terça-feira, 10 de maio de 2011

Alegoria da Dança. Reflexões sobre a dança a partir das metáforas de Zaratustra: Parte IV. «A música exerce, na filosofia de Nietzsche, um papel fundamental. Tal papel educativo não se circunscreve à educação formal e seus métodos...»

Cortesia de wikipedia 

Reportando-me à exposição de António Sérgio na BM de Portalegre.
Com a devida vénia a Odilon José Roble.

Resumo
«Com base no pensamento do filósofo alemão Friedrich Nietzsche, busca-se esclarecer o conceito de «dança» utilizado alegoricamente pelo autor nas suas obras, especialmente em «Assim Falou Zaratustra». Nota-se que tal conceito tem fundamento na sua admiração pelo helenismo, mais especificamente na estética dionisíaca, e que as formas actuais de compreensão da dança podem estar distantes da caracterização realizada por Nietzsche. Observa-se também que, na filosofia nietzschiana, a alegoria da dança configura-se como um importante instrumento para o projecto de transfiguração moral proposto pelo autor.

Cortesia de esca

A dança e a música
A música exerce, na filosofia de Nietzsche, um papel fundamental. Desde sua aproximação de Wagner até o rompimento de sua relação com o compositor, sempre esteve presente a convicção do filósofo alemão sobre o papel educativo central da música. Tal papel educativo não se circunscreve à educação formal e seus métodos, Nietzsche vê na música uma função educativa muito mais ampla, que tem a capacidade de conduzir a humanidade a uma esfera superior de sua relação com a vida, desequilibrando as obviedades pela «comovedora violência do som» (2003, p. 34). A teoria estética de Nietzsche sobre o mundo grego é baseada na divisão de forças entre dois grandes modelos, representados pelo apolíneo e pelo dionisíaco. Apolo, deus solar, é o representante estético da harmonia, das formas exactas, da ordem e da beleza equilibrada. Dionísio, deus do vinho e da metamorfose representa os excessos, o poder do caos, do entusiasmo e da energia. A arte apolínea, por excelência, é a escultura ao passo que arte dionisíaca é a música.
Cortesia de elo7

No entanto, notemos que, por essa origem ritualista que embaça a reflexão de Nietzsche, a dança e a música formam uma unidade e é assim que devemos entender, portanto, as menções posteriores que o filósofo fará à dança. Esse cuidado alerta-nos que, se tomarmos como referencial certos modelos actuais para compreender a dança estaremos escolhendo algo fundamentalmente diferente daquilo que deu substância ao pensamento nietzschiano. Nas festas dionisíacas, música e dança são uma unidade, não há estética contemplativa (que é apolínea e trágica), mas uma actividade, no sentido de uma participação ou entrega do indivíduo ao contexto.
A dança esquadrinhada, técnica, conduzida ao passo e à previsibilidade coreográfica nada tem em comum com a espontaneidade do culto dionisíaco. A dança que Zaratustra pode nos oferecer, portanto, não é da ordem do modelo, da técnica ou da norma, mas sim a do improviso, da embriaguez e da fruição. Segundo Nietzsche (2007, p. 82) a obra Assim falou Zaratustra” pode ser entendida, ela própria, «inteiramente como música».  In Alegoria da Dança, Reflexões sobre a dança a partir das metáforas de Zaratustra.

Cortesia de Odilon José Roble/JDACT