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Colombo e as canas vindas do Ocidente
«A problematização da forma de atingir as Índias equacionada em 1474 pelo príncipe João não suscitou resultados nos tempos que se lhe seguiram por
corresponderem a uma conjuntura adversa que impediu a realização de viagens de exploração,
visto em 1475 ter sido necessário
mobilizar em Portugal todos os meios navais, humanos e financeiros para as
campanhas militares contra Castela resultantes da guerra que desde então Afonso
V moveu para reivindicar a coroa deste reino, na sequência da morte de Henrique
IV, ocorrida a 12 de Dezembro de 1474.
Só após a subida ao trono de João
II em 1481 é que o processo dos
Descobrimentos foi retomado, tendo sido então que o novo rei decidiu dar continuidade
à opção henriquina de proceder a pesquisas junto da costa africana, deixando de
lado a proposta sugerida em 1474 por
Toscanelli. Foi neste enquadramento que antes de 31 de Agosto de 1482 João II deu ordens a Diogo Cão
para navegar até onde pudesse ir ao longo do litoral africano no sentido de ver
se conseguia encontrar as Índias.
Quando em l482 os descobrimentos
portugueses recomeçaram Colombo continuaria a dedicar-se aos negócios do açúcar
da Madeira, depois de se ter casado cerca de 1479 com Filipa Moniz, filha de Bartolomeu Perestrelo (falecido
em 1458), que era filho de Fillipo Pallastrelli, um comerciante natural de
Piacencia que no final do século XIV viera para Portugal. Por esse tempo
Colombo ia aprendendo a arte da navegação atlântica que os portugueses então
desenvolviam nas suas rotas oceânicas, tendo ido nomeadamente até à Guiné e à
Mina nos primeiros anos da década de 80 do século XV. Foram os conhecimentos de
navegação então adquiridos por Colombo que lhe permitiram realizar a viagem que
em 1492 o iria imortalizar, mas a
concepção que levou à realização de tal feito ter-lhe-á surgido quando nesse
tempo teve acesso à carta e ao mapa de Toscanelli, de cuja tese passou o ser um
ardente defensor.
Como Colombo não tivesse recursos financeiros para poder materializar a
proposta de Toscanelli tentou obter junto de João II os meios que lhe permitissem fazer a viagem para encontrar
terras do Oriente rumando a ocidente. O encontro entre estes dois homens em que
esse pedido foi formulado constitui um dos episódios mais importantes da vida
do famoso genovês no período da sua permanência em Portugal, o que nos leva a
considerar quão importante é aprofundar este tema para tentar apurar as
circunstâncias em que terá ocorrido.
Através dos testemunhos registados por Fernando Colombo e Las
Casas é possível verificar que Colombo consolidou a convicção da vantagem
de seguir a proposta de Toscanelli a partir da recolha de vários indícios
práticos que lhe dariam consistência. Um desses indícios que lhe mereceu maior atenção
foi o da existência de canas de grandes
proporções que foram arrastadas pelos ventos do poente (na verdade
correntes marítimas) para a ilha de Porto Santo, as quais tinham sido
vistas pelos seu cunhado Pêro Correia, que disso o informou. Colombo mostrou-se
convencido de que essas canas deviam
vir de alguma terra asiática situada a poente, pois era dessa direcção que lhe diziam
soprar o vento que trazia tais materiais, que não se encontravam na Europa nem
na África. Estas canas existiam e
eram do conhecimento de João II, que
sobre elas falou com Colombo tendo-lhas mesmo mandado mostrar, pois sabia onde
estavam guardadas e permitindo que ele as visse, quando sobre elas falaram.
Estas indicações foram escritas pelos mencionados autores, pelo que de seguida
as transcrevemos, pois constituem um dos temas centrais do episódio relativo à
proposta do descobrimento apresentada por Colombo a João II:
Texto de Fernando Colombo
Texto de Bartolomeu Las Casas
Como acabámos de verificar por estas considerações sobre a apresentação
do projecto de Colombo a João II e tal como o primeiro o deixou mencionado nos
seus apontamentos, ou livros de memórias,
como lhes chama Las Casas, as canas
estão associadas ao teor da conversação havida, pois de acordo com Fernando
Colombo».
In José Manuel Garcia, D. João II vs Colombo, Duas Estratégias
divergentes na busca das Índias, Quidnovi, 2012, Vila do Conde, ISBN
978-989-554-912-2.
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