela Starz, e Helena de
Troia (2003), por Kent Harrison, energizaram os estudos sobre
a Antiguidade Clássica, especialmente no tocante à sua recepção pelo cinema, o
que tem oportunidade aos historiadores da Antiguidade mais um tipo de fonte
histórica para análise. Sob essa óptica, para Kirsten Day, nas quatro últimas
décadas, o estudo sobre as representações da Antiguidade em produções
cinematográficas têm crescido em várias subáreas dos estudos clássicos e é actualmente
reconhecida como uma forma legítima de explorar e questionar a construção de um
passado clássico em diálogo com demandas de nosso tempo..
Até
meados da década de 80, muitos historiadores, entre eles T.S. Eliot, em What is a Classic? (1944),
Bernard Knox, em Backing into the Future:
the Classical Tradition and its Renewal (1994) e Allan Bloom em The Closing of the America Mind
(1987), viam a liberdade de criação da indústria cinematográfica com certa
indignação e desprezo pela literatura clássica e pelos esforços investigativos
dos estudos clássicos na Academia, para quem a popularidade crescente dos
filmes históricos sobre a Antiguidade, em vez de valorizar e fomentar os
estudos clássicos, empobrecia-os (Wyke, 1997)». In José Petrúcio F. Júnior,
Hipátia de Alexandria, 2022, RFB Editora, 2022 ISBN 978-655-889-6.
Cortesia de RFBEditora/JDACT
JDACT, Hipátia de Alexandria, Matemática, Filósofa, Conhecimento, Antiguidade,