terça-feira, 7 de novembro de 2023

Mil Noites de Paixão. Madeline Hunter. «Contrariada, dobrou o pescoço e encostou os lábios à concavidade acima da clavícula dele. Pele. Calor. Aquele cheiro masculino inebriante. Uma mão doce, mas dominadora na sua cabeça…»

Cortesia de wikipedia e jdact

« Foi encantador, disse ele suavemente, volvendo a beijar-lhe o pescoço. – As pequenas pausas conferiram à melodia um toque comovente. Voltou-se, alinhando o tronco com o dela. Vós sois encantadora, sussurrou, aproximando a cabeça dela da sua. Ele deu-lhe um beijo quase lânguido. Mais um beijo amoroso do que um arroubo, que lentamente se tornava mais profundo, despertando algo dentro dela que ela não controlava, algo que se fizera expectante após longa abstinência. Uma expectativa deliciosa acordou e percorreu-lhe todo o corpo de uma forma escandalosa. Reyna devia afastá-lo, mas Melissa, a cortesã, certamente não o faria, e como tal aguentou, com a consciência dolorosa de que o seu sofrimento não era, nem de perto nem de longe, tanto como deveria ser. Tentou travar a sua reacção escandalosa e a sua mente desnorteada começou a entoar repetidamente uma ordem silenciosa, que ele dormisse, raios, que dormisse.

Ele afastou-se dela. A expressão do seu rosto era indescritível. Calor. Desejo. A promessa do prazer revelado. Estava apoiado num braço e o seu tronco nu quase tocava no ombro dela. Aquela chama proibida dentro dela regozijou contra a sua vontade. Ela não conseguia tirar os olhos daquele rosto incrível. Não conseguia mexer-se. Não vos sintais constrangida, disse ele. Decerto é permitido que desfruteis uma vez ou outra. Ele baixou o olhar e passou os dedos pela orla do vestido dela, no alto dos seios. Curvou-se e beijou a pele exposta pelo decote generoso. Ela sentiu o corpo inteiro ser percorrido pelo mais estranho dos arrepios.

Observou, hipnotizada, aquela mão libertar o seu ombro do tecido. É importante que ele beba o vinho todo antes de tentar despir-vos. Recompôs-se. Inclinou-se para trás e soltou um risinho forçado. Tentou comportar-se como a cortesã experimentada determinada a conduzir o jogo de uma certa maneira. Já acabastes o vosso vinho, disse, fazendo menção de pegar na garrafa de vidro e na taça. Deixai que vos sirva mais um pouco. Carradas dele. Ele lançou-lhe um olhar que dizia que seria à maneira dela, mas não durante muito mais tempo. Regressou para o almofadão e deitou-se. Ela virou-se a tempo de ver a taça nos lábios dele.

Tentou impor controlo ao sangue desassossegado das suas veias. Agora falamos, disse ela com firmeza. Acabai o vosso vinho e dizei-me como viestes aqui parar. Sou eu que falo? Sois vós a treinada na arte da conversação. Sou treinada para ouvir. Os homens gostam de falar deles próprios, e nós ouvimos. Eu não tenho prazer em falar de mim. Falai vós.  Eu? Sobre o quê?  Podeis falar sobre mim. Podeis dizer-me como sou belo e admirar o meu rosto e o meu corpo. As mulheres fazem sempre isso. Fazem-no, deveras? Que conveniente ele vir recordar-lhe a sua presunção precisamente quando precisava de ajuda para não gostar dele. Se este garanhão enfatuado esperava vê-la a suspirar pela beleza dele, ele que pensasse outra vez… Ela suspirou, de facto, mas pela inutilidade do rancor que sentia. O vinho devia fazer efeito muito em breve. Deus sabia que ele tinha bebido que chegasse. Com um esgar, virou-se para ele. Os olhos dele aparentavam estar fechados. Ele pegou na mão dela e pousou-a no peito dele, o que fez com que ela se aproximasse um pouco, e ela reparou que as pálpebras dele estavam um tudo-nada abertas e que ele a observava. Não, ela talvez não se importasse minimamente de o matar depois desta humilhação.

Ela pôs um sorriso no rosto e começou a traçar com os dedos as linhas dos ombros e dos músculos do peito dele. Dava voltas à cabeça à procura de frases apropriadas. Sem dúvida que sois um homem muito bem-parecido. Olhos muito belos e um sorriso encantador. E o vosso corpo é forte e atlético. Santo Deus, as cortesãs e meretrizes mereciam decididamente cada centavo. Adormece, seu idiota presunçoso. Não é entroncado e peludo como alguns guerreiros. Do que gostais mais? A voz dele parecia sonolenta e arrastada. Hã… bem, estas concavidades ao longo da vossa clavícula são muito atractivas. A mão dele ergueu-se, lânguida, e envolveu-se no cabelo dela. Puxou-a delicadamente, encaminhado-lhe a cabeça para baixo. Então beijai-as, senhora. E depois, tudo o resto. Não está o maior talento de uma cortesã na sua boca?  

Ela apercebeu-se de que o seu rosto estava a centímetros do dele e daqueles olhos ardentes que a olhavam por entre as pálpebras semicerradas. Os seios dela pairavam mesmo acima dele, roçando-o ao de leve, e sentia um formigueiro no seu corpo ridículo, traiçoeiro. Contrariada, dobrou o pescoço e encostou os lábios à concavidade acima da clavícula dele. Pele. Calor. Aquele cheiro masculino inebriante. Uma mão doce, mas dominadora na sua cabeça encaminhava-a mais para baixo, para o peito. Adormece, maldito sejas. Ela beijou-lhe o peito e tentou não prestar atenção à espantosa e assustadora intimidade que tal acção evocava. Ele era o inimigo, um estranho, e ela odiava-o, mas algo dentr dela ignorava isto.

Ele conduziu-a mais para baixo, para o tronco, e barriga… De repente, a mão que tinha na cabeça ficou mole. Ela susteve a respiração e aguardou pela imobilidade absoluta que indicava que ele dormia.  Cuidadosa, esgueirou-se para longe do corpo dele. O braço dele caiu, lasso, ao lado do corpo. Puxou para si o cesto e despejou o resto das empadas. Afastou o pano mal cosido que compunha um fundo falso e cravou os olhos no punhal de aço escondido por baixo dele. Por Alice e as outras mulheres. Sim, até por Margery. Por Reginald, e até mesmo por Thomas». In Madeline Hunter, Mil Noites de Paixão, 2002, Edições ASA, 2012, ISBN 978-989-231-672-7.

Cortesia de EASA/JDACT

JDACT, Madeline Hunter, Literatura, Idade Média,