A
Bertolini
«(…) A menina Bartlett, embora
perita em habilidades de conversa, sentia-se impotente ante semelhante
brutalidade. Era impossível pôr no seu lugar uma pessoa tão grosseira. O seu
rosto corou com desagrado. Olhou à volta como se dissesse: vocês são todos
assim? E duas velhotas sentadas mais adiante, com os xailes nas costas das
cadeiras, olharam para ela, indicando claramente: nós não somos, nós somos bem-educadas.
Come. Querida, disse a menina Bartlett a Lucy, e começou a mexer distraidamente
a carne que tinha censurado antes. Lucy murmurou que aquela gente em frente
parecia muito estranha. Come, querida. Esta pensão é um desastre. Amanhã
mudamo-nos. Mas anulou esta drástica decisão mal a tinha anunciado. Os
reposteiros ao fim da sala abriram-se e revelaram um sacerdote, gordo mas atractivo,
que correu a ocupar o seu lugar à mesa, alegremente, pedindo desculpa por ter
chegado tarde. Lucy, que ainda não tinha adquirido maneiras, pôs-se logo de pé
e exclamou: oh, oh! Mas é o senhor Beebe! Que bom! Veja, Charlotte, agora temos
de ficar, mesmo que os quartos sejam maus. Oh!
A menina Bartlett disse, com mais
comedimento: como está, senhor Beebe? Julgo que já se esqueceu de nós, menina
Bartlett e menina Honeychurch. Estávamos em Tunbridge Wells quando o senhor
ajudou o vigário de St. Peter naquela Páscoa muito fria. O clérigo, que tinha o
ar de estar de férias, não se lembrava delas tão claramente como elas se
lembravam dele. Mas avançou bastante satisfeito e aceitou a cadeira que Lucy lhe
indicou. Estou tão contente de o ver, disse a rapariga, que se encontrava num
estado de fome espiritual e teria ficado contente de ver o criado se a prima lho
permitisse. Como o mundo é pequeno. E Summer Street também o torna
especialmente divertido. A menina Honeychurch vive na paróquia de Summer Street,
disse a menina Bartlett, preenchendo o vazio, e acontece que ela me disse por
acaso que o senhor acaba de aceitar... Sim, ouvi a minha mãe falar disso na
semana passada. Ela não sabia que eu o tinha conhecido em Tunbridge Wells, mas
eu mandei-lhe logo uma carta e disse: o senhor Beebe é…Exacto, disse o clérigo.
Mudo-me para a reitoria de Summer Street em Junho próximo. Tenho sorte de ter
sido nomeado para um bairro tão encantador. Oh, estou tão contente! O nome da
nossa casa é Windy Corner. O senhor Beebe fez uma vénia.
Normalmente está lá a minha mãe e
eu, e o meu irmão, embora não seja frequente que o possamos levar à i... isto
é, a igreja é um bocado longe. Querida Lucy, deixa o senhor Beebe jantar. Estou
a jantar, obrigado, e a apreciá-lo. Preferia conversar com Lucy, cuja execução
musical recordava, do que com a menina Bartlett, que provavelmente recordava os
seus sermões. Perguntou à rapariga se conhecia bem Florença e foi informado pormenorizadamente
de que ela nunca lá tinha estado antes. É delicioso aconselhar um novato e ele
era o primeiro. Não se esqueça dos arredores, concluiu. Na primeira tarde
bonita vá até Fiesole e dê a volta por Settignano. ou mais ou menos. Não!, gritou
uma voz do fundo da mesa. Está enganado, senhor Beebe. Na primeira tarde bonita
essas senhoras têm de ir a Prato. Aquela senhora parece tão inteligente,
murmurou a menina Bartlett à prima. Estamos com sorte». In E.M. Foster, Um Quarto com
Vista, 1908, 1978, Relógio D’Água Editores, 2011, ISBN-978-989-641-246-3.
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